O patriarcado é um sistema social no qual o homem (no papel de marido ou de pai) é o ator fundamental da organização social, e exerge a autoridade sobre as mulheres, os filhos e os bens materiais e culturais. Historicamente, o patriarcado pode ser encontrado, com algumas diferenças de estilo, nas civilizações hebraica, grega, romana, indiana, chinesa, etc. Mesmo vindo de longe, o patriarco teve uma profunda influência sobre a maioria dos aspectos da civilização moderna.
O patriarcado puro, isto é, em todas as suas dimensões de segregação, nunca existiu em sua totalidade em uma mesma sociedade. Algumas dimensões do patriarcado predominam sobre as outras, conforme o tipo de organização social e cultural, estabelecidas historicamente. Mas em geral, o patriarcado se caracteriza por ser um sistema onde há o predomínio dos pais e dos maridos (pater families) sobre as mulheres e os filhos, no âmbito da família e da sociedade.
Na antiguidade, segundo a Lei das Doze Tábuas, o pater familias tinha o “poder da vida e da morte” sobre a cônjuge, os descendentes e os escravos. Vem desta época o poder, pela linhagem masculina do: Pai, Patrão, Pastor, Padre, Padrinho, Patrono unidos em um espaço chamado Pátria (terra dos pais) e não Mátria (terra das mães).
No patriarcado tradicional existe uma rigida divisão sexual do trabalho e uma grande segregação social, em geral, com as mulheres ficando confinadas ao mundo doméstico e os homens monopolizando o mundo público. O patriarcado, em termos materiais, possibilita ao homem o controle da propriedade e da renda da família, o controle do trabalho e da mobilidade da mulher e o destino dos filhos.
A ausência de autonomia feminina e o desempoderamento da mulher é maior no sistema que, além de patriarcal, é também patrilocal e patrilenar. No sistema patrilocal a mulher recém-casada segue o marido, passando a morar no local onde ele mora, tendo a obrigação adicional de cuidar dos sogros. Ao casar, geralmente o marido exige um dote e busca romper os laços da esposa com sua família e comunidade de origem. Quanto mais segregada for a mulher casada, maior será o controle masculino sobre a vida e os frutos do trabalho da esposa e dos filhos.
No sistema patrilenear, a sucessão geracional é definida pela linha paterna e, geralmente, só os filhos (masculinos) possuem direito à herança. O sobrenome do pai é que define a linhagem familiar, sendo que o sobrenome da família pode desaparecer se hão houver descendente do sexo masculino. A prática patrilinear é um dos motivos pela preferência por filhos homens e uma base para a prática do “femicídio” ou “gendercídio”.
Nos países patriarcais, patrilocais e patrilineares a forte preferência pelo filho homem aumenta a razão de sexo (relação entre homens e mulheres em cada grupo etário), favorecendo a criação de um superávit de homens na sociedade. Neste e em outros aspectos, a dominação masculina é um fato que permeia toda a vida social.
Por exemplo, no Afeganistão, até hoje, mas principalmente no período do governo Taleban, as mulheres não podiam dirigir carros, entrar na universidade e sair desacompanhada na rua. A segregação da mulher ao espaço doméstico é completado pelo uso da burca (que é uma vestimenta que cobre todo o corpo, até o rosto e os olhos) nos espaços públicos. O patriarcado controla o corpo da mulher e determina os modos de vestimenta e de comportamento feminino em público.
Neste sistema, as concubinas e os filhos “ilegítimos” não possuem os mesmos direitos das esposas e dos filhos “legítimos”, constituindo-se uma das parcelas mais pobres e discriminadas da sociedade. Alguns países patriarcais ou permitem ou toleram a poligamia, mas condenam e punem a poliandria. Alguns países criminalizam a infidelidade feminina, no casamento. Recentemente, o mundo todo se mobilizou contra as autoridades do Irã que condenaram à morte por apedrejamento, a viúva Sakhine Ashtiani, por um suposto crime ter mantido relacões sexuais fora do casamento.
O controle da sexualidade feminina é uma forte característica da sociedade patriarcal. Além da obrigação da mulher casar virgem, existe um rigoroso esquema de controle da sexualidade das esposas e filhas. Em alguns países da África e da Ásia, o costume da Mutilação Genital Feminina (MGF), ou excisão feminina é uma pratica que consiste na amputação do clitóris da mulher de modo a que esta não possa sentir prazer durante o ato sexual. Há ainda a mutilação genital chamada de infibulação, que consiste na costura dos lábios vaginais ou do clítoris.
As organizações de direitos humanos denunciam este costume sócio-cultural que causa danos físicos e psicológicos irreversíveis e, além de ser considerado um ato de tortura e abuso sexual, é responsável por inúmeras mortes de meninas e mulheres.
O patriarcado também considera a sexualidade apenas do ponto de vista das relações heterossexuais. O modelo do homem macho e viril é ensinado como tipo ideal para garantir a continuidade da dominação masculina sobre as mulheres, preservar as relações sexuais generativas e a continuidade da sucessão das gerações. Neste sentido, a homossexualidade é condenada e a homofobia é incentivada. Muitos países ainda hoje condenam à prisão ou a morte as pessoas que aderem à homossexualidade. Outros países, mais tolerantes, simplesmente proibem a união sexual do mesmo sexo e a homoparentalidade.
Em seus aspectos mais dogmáticos, o patriarcado é um sistema que vem perdendo espaço no mundo e tende a ser superado pelas novas dinâmicas familiares e sociais e por uma sociedade com maior igualdade de direitos entre homens e mulheres, assim como pela difusão de novas formas de família e de relacionamentos sexuais entre as pessoas.
O patriarco está em declínio, pois ao longo do século XX, diversos acontecimentos históricos permitiram o avanço de um processo de despatriarcalização no mundo. Mas, assim mesmo, não é dificil encontrar, em maior ou menor grau, as suas marcas no dia a dia das pessoas e nas condições materiais e nas manifestações culturais dos diversos países da comunidade internacional. O desafio para o século XX é construir uma sociedade pós-patriarcal, com equidade de gênero, com liberdade de opção sexual e com igualdade de oportunidade entre homens e mulheres.
Referências:
ALVES, J.E.D, CORREA, S. Igualdade e desigualdade de gênero no Brasil: um panorama preliminar, 15 anos depois do Cairo. In: ABEP, Brasil, 15 anos após a Conferência do Cairo, ABEP/UNFPA, Campinas, 2009. Disponível em:
http://www.abep.nepo.unicamp.br/docs/outraspub/cairo15/Cairo15_3alvescorrea.pdf
Reducing and Reversing Gender Inequalities in Latin America • José Eustáquio Diniz Alves, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE); Suzana M. Cavenaghi, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE); George Martine, Independent Consultant. Annual meeting of the Population Association of America, March 31 to April 2, 2011, Washington, D.C
http://paa2011.princeton.edu/download.aspx?submissionId=112757