Candidatura Dilma

Em artigo da Folha de São Paulo (04/01/2010), o jornalista Melchiades Filho inicia as suas considerações com uma constatação: “É irônico que a possibilidade de pela primeira vez no Brasil uma mulher chegar à Presidência se deva exclusivamente ao capricho de um homem”. Ou seja, Dilma Rousseff, que nunca disputou uma eleição, só se impôs no PT e na coligação de forças políticas que apóia o atual governo devido “ao capricho” (vontade, compromissos administrativos ou clarividência?) do presidente Lula. Este é um dos grandes mistérios a serem investigados no futuro: por que Lula escolheu Dilma?

De fato, embora as mulheres sejam maioria do eleitorado brasileiro (já são quase 5 milhões de eleitoras sobre os eleitores), a participação das mulheres na política parlamentar é muito baixa, ficando abaixo de 10% na Câmara Federal e algo em torno de 12% nas Câmaras Municipais, nas Assembléias Legislativas e no Senado. Nos cargos do primeiro escalão do Executivo a participação é ainda mais baixa, sendo que havia 5 ministras no primeiro governo Lula e agora são apenas duas (Dilma e Nilcea). Portanto, é um tanto quanto surpreendente que as forças governistas (que são majoritariamente masculinas) estejam indo para uma difícil disputa eleitoral encabeçada por uma mulher.

Na verdade o presidente Lula, além de seus compromissos com a chefe da Casa Civil e a ex-ministra de Minas e Energia, deve ter percebido as diversas mudanças históricas acontecendo no mundo e nas Américas. Provavelmente ele percebeu que o continente Americano tem mudado por meio da ascensão das mulheres no Chile, com Michele Bachelet, na Argentina, com Cristina Kirchner e no próprio Estados Unidos, com Hilary Clinton. Sem dúvida, é crescente a participação das mulheres nos espaços de poder em todo o mundo. O presidente Lula deve ter percebido que o Brasil não poderia ficar atrás nesta onda de redefinição das relações de gênero nos cargos de poder.

Voltando ao artigo de Mechiades Filho, ele considera que uma candidatura feminina deve abordar, além de temas tradicionais como “câncer de mama, violência doméstica e distorções salariais”, novas frentes de discussão na campanha eleitoral como a pobreza que cada vez mais se concentra em famílias chefiadas por mães: “Das pessoas em situação de indigência no país, 33% vivem em domicílios liderados por mulheres (5,2 milhões de 15,8 milhões). Quinze anos antes, essa taxa era de 17% (5,5 milhões de 32,4 milhões)”. Sem dúvidas, existem muitos temas que devem ser tratados pelos candidados independentemente do sexo dos mesmos.

Por fim, uma mulher comandando as forças governistas numa disputa presidencial no país é uma novidade que não deve ser desprezada. Também a mudança na lei eleitoral deve ter um impacto para aumentar as candidaturas estaduais e federais. Independentemente dos resultados das urnas, em outubro, espera-se que os meses que antecedem as eleições sejam de debate e reflexão sobre a boa gestão pública, a melhoria das condições de vida da população e que as questões de gênero tenham um destaque que nunca antes tiveram na história dos 500 anos do Brasil.

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José Eustáquio Diniz Alves