Brasil By Paulo Ghiraldelli Jr / Share 0 Tweet A recente entrevista de José Dirceu causou grande reação por parte da imprensa brasileira. Foi esta a forma que ele planejou para retornar ao cenário político brasileiro. Sob os holofotes, demonstra que ainda é capaz de fazer política mesmo sem mandato, e ainda tirar o sono de Lula. Desde 2005 que o PT não consegue mais passar seis meses sem produzir uma bomba contra si mesmo. Nem bem iniciamos 2008 e petistas, ex-petistas e afluentes despejam água suja uns contra os outros. Com uma entrevista de Zé Dirceu, o inferno astral desse pessoal foi reavivado. Essa balbúrdia toda que Zé Dirceu trouxe para a agenda de 2008 é o modo como ele tem de voltar a fazer política. Ele perdeu o que mais amava na vida, o seu mandato. Então, resolveu mostrar aos que ficaram que ele pode fazer política mesmo sem mandato. Se política é uma atividade baseada na demonstração de força, então Zé Dirceu está certo. Com uma só entrevista ele conseguiu mexer com a direita e com a esquerda. Zé Dirceu sabe que a direita política brasileira está resumida a alguns jornalistas, e não mais que isso. Políticos profissionais ideologicamente de direita são poucos. No jogo ideológico, quanto à direita, o que faz volume são alguns conservadores da mídia. Esses jornalistas estão sedentos no sentido de noticiar algo que sirva para dizerem “vejam como o que eu dizia era verdade”. E gente assim é facilmente manipulável. A direita jornalística caiu de quatro diante de Zé Dirceu. Agiu exatamente como ele queria. Fez o barulho que ele queria que fizesse, e lhe deu força, novamente, contra a esquerda – atingindo em cheio a senadora que foi candidata à presidência, Heloísa Helena – e contra o governo – tirando o sono de Lula. E assim, o velho Zé começa 2008 nas manchetes novamente. Zé Dirceu é um “animal político”. Ele raciocina segundo um único desejo, o de poder continuar nas manchetes, o de poder mostrar força, o de demonstrar que não conseguiram lhe tirar aquilo que ele ama que é a vida política. O “mensalão” era bem isso: um dinheiro gasto não para comprar congressistas e, então, levar adiante um projeto de governo, mas para comprar congressistas e, assim, ficar no poder para então poder comprar mais congressistas e ficar no poder. Ao contrário do que a direita vive proclamando, o projeto associado ao “mensalão” não era guiado pelo lema “os fins justificam os meios”, e sim pela frase “os meios são meios para adquirir mais meios”. Bem, alguém poderia dizer “puxa vida! como que um homem como Zé Dirceu não percebeu que tudo aquilo que vinha comandando poderia desmoronar caso Roberto Jefferson levasse adiante as ameaças que vinha fazendo? Simples: o amor à política de Zé Dirceu é tão grande que ele via como inadmissível uma atitude suicida de Jefferson. Ou seja, sendo político, Jefferson deveria agir como ele, Zé Dirceu, e amar a sobrevivência política. Todavia, o obcecado Dirceu não conseguiu ver que a política pode ser amada de outro modo. Jefferson resolveu simplesmente chegar ao êxtase (político) não pela continuidade. Em um determinado momento, Jefferson passou a nutrir por Zé Dirceu um único sentimento: o desejo de derrotar o homem que era o número 1 do Presidente Lula, como ele fora o número 1 do Presidente Collor. O amor de Roberto Jefferson pela política implicava no suicídio. Zé Dirceu não conseguiu compreender isso, e deixou o barco correr. Quando quis reverter o quadro, era tarde. Mas e para nós, cidadãos, o que tudo isso importa? O problema nosso é que enquanto todos voltam os olhos para Zé Dirceu e sua capacidade de voltar à política sem estar na política, um contingente grande de funcionários de Lula, sem rostos, andam pelo Brasil segundo uma ampliação da burocracia governamental. Professores, advogados, engenheiros, secretários e sindicalistas (muitos) (esposas e parentes desse pessoal) etc. – há um número grande de pessoas apoiando Lula e o seu desgoverno por uma razão simples: são empregados da máquina estatal. Uns são empregados indiretos, outros estão em cargos de confiança e uns terceiros estão concursados, mas não são efetivos. O PT pode não existir mais, mas Lula vem criando outro partido, o “partido do staff”. Vargas tinha esse esquema, o PTB era para ter força no campo sindical e urbano, o PSD era para organizar a própria máquina estatal, através de funcionários e burocratas, e articulá-los aos donos de terras. Donos de terras e funcionários governamentais sempre se deram bem no Brasil. Essa construção de Lula vai gerar, para o futuro, um grupo de pessoas que não saberemos quem são, mas eles saberão claramente quem são e o que tem de fazer. Nós não saberemos que eles formaram uma “rede de troca de favores”. Mas eles saberão. Permanecerão fiéis a essa rede. A coisa é grande: desde cargos nas agências de fomento à pesquisa até pequenos empregos na assistência social; Lula tem ampliado o staff direto e indireto em um estilo que lembra Vargas e Brizola: o número de funcionários pouco competentes, que estão sendo contratados (por todos os meios), visa preencher as fileiras de um exército que deve substituir o que foi a militância do PT. Nesse sentido, Lula é parecido com Zé Dirceu. O que importa é ficar no poder para ter mais poder. Lula não vai se aposentar quando terminar seu mandato; ele vai comandar esse segundo “partido” que está montando. Essa nova agremiação terá braços por todos os lados. Em cada casa haverá um “militante” por estar ligado, de alguma forma, à “rede de trocas” gerada durante oito longos anos de gestão Lula. Assim, Lula poderá continuar a fazer política, e de modo mais real que a política de Zé Dirceu. Na verdade, Lula nunca admirou Zé Dirceu. Zé é o homem do prazer – ele goza fazendo política, ainda que não com a mesma verve dionisíaca de Jefferson. Lula é pequeno, luta pela sobrevivência do cotidiano. Lula precisava de Zé Dirceu para os discursos, para a linha política do PT, mas se inspira, de verdade, na trajetória de sobrevivência de José Sarney, mas com uma visão de agregar funcionários públicos, como Vargas fez. Fiquem sabendo: nossa máquina estatal não está sendo inchada à toa.