Da psicologia das massas


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A extrema direita venceu no Brasil. Nosso próximo presidente será um fascista.

Essa extrema direita brasileira tem lá suas particularidades, algumas delas visíveis em alguns dos nomes dos que foram eleitos: dúzias de coronéis, majores, capitães, tenentes e sargentos isso ou aquilo, de delegados e de soldados da PM, um certo Carteiro Reaça, um candidato eleito denominado Agente Federal Danilo Balas, e o mais do que simbólico Alexandre Frota. É uma extrema direita armada, primitiva e tosca.

De semelhante com as outras extremas direitas espalhadas pelo mundo seus pilares são a pátria, a família tradicional e Deus, acima de tudo. Samuel Johnson nunca erra e a hipocrisia tem sempre acolhida especial nos corações e mentes reacionários.

Talvez fosse interessante neste momento lembrar de algumas passagens do texto Psicologia das massas e análise do Eu (1921), de Sigmund Freud. São passagens em que Freud cita um livro ainda mais antigo, de Gustave Le Bon, também chamado de Psicologia das massas, cuja primeira edição é de 1895. Não havia zap zap no século XIX.

Melhor ler agora, já que num futuro próximo o ato de se abrir um livro poderá ser considerado, de acordo com o mundo e a lógica do deputado (quiçá ministro da cultura) Alexandre Frota, coisa de comunista viado filho da puta e, portanto, merecedor de pena de morte perpétua (sic):

1 Constata-se facilmente o quanto o indivíduo na massa difere do indivíduo isolado (…).

2 Na massa, acredita Le Bon, as aquisições próprias do indivíduo se desvanecem, e com isso desaparece sua particularidade (…), o heterogêneo submerge no homogêneo. Diríamos que a superestrutura psíquica, que se desenvolveu de modo tão diverso nos indivíduos, é desmontada, debilitada, e o fundamento inconsciente comum a todos é posto a nu (torna-se operante).

3 (…) o indivíduo na massa adquire, pelo simples fato do número, um sentimento de poder invencível que lhe permite ceder a instintos que, estando só, ele manteria sob controle. E cederá com tanto mais facilidade a eles, porque, sendo a massa anônima, e por conseguinte irresponsável, desaparece por completo o sentimento de responsabilidade que sempre retém os indivíduos.

4 Ora, observações atentas parecem provar que o indivíduo, mergulhado há algum tempo no seio de uma massa ativa, logo cai – em consequência de eflúvios que dela emanam, ou por outra causa ainda ignorada – num estado particular, aproximando-se muito do estado de fascinação do hipnotizado nas mãos do hipnotizador […]. A personalidade consciente se foi, a vontade e o discernimento sumiram. Sentimentos e pensamentos são então orientados no sentido determinado pelo hipnotizador.

5 Ele (o indivíduo numa massa) não é mais consciente dos seus atos. Nele, como no hipnotizado, enquanto certas faculdades são destruídas, outras podem ser levadas a um estado de exaltação extrema. A influência de uma sugestão o levará, com irresistível impetuosidade, à realização de certos atos.

6 Ele (o indivíduo numa massa) não é mais ele mesmo, mas um autômato cuja vontade se tornou impotente para guiá-lo.

7 Portanto, pelo simples fato de pertencer a uma massa, o homem desce vários degraus na escala da civilização. Isolado, ele era talvez um indivíduo cultivado, na massa é um instintivo, e em consequência um bárbaro. Tem a espontaneidade, a violência, a ferocidade, e também os entusiasmos e os heroísmos dos seres primitivos.

8 A massa é extraordinariamente influenciável e crédula, é acrítica, o improvável não existe para ela. Pensa em imagens que evocam umas às outras associativamente, como no indivíduo em estado de livre devaneio, e que não têm sua coincidência com a realidade medida por uma instância razoável. Os sentimentos da massa são sempre muito simples e muito exaltados. Ela não conhece dúvida nem incerteza. Ela vai prontamente a extremos; a suspeita exteriorizada se transforma de imediato em certeza indiscutível, um germe de antipatia se torna um ódio selvagem.

9 (…) Quem quiser influir sobre ela, não necessita medir logicamente os argumentos; deve pintar com imagens mais fortes, exagerar e sempre repetir a mesma fala.

10 Como a massa não tem dúvidas quanto ao que é verdadeiro ou falso, e tem consciência da sua enorme força, ela é, ao mesmo tempo, intolerante e crente na autoridade. Ela respeita a força, e deixa-se influenciar apenas moderadamente pela bondade, que para ela é uma espécie de fraqueza. O que exige de seus heróis é fortaleza, até mesmo violência. Quer ser dominada e oprimida, quer temer os seus senhores. No fundo, inteiramente conservadora, tem profunda aversão a todos os progressos e inovações, e ilimitada reverência pela tradição.

Freud afirma ter adotado, em 1912, uma conjectura de Charles Darwin, segundo a qual a forma primeva da sociedade humana foi a de uma horda governada irrestritamente por um macho forte.

No Brasil de 2018 temos nos esforçado tremendamente para regredirmos até esse ponto.

About the author

Marcos Schmidt

Marcos Schmidt é designer gráfico e ilustrador. Vive e trabalha na irremediável cidade de São Paulo.