Shyamalan & o mundo vegetal

Quando se fala em plantas assustadoras lembro-me, de imediato, de Branca de Neve, desenho animado de 1937, cujo bosque (no qual a bonitinha se perde) é recheado de troncos e galhos fantasmagóricos que, certamente, à época, devem ter provocado calafrios na garotada. De lá para cá parece que um pacto foi feito (há exceções, sei): […]

Quando se fala em plantas assustadoras lembro-me, de imediato, de Branca de Neve, desenho animado de 1937, cujo bosque (no qual a bonitinha se perde) é recheado de troncos e galhos fantasmagóricos que, certamente, à época, devem ter provocado calafrios na garotada. De lá para cá parece que um pacto foi feito (há exceções, sei): o mundo vegetal propôs um armistício e as plantas, quando não são vítimas da serra elétrica, aparecem nos filmes como símbolos da imponência natural. Isso até Manoj Nelliattu Shyamalan, dito M. Night, aparecer e escrever/produzir/dirigir Fim dos Tempos, The Happening, um filme irregular – é verdade -, mas que fez justiça: as árvores têm seu lugar nas relações agressivas entre as espécies. Não só as árvores, mas a vegetação em si: da inofensiva gramínea à gigantesca sequóia, se esta última coubesse na tela.

Fim+dos+temposÉ engraçado ver o clichê repetir-se: a paranóia do terror é a resposta a todas as perguntas. Por outro lado, o clichê se dissolve – o governo, que deveria orientar os cidadãos e tentar acalmá-los, é solenemente ignorado. Não há autoridades civis ou militares na película. Em suma: todos estão à mercê, igualam-se, não há saída para ninguém. Hitchcock fez isso, em Os Pássaros. Caso as aves resolvessem atacar os grandes centros, ninguém escaparia à fúria. A propósito: a lógica de Os Pássaros estende-se a Fim dos Tempos: o motivo não é importante; a conseqüência, sim.

Shyamalan não fez um grande filme desde O Sexto Sentido, aquele em que o guri via gente morta. Corpo Fechado é uma homenagem aos heróis dos quadrinhos – e só. A Vila é mais ou menos, embora a premissa do isolamento seja curiosa. Sinais tem a vantagem – irônica – de expor o combate Deus versus extraterrestres, e o Todo-Poderoso jogando no time de Mel Gibson. Fim os Tempos não vai muito além, mas diverte. Sei que alguns vão se aborrecer com a “resolução” do filme; outros vão afirmar que Mark Wahlberg não segura uma história sem uma arma na mão. Veja, então, Boogie Nights.

O filme provoca sustos demais, a meu ver. É um recurso que, se usado à exaustão, deixa de funcionar. Um mérito da película: as cenas de suicídio são pra lá de estilosas. O indivíduo entregando-se aos leões do zoo, como um cristão injustiçado, é genial. Procurei na telona o Shyamalan, que geralmente – à Hitchcock – aparece nos próprios filmes. Não encontrei. Vou rever quando sair em devedê, só para procurá-lo, entre a vegetação.

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Francisco Grijó

Francisco Grijó, capixaba, escritor, professor de Literatura Brasileira. Pai de 4 filhas.