A pedra no caminho do tempo


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O que é passado, presente ou futuro, só o tempo atestará. Pois se existe mesmo esse vidro-hoje a separar fatos e pessoas, existe o vidro-afeto a ser quebrado a qualquer momento, não aceitando nem ser refratário, para se tornar apenas pleno em sua invisibilidade.” [ROMEU, A. C. Passado, presente e futuro. Jornal Diário Popular, Pelotas, 21 de jul. de 2012]


Não lembro a fonte do conto “a pedra no caminho”, mas independente do tamanho e tempo da pedra, no decorrer da vida, penso que não existe uma, que não seja possível aproveitá-la para o próprio crescimento espiritual. Acredito que, independente do tempo, a diferença em seguir sonhando, nunca esteve na pedra, mas na capacidade de autorenovação do homem.

Parece claro que existe similitude da pedra no caminho à ideia de um tempo retilíneo, acomodado pela repetição dos fatos, que se movem em torno do mesmo centro e se  encontram partir dos mesmos princípios e eventos ortodoxos. Sob esse olhar platônico, há impossibilidade do movimento e alteração da pedra, ou seja, é inútil mudar a natureza humana, pois não há tempo no qual possa se alterar.  Nunca haverá restauração do tempo.

Qual é sentido de tudo isso? A questão de forma abstrata pode receber várias respostas.  Diria que o homem sempre teve, desde os primórdios, a necessidade de se defender, enquanto a pedra aceita a guerra como um fato da vida. Assim, se contarmos a ligação da pedra e do tempo, poderemos perceber que partes das pedras encontradas no caminho já possuíam legitimidade no tempo das cavernas, mas a vida humana ainda segue curso para o futuro.

Sebastian de Grazia escreveu no livro “Maquiavel no Inferno” que feliz é aquele que se adequa ao modo de proceder ao tempo. Para ele, a ambição que não se entende com o tempo, é uma paixão tão forte no coração do ser humano que, mesmo que galguemos as mais altas posições, nunca nos sentiremos satisfeitos.

Segundo Maquiavel,  “as vezes, nos corpos que giram no céu, em torno da terra, se produz um desvio ou paralaxe.  E com intervalos de tempo muito espaçados, tudo o que há sobre a terra morre em  função do excesso de fogo”. Como tal, a destruição causada determina não somente o fim de uma era, mas o início de um novo ciclo, renovado pelos sobreviventes da erupção que gera as pedras: “quando isso acontece esses povos voltam novamente a ser jovens”.

Existe na minha gaveta uma pedra que me acompanha há vários anos, serve de amuleto para pensar que posso ser tão forte ou manter-me livre. Não é nenhuma jade (pedra associada à imortalidade), mas tem um sentimento de quartzo azul (poder) que domina as minhas inquietações. Sempre que penso que o meu orgulho estar sendo roubado, procuro-a como meio de pensar que o chão nunca pode desmoronar sobre os meus pés.

Mas com tantas pedras no caminho em um tempo em que  eu não posso comandar, sobra pouco espaço para ”vencer sem lutar”. Só que no fundo essa pedra é parte do meu passado, em outro espaço que é o presente, mas que mesmo, assim, tento me agarrar e materializar.

Li, em certa ocasião, no livro “Paz Guerreira” de Talal Husseini que um guerreiro, fundamentalmente, conquista, avança e domina, sendo um eterno inconformado com a injustiça, falsidade e ilusão e que por meio de virtudes, ao se confrontar com vilões, trava a verdadeira guerra, apenas, no interior.

Sob esse prisma, tenho aberto um umbral de grandes proporções, muitas vezes por não saber em quem confiar, mas tentando usar a paz guerreira com desejo de presente e futuro na minha essência de passado. Talvez, tenha o desejo de viver o que Jorge Luís Borges menciona: “O absoluto deseja manifestar-se e manifesta-se no tempo”.

Quando penso em batalhas, não me passa pela cabeça a concepção de campo de guerra que leva os homens aos sentidos mais grotescos e brutais, mas desmitifico uma concepção do homem e do mundo que fica no vão da porta, bloqueando o caminho, além do nosso comando. Seria comandar um Ipad com o controle do desenho dos Flintstones.

Tenho aprendido a ter atitudes de não encanar por nada e controlar os níveis de cortisol nas experiências negativas. Lembro, assim, que algumas batalhas não valem a pena, nem mesmo os sapatos novos que nos machucam, fugindo de autoflagelo ou de episódios semelhantes a série Dexter.

Já usei a teoria Playmobil que alguns chamam de filosofia e eu chamo de resistência. Não tenho dúvidas que o sorriso diante da pedra é a soma das nossas escolhas, cantada e exposta como oráculo da felicidade. Mas, tenho nesses dias pensando nessa teoria como uma armadura. Talvez não uma armadura de ferro ou blindagem, tipo usada por nossos célebres cavaleiros, mas,  um refúgio do bom combate à vida. O sorriso, mesmo debaixo de um mar de lágrimas, revela algo nosso, uma propriedade que não demanda seguro ou ferraduras.

E pergunto como sobrevivemos? Talvez, considerando uma pesquisa que li na Revista Superinteressante, impedindo o mundo de virar monstro ou exercitando a  capacidade de nos adaptarmos aos outros e alinharmos nossas opiniões, pelo menos em parte, como uma questão estrutural: “dependendo do nosso hardware (a estrutura do nosso cérebro), e não tanto do software (o processamento das informações que ocorre ali)”.

Talvez, haja vitória do tempo ao esconder a dor, quando não depositamos todas às fichas em um único local, pertinentes a qualquer tipo de relação profissional, amorosa, pessoal ou de amizade, pois quando a batalha tortura, o tempo parece não passar pelas pedras.

E no final seremos, sempre, solitários, como no filme Natureza Selvagem: “E também sei como é importante na vida, não necessariamente ser forte, mas sentir-se forte.”

[…] Nós temos uma ambição que concordamos. E você pensa que tem que querer mais do que precisa. Até você ter tudo, você não estará livre. Sociedade, sua raça louca. Espero que não esteja solitária sem mim. Acho que preciso encontrar um lugar maior […] (Society interpretada por Eddie Vedder)
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Luciana Santa Rita