Histórias de Cozinha By Rafael Reinehr / Share 0 Tweet Sempre lembro de minha avó Emilia e minha nonna Teresa em suas cozinhas. Em comum ambas tinham as cozinhas no fundo do pátio, fora da casa, onde toda a família comia nos fins de semana. Não saberia dizer quantas manhãs de sábado passei na cozinha de minha avó Emilia, cortando e marcando diligentemente centenas de gnocchi que desapareceriam rapidamente no almoço… Os gnocchi eram invariavelmente acompanhados de uma excelente carne de panela recheada com toucinho, cenouras e ovos inteiros e, depois de dourada de todos os lados, cozinhava por horas num molho de tomates que ficava bem espesso e escuro. Sempre lembro de minha avó Emilia e minha nonna Teresa em suas cozinhas. Em comum ambas tinham as cozinhas no fundo do pátio, fora da casa, onde toda a família comia nos fins de semana. Não saberia dizer quantas manhãs de sábado passei na cozinha de minha avó Emilia, cortando e marcando diligentemente centenas de gnocchi que desapareceriam rapidamente no almoço… Os gnocchi eram invariavelmente acompanhados de uma excelente carne de panela recheada com toucinho, cenouras e ovos inteiros e, depois de dourada de todos os lados, cozinhava por horas num molho de tomates que ficava bem espesso e escuro. Já na cozinha da nonna Teresa tinha um fogão à lenha sempre aceso. Lembro de ver todos os dias sua massa aberta com o rolo de madeira e separada com farinha de milho, que depois era acrescentada na minestra de pasta e fasoi. Recordo dos pedaços de massa crua que surrupiavamos para tostar com açúcar sobre a chapa do fogão, do moedor de pimenta com aquela gavetinha, da polenta fria do jantar coberta com um pano branco que meu pai brustolava na chapa e comia com ovos ou com leite no café da manhã… É, a cozinha da casa da gente não alimenta só o corpo, alimenta estas lembranças tão vivas e tão perfumadas que parece que abriremos uma porta e elas ainda estarão lá… A vocês uma receita que me faz recordar minhas duas avós, Teresa e Emilia: A HISTÓRIA DOS GNOCCHI E DO PAPAGNOCO! Apesar de ser minha nona Emilia que fazia gnocchi todas as semanas era minha nona Teresa que dizia: "Sei proprio un papagnoco!". Quando o fazia sabiamos que alguma tolice haviamos cometido. Papagnoco para todos nós, os netos, era alguém bobo, que se deixava ludibriar. O que não conheciamos era a história e o significado daquele xingamento familiar. Ela era de Verona, comune de Oppeano, na região Veneto, norte da Itália. Veio com sua família em 1896, seu pai, Francesco Tambara, por quarenta e dois anos foi professor da escola local. Aos filhos, ensinou italiano gramatical. Muito genioso, brigava com os outros da colônia que falavam somente dialeto, eles não se convenciam que aquele, o de Francesco, fosse o verdadeiro italiano. Mas como poderão ver nem Francesco e seus filhos conseguiram escapar das malhas culturais da própria terra: "Papagnoco" foi sempre usado no seu bom e fiel dialeto veronês. Voltemos ao "Papagnoco". Em 1990 na Itália, era quase carnaval e, pela primeira vez, fora de minha casa, ouvi o termo "Papagnoco". Procurei ver quem havia dito e fiquei surpresa quando, pela rua, vi aproximar-se um enorme cozinheiro italiano, muito bufo e gordo, agitando um enorme garfo de madeira (un "piron") com un grande "Gnoco". Quem era? A figura mais tradicional do carnaval de Verona "Il Papà dello Gnoco", que distribui no Venardì Gnocolar (Sexta-feira dos Nhoques) nhoques gratuitamente nos bairros do centro histórico. A tradição tem suas raízes no século XVI. Naquele tempo o nhoque era oferecido aos moradores sobre uma grande mesa de pedra, La pièra del gnoco, que agora se acha no gramado em frente a Catedral de San Zeno, ao lado da estátua decapitada de Tommaso Da Vico, fundador do Carnaval Veronês. As famílias de Verona tem o costume, neste dia do ano, de degustar o tradicional prato. GNOCCHI VERONESI (Para 4 pessoas) Massa: 1kg batatas, 300g farinha, 1 ovo, sal, manteiga. Pele e cozinhe as batatas, peneire ou processe, deixe esfriar, incorpore a farinha, o ovo e o sal. Misture até ficar macia e unida. Espalhe farinha na mesa e forme pequenos rolos grossos um dedo, corte-os de 3 em 3cm e passe-os de um dos lados no ralador para formar o desenho de uma rede na sua superfície e aderir melhor o molho. Ferva água com sal e jogue-os, um pouco por vez. Quando subirem estarão prontos. Reserve e coloque manteiga para não grudar. Molho: 800g carne de gado, 500g cebolas, 50g óleo de oliva extra virgem, 2 col. sopa manteiga, ½ l vinho tinto seco, 2 cenouras médias, 2 folhas de louro, 4 cravos, 1 ramo de canela, sal, pimenta do reino, 1 col sopa páprica. O molho deve ser feito com antecedência, quanto mais tempo ele cozinhar melhor ficará. Corte finamente a cebola e a cenoura e doure-as com metade do óleo, acrescente o óleo restante, deixe reaquecer e una a carne cortada em cubos. Cozinhe por 20 minutos, acrescente o vinho, todos os temperos e o sal. Deixe cozinhar em fogo muito baixo até consumir quase todo o vinho. No final a carne deverá estar desmanchando, a cebola e a cenoura deverão ter desaparecido. Desfie a carne que ainda não desmanchou e ferva mais 30 minutos. Para conseguir um bom resultado você deverá usar o fogo realmente baixo, é o segredo deste molho. Se a carne não desmanchar acrescente mais um copo de vinho e use a panela de pressão por 20 minutos. No final do cozimento você acrescenta a manteiga, deixando-a derreter no calor do molho, sem cozinhá-la. Na Itália também é usual a carne de cavalo, Pastissáda de Caval. Para servir intercale camadas de nhoque e molho e finalize com parmesão. Acompanhe com um bom vinho tinto encorpado. A TRADIÇÃO DO GNOCCO DELLA FORTUNA Teve origem numa lenda italiana, que diz que um pobre casal da região de Sriuli, ao norte da Itália, dividiu um prato de nhoque com um mendigo que havia lhes pedido comida. Antes de sair, o mendigo agradeceu e desejou fortuna ao casal. Quando eles foram retirar os pratos da mesa, descobriram moedas de ouro e prata embaixo do prato em que o mendigo havia comido. O casal, com isso, pode prosperar e enriquecer. Como ninguém sabe exatamente em que mês isso aconteceu, em todos os dias 29 de todos os meses do ano, coloca-se um pouco de nhoque no centro do prato e, em pé, come-se sete pedaços do nhoque. Depois é só sentar e comer o restante. Embaixo do prato coloca-se uma moeda ou cédula de qualquer valor (alguns usam a nota de um dólar) e após terminar a refeição guarda-se o dinheiro até o dia 29 do dia seguinte, quando ele deve ser dado a alguém ou utilizado para comprar alguma coisa. Com isso, acredita-se que não faltará dinheiro durante todo o ano. A VERDADEIRA HISTÓRIA DE MENEGOTTA Na bela Verona, vivia um velho avaro chamado Tinazzo. Ele tinha casado com uma pobre e vistosa jovem chamada Menegotta que porém não sabia fazer nada. Um dia o cozinheiro da casa infartou e, exatamente naquela noite, tinha um jantar importante com os parentes de Tinazzo. O marido chamou a mulher e pediu que cozinhasse os nhoques no lugar do cozinheiro, já que era carnaval. A mulher respondeu que não sabia cozinhar nada, muito menos nhoques. Então o marido disse:"Eu te ordeno!". A mulher, em lágrimas, pediu que ele contratasse outro cozinheiro, mas Tinazzo, avaro como só ele, respondeu:"Nem se fala, o velho cozinheiro trabalhava grátis, se contrato um novo ele vai querer um salário enorme. Vai já para a cozinha e prepara os nhoques sozinha!", falou isto e saiu da sala. Menegotta então chorando e suspirando, encontrou um livro de receitas e apoiou na mesa, leu e releu a receita e quando entendeu bem, chegou a dar um salto no ar de alegria. Quando pulou, bateu no livro que caiu junto com um saquinho de cimento branco que se misturou com a farinha. Recolheu então a farinha e recomeçou a misturar os ingredientes. Fez os rolinhos, cortou, e feitos os nhoques botou na água fervendo ignorando o porque de sua extraordinária dureza. "Na água amolecerão" pensou. Levou-os a mesa e os convidados começaram a comer com gosto. Repentinamente ouviu gritos de todos que começaram a cuspir os dentes quebrados. Menegotta escapou chorando esperando que o marido se acalmasse. Durante a sua fuga, o marido inventou a dentadura e ganhou muito dinheiro com os ricaços desdentados da época. Menegotta, enquanto isso, vagava sozinha e desesperada até encontrar um homenzarrão que lhe disse:"Minha menina, por que choras?". Menegotta respondeu:"Ah, se o senhor soubesse, fiz uns nhoques tão duros que quebrei os dentes do meu marido e de todos os seus convidados!" "Nhoques duros? Mas isto é um insulto a mim, querida esposinha. Eu sou o Pai do Nhoque – Papà del Gnocco – e vou te ensinar a fazer os melhores nhoques de Verona!". Assim para Menegotta começou o curso de culinária. Depois de uma semana voltou para o marido que, neste meio tempo tinha aumetado muito o próprio capital e sucesso com a venda das dentaduras. Quando a viu chegar o avaro teve uma grande idéia, ordenou uma festa pra centenas de convidados e fez Menegotta ela cozinhar nhoques, esperando poder vender muitas dentaduras. Infelizmente, ninguém quebrou os dentes e ele acabou ficando sozinho e pobretão enquanto Menegotta abriu um restaurante e tornou-se conhecida e rica. LA VERA STORIA DI MENEGOTTA Quando arriva carnevale, mangiar gnocchi non fa male, ma se è Menegotta a farli stai attento a non mangiarli! Un dì giunsero i parenti Del marito assai contenti, ma la moglie in cucina abbondò con la farina, con le uova esagerò, pure il sale rovesciò. Quando il piatto poi servì Qualche urlo si sentì. Alla fin tra i gran signori Nuova moda saltò fuori: una protesi dentale se gli gnocchi fanno male.