Que nome dar ao ato de exorbitar o que já é exorbitante?

Palavrinha que demorei a aprender na minha tenra juventude. Por mais que, na infância, meus pais dissessem que eu já estava “esgotando a paciência” deles, o sentido de exorbitar só foi entendido quando, por assim dizer, me tornei cidadão.

E não é culpa nossa, dos jovens (eu, na época, claro). É que nos ensinam que a juventude é caracterizada pela rebeldia, pela desobediência aos padrões familiares e sociais. Me chamavam de aborrecente e eu gostava disso. Significava um certo “cumprimento da missão”. Minha vida será reclamar. Afinal, por mais que meus pais reclamassem, continuavam a gostar de mim.

E assim me criei. Acreditando que exorbitar era, mesmo que não sabendo o que isso significava, uma coisa boa!

“Um minuto, por favor”, como diria o saudoso Flávio Cavalcante!

Não tenho culpa por isso! Afinal, meus pais nasceram, viveram e morream no século XX. Foi um direito deles exorbitar. Foi um direito deles querer tudo o que as guerras não lhes deram.

Ei! Peraí, papai e mamãe!

Não fui criança ao tempo do Getúlio, nos 30, e sequer fui adolecente na 2ª GG. Não vi criarem Israel; não vi construirem o Muro de Berlim. Quando me dei conta do mundo ele já exorbitava o que era exorbitante! Acordei em plena ditadura e em plena Guerra Fria. Acordei sendo chamado de “terceiro mundo”. Putz, como isso demorou a entrar na minha cabeça! Por que eu sou “terceiro mundo”, papai?

Quando comecei a ter idade para compreender essas repostas, já não estavas mais aqui para responder minhas perguntas. Mas sabes o que é pior? Quarenta anos passados e ninguém consegue responder: por que exorbitamos aquilo que já foi exorbitado no teu tempo?

Juro que tento acreditar nos teus ensinamentos; e há momentos em que até acredito neles. Muitos transmito para as tuas netas. Mas devo te confessar uma coisa: não consigo sustentá-los por muito tempo. Elas vêem, sabem que estou mentindo!

E queres saber? O que mais me dói e vê-las acreditando em mim como eu acreditei em ti! E acreditei na mamãe, papai, que nos manteve por esses 40 anos.Tua crença, ceifada tão jovem por um coração que não aguentou, se tornou minha crença: Por que exorbitar aquilo já exorbitou?

Sim, papai! Não tenho dúvidas que a tua vida em plana 2ªGG tenha sido das piores. Não me culpe, por favor! Vivo o mesmo tempo que viveste.

E faço a mesma pergunta que um dia fez parar  teu coração: Que nome dar ao ato de exorbitar o que já é exorbitante?

About the author

Luiz Afonso Alencastre Escosteguy

Apenas o que hoje chamam de um idoso. Parodiando Einstein, só uma coisa é infinita: a hipocrisia. E se você precisou saber meu "currículo" para gostar ou não do que eu escrevo, pense bem, você é sério candidato a ser mais um hipócrita!