A descoberta da América, parte 3: a civilização sobre rodas


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Fazendo jus à fama de que tudo é grande no Texas, o aeroporto de Dallas-Fort Worth é gigantesco: com sete pistas e cinco terminais, é o terceiro do mundo em número de operações e o sétimo em número de passageiros. A despeito do tamanho, impessoal como quase todo aeroporto moderno.

As primeiras impressões mais apuradas dos Estados Unidos, que estavam reservadas para a janela do carro de meus amigos texanos nessa noite de sábado, seriam confirmadas nas próximas semanas. Impressionante a quantidade de rodovias e de viadutos que se entrelaçam por todo o caminho entre o aeroporto e a cidade. Salvo algumas exceções, as cidades se espalham por subúrbios a perder de vista. Entre um subúrbio e outro, imensas áreas com pouca ou nenhuma ocupação humana. Os raros arranha-céus concentram-se em limitadas áreas do centro e por isso são visíveis a dezenas de quilômetros – isso mesmo em Dallas, que figura entre as dez maiores cidades norte-americanas.

Uma enorme sucessão de entroncamentos e trevos rodoviários, além das placas indicativas dos mais variados destinos, faz pressupor a necessidade do GPS para qualquer trajeto rodoviário. Muitos carros na Interstate 35, mas o trânsito flui bem: todos parecem circular à mesma velocidade. Raras (e lentas) as ultrapassagens, todos os veículos com o controlador de velocidade ajustado para as velocidades regulamentares (em regra, extremamente baixas: a maior que eu vi em quase quatro mil quilômetros rodados foi de 70 milhas por hora, meros 112 quilômetros por hora).

A frota circulante é uma atração à parte: além da quantidade, a variedade de modelos e de cores é assombrosa. Carros novos em folha circulam lado a lado com carros muito velhos, estes por vezes em excelente conservação. Incrível a quantidade de pick-ups e utilitários esportivos. Difícil achar no campo de visão dois carros do mesmo modelo.

Os subúrbios são ligados ao centro – Downtown – por imensas rodovias. Pistas com seis faixas em cada sentido não são incomuns. Nos entroncamentos dessas rodovias, os malls: imensos shopping centers, não fechados como os nossos, mas abertos e com pátios de estacionamento a perder de vista.

Destino de nossa primeira noite, o apartamento de nossos amigos causa um certo espanto. Situado num subúrbio agradável a 25 quilômetros do centro, localiza-se em um bonito condomínio: área de lazer com boa piscina, pequenos prédios de quatro pavimentos e sem elevador isolados uns do outros por distância razoável, estacionamentos e carros preenchendo todo o espaço do entorno. A construção tem esqueleto de aço e paredes em madeira; como veríamos ao longo dos próximos dias, as construções são praticamente todas pré-fabricadas, de modo a serem erguidas em exíguo prazo de tempo. Ao que parece, casas de tijolos são tão incomuns quanto caras, o que talvez explique a devastação provocada por eventuais furacões ou tempestades tropicais no sul dos Estados Unidos.

Enfim, nesse primeiro contato a certeza de que se trata de uma civilização que cresceu sobre rodas. Ônibus? Raríssimos de se ver. Pedestres? A não ser praticantes de jogging ou quem leva o cachorro para passear, é absolutamente incomum se ver pessoas a pé. Por sinal, transporte coletivo decente só existe em poucas cidades que fogem desse modelo – Nova York e São Francisco, por exemplo.

Os imensos espaços abertos e as rodovias de piso perfeito, permeadas por restaurantes fast-food, shopping centers e pátios descomunais de lojas de carro reforçavam a indicação de que as distâncias a serem vencidas aqui são das mais longas. O primeiro país do mundo a universalizar o uso do automóvel pôde levar o individualismo ao extremo, o que é notável pela permanente sensação de espaço. Logo vi que imensos utilitários esportivos nem pareciam assim grandes, em meio a ruas largas e vagas de estacionamento imensas.

Ainda que um modelo que não possa ser copiado por todo o mundo – seja pela falta de espaço físico, pela escassez de recursos naturais ou ainda pela questão ambiental –, gostei do que vi. Não é politicamente correto, é verdade, ser assim individualista nos dias de hoje. Admito, sim, que gostei muito da sensação de espaço que estava vivenciando desde que pus os pés ali. Resquício ou não do territorialismo de nossos antepassados-bichos, confesso ser um cara que odeia multidão. Também por isso, naquele momento eu sabia que havia escolhido o destino certo.

Ou não? Afinal, estou de passagem pelo Texas. O destino final é a Califórnia, tema de meu próximo post.

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Ricardo Montero