Luiz Carlos Garrocho By Rafael Reinehr / Share 0 Tweet Algumas pessoas perguntam se é possível, no âmbito das políticas públicas de cultura, realizar um trabalho que contemple a diversidade, a inovação, a transdiciplinaridade, os novos agenciamentos e apropriações coletivas e democráticas dos espaços e tempos? Respondo afirmativamente. E como termino um ciclo de gestão cultural, quando estive à frente dos Teatros da Fundação Municipal de Cultura […] Algumas pessoas perguntam se é possível, no âmbito das políticas públicas de cultura, realizar um trabalho que contemple a diversidade, a inovação, a transdiciplinaridade, os novos agenciamentos e apropriações coletivas e democráticas dos espaços e tempos? Respondo afirmativamente. E como termino um ciclo de gestão cultural, quando estive à frente dos Teatros da Fundação Municipal de Cultura de Belo Horizonte (2005 a 2009), apresento este pequeno balanço das horas. A imagem acima traz a página de um dos jornais de Belo Horizonte (Jornal O Tempo, matéria de Daniel Barbosa ), mostrando a arrancada da ação. Na foto, Ricardo Aleixo e Renato Negrão, poetas e performers que se apresentaram no evento de abertura com outros artistas, lançando também a Zona de Invenção Poesia &, parceira da Arte Expandida. Laboratório Textualidades Cênicas – Imagem de Glenio Campregher Improvisões – Imagem de Glenio Campregher A ação trouxe para a cidade projetos ousados, inovadores, mobilizadores e transparentes do ponto de vista da gestão pública para a cultura. Não se trata de autoelogio, mas de reconhecimento de um novo agenciamento em arte e cultura que contou, inclusive, com presenças importante de artistas, acadêmicos e mobilizadores culturais. O que não nos impede de realizar autocríticas. Quando você cria projetos a partir de análises, conceitos e forças de arte e cultura, a avaliação deve ser contínua: que impactos sobre público e artistas? que modalidades de participação? como se dá o acesso aos programas e projetos? Improvisões – Imagem de Glenio Campregher Duas linhas foram desenvolvidas: Arte Expandida – experimentação das linguagens artísticas e Ressonâncias, com projetos musicais que procuravam atender às políticas de juventude. Uma história que começou no Centro de Cultura Belo Horizonte (1999-2005), quando realizamos projetos como Cabaré Voltaire (na linha da performance art, idealizado juntamente com Ricardo Aleixo e que teve a participação de Gil Amâncio na abertura), Janela do Caos (debates com poetas e escritores), Studium (espaço para que os artistas demonstrassem diante do público como eles criaram uma obra específica), Leitura Aberta (performance literária), Seminário (conferências de arte e cultura) etc. Por fim, devo citar a Zona de Ocupação Cultural, quando artistas tomavam os espaços do Centro de Cultura de meio-dia às 02 da madrugada, com apresentações simultâneas, recitais, performances, bandas de rock na rua, folguedos populares etc. Momentum – Imagem de Glenio Campregher Na ação Arte Expandida três projetos foram criados: Improvisões – improvisação intermídia (corpo, imagem e som, co-idealizado com Marcelo Kraiser e produção artística de Malu Aires), Momentum – a composição no instante (projeto voltado para a área da dança, com curadoria de Dudude Hermann) e Laboratório: Textualidades Cênicas conteporâneas (projeto dedicado às dramaturgias pós-texto e da cena, intervenções urbanas e site specific, com curadoria de Fernando Mencarelli e Nina Caetano). Foram projetos que apostaram no diálogo não-hierárquico entre artistas de diversas mídicas, na improvisação como um estado mental conectado ao Zeitgeist (espírito de época) contemporâneo e no estudo das dramaturgias da cena. Estiveram à frente do Arte Expandida, artistas e pesquisadores de renome, de Belo Horizonte, de outros Estados e de outros países, ministrando oficinas, cursos, conferências, debates ou presentes nas comissões de seleção, os seguintes artistas e pesquisadores de renome: André Lage, André Semenza e Fernanda Lipi (Zikzira Teatro Físico), Antônio Araújo (Teatro da Vertigem), Carlos Mendonça (BH), Christine Greiner (PUC-SP), Fernando Villar (UnB), Gabriela Christófaro (BH), Inês Link (BH), Ione Medeiros (Officina Multi-Média – BH),Izabel Stuart (BH), Johannes Birringer (Inglaterra-Eua-Alemanha, em parceria com o Fit), Tarcísio Homem (BH). Hip-Hop in Concert – Imagem de Glenio Campregher Já a ação Ressonâncias trouxe dois projetos musicais: Hip-Hop in concert e Quarta Sônica – Rock independente e autoral. Na elaboração e monitoramento do primeiro, tivemos a participação do Coletivo Hip-Hop Chama, Gil Amâncio, Flávio e Renegado (da produção) e Edson de Deus. Obviamente que a gestão a que estive à frente não se limitou à essas duas ações. Apenas exponho a novidade que foi a aposta na experientação e nos projetos para a juventude. A Mostra de Artes Cênicas para Crianças foi outro trabalho realizado. Cabe dizer que a recebemos como Mostra de Teatro Infantil, um projeto vitorioso que já vinha em sua 11a edição. Temos a felicidade de mostrar que antes de qualquer coisa, procuramos dar continuidade aos projetos existentes para depois partir para a inovação. Uma questão de princípios, pois não poderíamos nunca desmanchar o que foi feito, simplesmente seguindo nossos caprichos. No caso da Mostra, ampliamos seu raio de ação, entre outras mudanças, trazendo espetáculos de dança, de formas animadas etc. Realizamos outras ações, porém o foco dessa postagem é as duas linhas de ação citadas. Mas vale a pena falar do apoio para a criação do Verão: Arte Contemporânea – um novo festival de arte para a cidade de Belo Horizonte, idealizado e dirigido pelo Officina Multi-Média. Laboratório:Textualidades Cênicas Contemporâneas – Imagem de Glenio Campregher Voltando às duas linhas de ação, quero sublinhar que me surpreendeu a resposta dos artistas aos projetos, principalmente Improvisões, demonstrando que estávamos no caminho certo. Ao contrário do que pensa o conservadorismo, as novas linguagens e a experimentação, bem como a mobilização social e cultural são capazes de atrair público significativo. Além disso, as ações reverberam no porvir. O que falta: indicadores de uma nova economia (uma economia da abundância), que envolve a produção criativa, a fim de avaliar os efeitos e impactos sobre a cidade. Devo dizer ainda que tudo isso foi precedido pela minha direção do Centro de Cultura Belo Horizonte, onde desenvolvemos uma série de projetos, na sua maior parte experimentais, mas sempre pensando no intercâmbio geracional e na diversidade cultural. Foram projetos como Zona de Ocupação Cultural, Cabaré Voltaire, Leitura Aberta, Seminário, etc. O jornalista Marcelo Castilho Avelar foi quem mais entendeu a ação do Centro de Cultura: uma programação voltada para uma juventude que não se enquadra nos formatos tradicionais. Um dos grandes projetos por nós concebidos e executados na época, foi o Cinema Marginal – Cinema de Invenção, que teve curadoria de Ricardo Júnior e Ataídes Braga e contou com presenças de cineastas e artistas que participaram do movimento. Foi show de bola. Qual o segredo? Normalmente, o que temos em política pública para a cultura é a repetição do mesmo, ou seja, a execução daquilo que já está digerido e se mantém como padrão e gosto disseminado e dominante. Há ainda o investimento em grandes eventos e festivais, que são importantes e possuem potencial alavancador, mas devem ser seguidos de projetos contínuos, de uma política efetiva. O que marcou nossa trajetória pode ser definido em dois aspectos principais: a necessidade de trabalhar na perspectiva dos serviços permanentes na área da cultura e a criação de novos agenciamentos culturais. A defesa dos serviços culturais permanentes para a área pública da cultura implica numa reviravolta na velha “política de ocasião”. E também deve ter por base a capacidade de gerar movimento na vida cultural da cidade para além dos efeitos fortuitos. Ao mesmo tempo, investimos na primazia da importância dos processos de apropriação e reinvenção em arte e cultura. E tudo isso feito em trabalho de equipe, com os agentes governamentais e da sociedade civil em interação e aprendizado mútuo. Improvisões – Imagem de Glenio Campregher Passar com o novo pelas fronteiras rígidas não é fácil. É preciso uma dose de alegria e de insistência constantes. E nunca acreditar que não se paga um preço por audácias. Incompreensões sempre existirão. A questão pode se resumir a isso: que forças você consegue mobilizar para trabalhar com arte e cultura, fugindo aos estereótipos da área, ao comodismo e ao lugar-comum. A gestão Gilberto Gil no Minc foi uma das expressões que mais trouxe novos alentos para a área da cultura. Houve polêmica, desafio, debate. Quarta Sônica: Rock Independente – Imagem de Glenio Campregher Alguém me perguntou se não é frustrante trabalhar com políticas públicas nas esferas governamentais, devido à necessidade de continuidade e aprofundamento, que nem sempre são consideradas. Sempre digo que não existem condições ideais, que nós devemos, sempre, abrir espaço para a sensibilidade e o convencimento da importância das idéias que nascem do coletivo. Respondo citando Fenando Sabino: “De tudo ficam três coisas: A certeza de que estamos sempre chegando, A certeza de que é preciso continuar A certeza de que seremos interrompidos antes de terminar Portanto, devemos fazer da interrupção Um caminho novo. Da queda um passo de dança Do medo uma escada Do sonho uma ponte Da procura um encontro.” É preciso entender que política cultural tem a ver com a economia da libido (Lyotard). Termino, por fim, com a despedida-porta-estandarte do poeta russo Klebnikov (1914), no combate de sempre por essas alegrias: Hoje de novo sigo a senda Para a vida, o varejo, a venda, E guio as hostes da poesia Contra a maré da mercancia. (tradução de Augusto de Campos) Mais referências – – Veja no Youtube: Arte Expandida 1 e Arte Expandida 2 – Leia o nosso artigo sobre a Política Cultural dos Teatros Municipais, publicado na Revista Pensar BH, da Secretaria Municipal de Políticas Sociais. – Blog do fotógrafo Gleinio Campregher Agradecimentos especiais: A todos aqueles e aquelas que trabalharam direta ou indiretamente para o sucesso dos projetos: parceiros e parceiras de todas as horas, dos agentes públicos e equipes dos Teatros, incluindo diretorias, técnicos e funcionários da Fundação Municipal de Cultura, e principalmente aos artistas e mobilizadores culturais. Pessoas que acreditam na melhoria e democratização do espaço comum. O meu agradecimento especial a Monica Andrade, Rose Cancela, Alysson Felipe, André Ferraz (que gerenciaram os teatros), Leo Pinheiro, Carlos Fróes (com sua maravilhosa equipe), Ricardo Júnior e Ric Macedo, que estiveram juntos a cada hora. Leia no blog de origem: Olho-de-Corvo » um blog de Luiz Carlos Garrocho