Lou Reed 20/11/2010 – Caos e Barulho em São Paulo.


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A Ida.

 
Até o dia parecia mais quente em São Paulo, estranho para um lugar sujeito às intempéries constantes do clima, sujeito à garoa e frio a qualquer piscar de olhos. Era dia de show do Lou Reed, o lendário vocalista do não menos lendário Velvet Underground.
 
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Na longa caminhada pela Teodoro Sampaio até o SESC Pinheiros, ia imaginando o que estaria por vir. Todos deixaram bem claro que o show se basearia apenas no polêmico LP de 1975 Metal Machine Music (mesmo que com novos arranjos), nada de clássicos como Perfect Day, Heroin ou Take Walk on the Wild Side. O disco suscitou uma grande aversão na época por suas distorções exageradas, sugerindo inclusive que Lou Reed estava se auto sabotando, ou sabotando a indústria fonográfica. Virou motivo de piada e foi considerado por alguns o pior disco da história do Rock.
 
Mas não era exatamente isso que passava pela minha cabeça no momento que me aproximava do local do show. Era Lou Reed, o poeta, uma lenda viva, alguém que viveu os áureos momentos do rock, conviveu com quase todas as personalidades e estrelas da música, de David Bowie à Pavarotti, passando pelas mãos de Andy Warhol e seu famigerado estúdio Factory em Nova York. Fetiche ou não, todos estaríamos de frente com a história aberta da música mundial.
 
O Show.
 
Alguns minutos de pura, incômoda e deliberada microfonia e já se sentia uma espécie de tensão e ansiedade pairando como nuvens de aço na platéia. Lou Reed entra no palco, não olha e muito menos se dirige à platéia. Senta em uma espécie de bunker com sua guitarra e mais alguns acessórios para “brincadeiras eletrônicas”. Junto com o saxofonista Ulrich Krieger e um cara especialmente esquisito que faz o que chamam de processamento ao vivo, Sarth Calhoun, começa o show. 10 minutos e muitos já haviam abandonado seus lugares, outros tapavam o ouvido com as mãos, tamanho era o incômodo com aquela espécie de barulho catártico. Alguns ainda resistiam, pensando, talvez, que uma hora aquilo tivesse que acabar, e então ele começaria a entoar os primeiros acordes de algo audível, inteligível, ou algum clássico qualquer. Lou Reed não cede. Praticamente sem interrupções, as improvisações malucas continuaram por cerca de 1h e 20 minutos. Sem vocais, sem canções, sem pausas. Um sax ensandecido e distorcido. Calmo em alguns poucos momentos. Tambores eletrônicos que lembravam coisas como rituais tribais. Vez ou outra Lou declamava algo sem sentido como um pajé exorcizando algum demônio. De repente o show acaba, Lou Reed balbucia que ama todos que estão ali. Os músicos saem do palco e muita gente vai embora entre aliviados e atordoados. Para os que esperaram cerca de 5 minutos veio a surpresa. Lou volta sozinho com a guitarra e é ovacionado pelos seus seguidores fiéis que não arredavam o pé dali, mesmo um pouco confusos.
 
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Lou escolheu “I´ll be your Mirror” para presentear os que ficaram. Uma voz historicamente reconhecível. Aposto que ainda estavam arrepiados quando ele finalmente desapareceu demonstrando certa fragilidade física de quem atravessou o inferno e voltou, e ainda consegue estar por aqui, chocar, e por que não, inovar.
 
A Volta.
 
Quando pus os pés para fora do teatro do SESC não nego que eu era um dos atordoados. Iniciei o caminho de volta e me lembrei do poeta americano Williams Carlos Williams e no conselho que eu daria para aqueles que fossem assistir à apresentação do dia seguinte. Nas palavras de Williams: “Senhoras, levantem as barras de suas saias pois vamos atravessar o inferno”. Um tanto representativo. Segui caminhando e o barulho não menos ensandecido da metrópole me remetia constantemente àquela experiência um tanto difícil de ser classificada ou explicada. Não cabiam definições simplistas como: gostei ou não gostei. Preferi ficar com a definição do folder que nos foi entregue no início do show. Uma espécie de explicação para a palavra barulho e o que Lou Reed talvez pretendesse fazer com ele. (Transcrevo abaixo essa pequena “explicação”). Se foi a isso que ele se propôs, realizou magistralmente.
 
Barulho:
 
Na classificação sistemática do dicionário, a palavra barulho refere-se a algo incômodo, fora da ordem convencional dos padrões estabelecidos. Cientificamente o significado da palavra é relacionado a um som indesejável. Contudo, todas essas definições tornaram-se insuficientes diante das obras de vanguarda do início do século XX, onde o barulho foi incorporado na estética musical de diversos gêneros. Ruídos, distorções, microfonias, transformaram-se em moto criativo na composição de uma música invariavelmente experimental e provocadora. Permitir ao espectador uma fruição diante de zonas de desconforto é a proposição deste recorte conceitual, apresentando um panorama contemporâneo de artistas cujos trabalhos estão centrados no uso criativo de uma estética do ruído. 
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Diogo Brunner