Demografia By José Eustáquio Diniz Alves / Share 0 Tweet O IBGE acaba de divulgar os microdados do censo demográfico de 2010 sobre o quesito religião. O censo confirmou a tendência para uma maior pluralidade religiosa no país. Os católicos que tinham uma taxa de participação de mais de 90% até 1980, caíram para 73,6% no ano 2000 e para 64,6% em 2010. Em sentido contrário, os evangélicos que tinham uma taxa de 5,2% em 1970, passaram para 15,4% em 2000 e chegaram a 22,2% em 2010. As pessoas que se declaram sem religião que eram apenas 0,8% em 1970, passaram para 7,4% em 2000 e chegaram a 8% em 2010. As demais religiões passaram de 2,3% em 1970 para 3,7% em 2000 e para 5,2% em 2010. Portanto, no aspecto das filiações religiosas, o país está ficando mais heterogêneo e mais plural. O Brasil está passando por uma revolução silenciosa no campo religioso, assim como passou por momentos de inflexão em sua história sem grandes traumas ou revoluções sangrentas. A independência, em 1822, foi liderada pelo príncipe herdeiro que rompeu com a metrópole, mas, ao invés de mudar o regime de governo, instalou a única monarquia das Américas. O fim da escravidão, em 1888, aconteceu pelas mãos da princesa regente e nem de longe reproduziu o cenário da Guerra de Secessão dos Estados Unidos. No ano seguinte, “o povo assistiu bestificado” a proclamação da República, sem a participação popular. A República Velha caiu, em 1930, sem grandes resistências do coronelismo. O presidente Getúlio Vargas, que foi deposto em 1945, voltou nos braços do povo em eleições livres e diretas em 1950. A ditadura militar promoveu um processo de distenção política em 1974, que cuminou com uma eleição indireta para Presidente da República, em 1985, dentro de um colégio eleitoral com alguns representantes “biônicos”. Tancredo Neves foi eleito, mas quem assumiu a Presidência foi o ex-lider do partido que sustentou por 20 anos o regime ilegítimo e autoritário. O que todos estes acontecimentos históricos têm em comum é que o Brasil mudou, deixando de ser Colônia, superando a Escravidão, derrubando a Monarquia, implementando a República (em suas diferentes fases), promovendo a modernização, a industrialização e a urbanização, mas sem mudar de religião. O país recebeu das mãos lusitanas em 1500 a religião hegemônica, que prevaleceu incontestavelmente majoritária por cerca de 500 anos. A sociedade brasileira foi profundamente marcada pelas práticas, ensinamentos e também pelos dogmas da religião Católica Apostólica Romana. Nos últimos 200 anos o Brasil passou por diversas transformações sociais, mas a religião herdada dos colonizadores, mesmo em declínio, se manteve presente no lar da maioria da população brasileira. De fato, não é comum um país mudar de religião. Os Estados Unidos, por exemplo, também passaram por grandes transformações econômicas e sociais, mas continuaram predominantemente protestante e não há grandes perspectivas de mudança. A Rússia fez uma grande revolução e viveu grandes acontecimentos sangrentos, mas continuou católica ortodoxa. O Japão mudou completamente seu modo de vida desde a revolução Meiji, mas manteve basicamente suas tradições religiosas. A Turquia se modernizou, após Ataturk, mas não deixou de ser muçulmana. E assim por diante. Porém, a grande novidade do século XXI é que o Brasil está perdendo a maioria de filiações católicas. Caso haja permanência das atuais tendências, o país pode sofrer uma mudança de hegemonia religiosa nos próximos 30 anos. Entre os 10 maiores países do globo, isto deve acontecer somente no Brasil, que é considerado o maior país católico do mundo e, provavelmente, poderá deixar de sê-lo em poucas décadas. Caso isto venha a acontecer, o Brasil vai se tornar exemplo de um fenômeno raro, que é a mudança sem precedentes na composição religiosa da população. E como costuma acontecer na história brasileira, pode ser uma mudança sem grandes rupturas, sem traumas ou batalhas sangrentas. Talvez, não será uma revolução silenciosa, na medida em que algumas correntes evangélicas pentecostais, que são aquelas que mais crescem, não costumam ficar em silêncio na divulgação de suas mensagens. De todo o território nacional, a maior diversidade religiosa é encontra no Rio de Janeiro – que é um estado que dita várias tendências sócio-demográficas no Brasil. Por exemplo, é o Estado mais urbanizado, mais metropolizado, mais envelhecido e com as menores taxas de fecundidade do país. Também é o Estado que tem apresentado a menor percentagem de filiações católicas, a mais elevada percentagem de sem-religião e a maior percentagem de outras religiões. No estado fluminense, o entorno da Região Metropolitana do Rio de Janeiro (RMRJ) – a RMRJ sem a capital – é o local do país onde há o maior aprofundamento das tendências gerais das mudanças religiosas. Constituida por uma população de mais de 6 milhões de habitantes (equivalente ao 12º estado brasileiro) – já se encontra em uma situação de “empate técnico” entre católicos e evangélicos, além de uma grande proporção de pessoas que se declaram sem-religião, no ano 2010. Mas a novidade é que entre os jovens, os evangélicos já são maioria no colar metropolitano do Rio de Janeiro. Por exemplo, três grandes municípios que já apresentaram mudança na hegemonia religiosa, em 2010, foram Nova Iguaçu (com 796 mil habitantes) que apresentou uma percentagem de 33% de católicos, 36,9 de evangélicos e 21,2% de sem religião; Duque de Caxias (com 855 mil habitantes) que estava com 35% de católicos, 36,8% de evangélicos e 20,3% de sem religião; e Belford Roxo (com 469 mil habitantes) que apresentou 32,5% de católicos, 37,1% de evangélicos e 22,7% de sem religião. Na RMRJ, os católicos continuam com pouco mais de 50% somente nas cidades do Rio de Janeiro e de Niteroi. De outro lado, a região Nordeste é a que apresentou as menores mudanças e ainda possui uma grande maioria de católicos, sendo que os evangélicos não passam de 15% na região. Os católicos predominam entre a população idosa e também no meio rural. Mas estão perdendo espaço nos setores mais dinâmicos da sociedade brasileira. Como será o futuro? O Brasil vai seguir as tendências do Nordeste ou o entorno da Região Metropolitana do Rio de Janeiro? Nas próximas 3 décadas saberemos a resposta.