Forum Social Mundial 2009 – Socialismo ou Barbárie?

Sou militante, estou vivo, sinto nas consciências viris dos que estão comigo pulsar a atividade da cidade futura que estamos a construir. (…) Vivo, sou militante. Por isso odeio quem não toma partido, odeio os indiferentes. A. Gramsci, 1917

O Comitê Mineiro participou com uma grande caravana em todos os fóruns realizados no Brasil. Agora, mais uma vez, nos deslocamos para Fórum Social Mundial (FSM), em Belém. Foram 54 horas de viagem de Belo Horizonte ate Belém, atravessando Minas, Brasília, Goiás, Tocantins, Maranhão e Pará onde pudemos perceber a devastação ambiental e o predomínio do agronegócio.

A escolha da Amazônia, pulmão do mundo, teve o objetivo de denunciar a depredação dos recursos naturais sobre a lógica do modo de produção capitalista, sendo uma ameaça física e biológica para o planeta. A Amazônia é uma região compreendida pela bacia do rio Amazonas, a mais extensa do planeta, formada por 25.000 km de rios navegáveis, em cerca de 6.900.000 km2, dos quais aproximadamente 3.800.000 km2 estão no Brasil. A Amazônia Legal brasileira abrange os estados do Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima,Tocantins, parte do Maranhão e cinco municípios de Goiás. Ela representa 59% do território brasileiro, distribuído por 775 municípios, onde viviam em 2000, segundo o Censo Demográfico, 20,3 milhões de pessoas (12,32% da população nacional), sendo que 68,9% desse contingente em zona urbana.

Com os olhos voltados para a humanidade, o FSM de Belém buscava fazer história, tal como os que o precederam. O de 2001 foi um marco, conseguindo reunir movimentos e entidades do mundo todo, fazendo o contraponto ao neoliberalismo e ao pensamento único. O segundo, em 2002, se amplia e mostra seu potencial de critica ao modelo neoliberal, mesmo tendo ocorrido logo após os atentados de 11 de setembro e de toda a repressão desencadeada pelo governo Bush sobre os que se lhe opunham. Em 2003, enfrenta uma grande discussão, a partir da carta de princípios: a participação dos governantes. Lula, acabava de ser eleito e, indo para Davos, passa em Porto Alegre e é recebido em uma grande manifestação. Conta também com a presença de Chavez. Organiza também a maior mobilização desde a Guerra do Vietnã, contra a Invasão do Iraque. Em 2004, vai para a Índia se internacionalizando e se popularizando. Em 2005, com 155 mil inscrições e em torno de 180 mil participantes é o maior evento mundial contra o neoliberalismo. 2006 é o fórum policentrico (Américas, Ásia e África). Nas Américas ocorre em Caracas, fortalecendo Chavez no enfrentamento ao Império, contando com uma participação de 80.000 pessoas. Em 2007, é a vez do continente Africano, indo para o Quênia.

Em termos numéricos, seu sucesso é absoluto. No FSM da Amazônia os números são também expressivos: 133 mil pessoas inscritas de 142 países, sendo 15 mil no acampamento da juventude, e em torno de 150 mil pessoas envolvidas. Teve 5.808 entidades e organizações inscritas. A América do Sul contou com 4.193, a África com 489 organizações, a Europa com 491. A Ásia teve 334, a América do Norte 155, América Central 119 e a Oceania 27.

Mas, os números não conseguem refletir a grandiosidade do evento. Como descrever a multiplicidade de cores, de representação cultural, diversidade nos debates, riqueza de etnias? Andar pelos espaços do Fórum é deparar com barracas de exposição de artesanato da Economia Popular Solidária, com mesas de publicação de diferentes movimentos, jornais de todas as tendências, barracas com livros novos e usados. E ver as barracas dos acampamentos cobrindo grandes áreas. E, de repente, nos deparamos com o belíssimo painel da luta da Anistia alem de outros diferentes painéis. Imensas tendas das entidades sindicais. Palcos com apresentações ininterruptas. Continuando a caminhar, debaixo de um calor de 40 graus e/ou de uma intensa chuva, aparece um desfile indígena. Quando achamos ter terminado o desfile, nos defrontamos com o das mulheres, com suas coloridas cabeleiras e seus tambores. São tantas as pessoas andando pelo espaço do Fórum que parece uma permanente caminhada ou marcha ou manifestação. Em todos os espaços, as denuncias, lutas e propostas organizativas.

O Fórum tem as suas grandes personalidades. Mas a sua grande estrela, a sua grande magia, tornando tudo tão atraente e significativo, é o papel que cada participante assume, fazendo dali uma ampla construção coletiva. Só por isto ele já é importante. Está na hora porém, de romper a barreira apenas do pensamento, do discurso, da emoção e passar para a construção de uma proposta alternativa de organização econômica e social.

Neste ano presenciamos a maior crise econômica desde 1929, o massacre do povo palestino e a continuidade da devastação ecológica. Diante disto, qual e a resposta dos trabalhadores, dos povos oprimidos e explorados? O capital se recicla e busca dar respostas. Boaventura de Sousa Santos uma das estrelas do fórum diz que, “se não dermos a solução, ela virá de Davos com mais capitalismo e menos direitos. São eles que estão a pensar soluções. Nós reunimos desde 2001 e não fomos nós que derrotamos o neoliberalismo, ele cometeu suicídio. Eles estão lá em Davos pensando o que vai ser o capitalismo depois da crise. E nós, o que estamos fazendo?”

Como diz Leandro Konder, “Diante de crise de tamanhas proporções, é preciso insistir em um outro padrão de comportamento. Um padrão que, em vez de competitivo, seja solidário. Em vez de excluir, inclua. Em vez de gerar misérias e mazelas sociais, promova o desenvolvimento individual e coletivo. Em vez de descartar quem não se enquadra, garanta chances desiguais aos desiguais. Em vez de alijar os que não o reproduzem, valorize aqueles que apontam caminhos diferentes. Em vez de depredar, poupe os recursos naturais. Em vez de produzir passivos ambientais, produza alternativa natural. Em vez de ameaçar o planeta, coloque-se ao lado dele.”

Sabemos que a riqueza do Fórum é a sua diversidade e pluralidade mas isto não pode levar a diluição e fragmentação, como se fosse uma nau sem rumo. Neste fórum os participantes se perderam em um cipoal de milhares de atividades fragmentadas onde pudemos perceber duas grandes correntes. Uma que procura humanizar e gerenciar o capitalismo e a outra, constatando a barbárie legada pelo sistema, busca a unidade dos trabalhadores rumo ao socialismo. Estamos com Rosa Luxemburgo: socialismo ou barbárie.

Na formatação do Fórum atual, fica outro grande dilema: sua carta de princípios, que excluía os partidos políticos e o Governo. Desde 2003 percebe-se uma mudança quando Lula chega ao governo e vai a Davos e ao Fórum Social Mundial. Desde então, há um aumento da presença dos governantes. Este ano, o grande evento foi a presença de 5 presidentes. Até que ponto isto em interferido na autonomia dos movimentos sociais, nas suas lutas e reivindicações?

E o Fórum vai se modificando. Algumas mudanças são chocantes e vai contra toda sua historia. Destacamos a exigência feita em Belém de se apresentar crachá para entrar nos espaços do Fórum. E claro que anteriormente, em algumas atividades mais concorridas, entravam as pessoas inscritas. Mas, os espaços do Fórum sempre foram abertos, na busca de envolver a cidade no evento. Em Belém, os moradores dos arredores das universidades federais, por sinal uma região muito pobre, foram excluídos. O Comitê Mineiro ficou alojado nesta região e conviveu com outras políticas de controle feito pelo governo: fechou bares a partir de 22horas, proibiu festas populares e colocou um verdadeiro batalhão de policia nas ruas. Tranqüilidade para os participantes do Fórum e exclusão e repressão para o povo.

Outra medida desconhecida nos outros fóruns: distribuição de credenciais para participar do debate com os presidentes. Substituiu assim a lógica do universal – onde todos tem o mesmo direito limitando pelo tamanho do espaço e pela ordem de chegada – para a lógica do focalizado – onde os amigos dos organizadores são os favorecidos.

Isto não tirou a importância da atividade com os presidentes, em especial pelo contundente contraponto que Evo, Chaves, Correa e Lugo fizeram a Davos, chamando à construção de uma outra sociedade e à unidade e integração da América Latina (Alba), fortalecendo os países diante da crise.

Evo Morales, o presidente da Bolívia, foi taxativo quanto à crise: “Se nós – o povo do mundo – não conseguirmos sepultar o capitalismo, o capitalismo vai sepultar o mundo”, e na necessidade de se construir o socialismo do século 21. Ele propôs a criação de quatro campanhas para combater a crise, fortalecer a economia e a soberania das nações pobres:

1 – Uma campanha mundial pela paz

2 – A luta por uma nova ordem econômica e social de justiça e desenvolvimento, que reforme os organismos internacionais e que paute o mundo por indicadores de distribuição de riqueza

3 – campanha para salvar o planeta, alterando os padrões de consumo da sociedade;

4 – outra campanha que valorize a humanidade através da diversidade e respeito cultural. “Só uma humanidade que valoriza a si mesma pode sepultar o capitalismo”.

Chávez, em um breve discurso, fala que a criação do FSM foi muito oportuna porque aconteceu num momento de efervescência política no continente.

Para Correa “O socialismo do século 21 vai propor um novo modelo de desenvolvimento, estamos com a oportunidade de criar algo novo e melhor”.

Porem para nos, que saímos de Minas embalados pelas mobilizações locais contra o massacre dos palestinos, foi chocante. Não houve nenhuma grande mobilização ou atividade em defesa do povo palestino. Isto não impediu que tivessem faixas, camisetas bottons em defesa da causa palestina. Esperávamos que o grande debate e propostas de lutas, fosse a crise e a palestina, o que não ocorreu. Isto mostra os limites que FSM esta tendo.

Para o Comitê Mineiro, continuamos afirmando que “um outro mundo é possível”, fora do capitalismo.

Agenda aprovada pelos Movimentos Sociais

8 de março – Dia dos Direitos da Mulher;

14 a 22 de março – mobilização e Fórum paralelo ao Fórum Mundial da Água de Istambul;

Começa em 28 março, em Londres, a semana de ação a nível do G20;
30 de março – Mobilização contra a guerra e a crise / Dia de Solidariedade com o povo palestino;

4 de abril – Dia de Ação no 60º aniversário da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN);

17 de abril – Dia Internacional para a Soberania Alimentar

1º de maio – Dia Internacional dos Trabalhadores
Julho – dias de Ação do G8 na Itália

12 de outubro – Dia Mundial de Ação para a Proteção da Mãe Terra, contra a mercantilização da vida.

12 de dezembro – Dia de Ação Global sobre a Justiça Climática em conferência de Copenhague, Dinamarca, sobre o clima.

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Dirlene Marques