Hypocrisis By Luiz Afonso Alencastre Escosteguy / Share 0 Tweet Há um meme rolando na internet onde uma pessoa pergunta: “por que será que tem tanta gente contra a vacina?” e outra responde: “Porque foram vacinados quando eram crianças”. O fenômeno é mundial, sem dúvida, e existe desde que desenvolveram as primeiras vacinas, ainda lá no fim do século retrasado. Quem não conhece a história da “revolta da vacina”? Em meados de 1904, chegava a 1.800 o número de internações devido à varíola no Hospital São Sebastião. Mesmo assim, as camadas populares rejeitavam a vacina, que consistia no líquido de pústulas de vacas doentes. Afinal, era esquisita a idéia de ser inoculado com esse líquido. E ainda corria o boato de que quem se vacinava ficava com feições bovinas.No Brasil, o uso de vacina contra a varíola foi declarado obrigatório para crianças em 1837 e para adultos em 1846. Mas essa resolução não era cumprida, até porque a produção da vacina em escala industrial no Rio só começou em 1884. Então, em junho de 1904, Oswaldo Cruz motivou o governo a enviar ao Congresso um projeto para reinstaurar a obrigatoriedade da vacinação em todo o território nacional. Apenas os indivíduos que comprovassem ser vacinados conseguiriam contratos de trabalho, matrículas em escolas, certidões de casamento, autorização para viagens etc. (Fiocruz) Uma pequena diferença para os dias atuais: o atual presidente da República disse que os vacinados poderiam virar jacaré. Não foi original, como se vê, apenas trocou o bicho. Algo se pode dizer sobre essa atual questão: não fora o comportamento negacionista do presidente e não teríamos os contra vacina atuando tão fortemente. E, relembremos, todos vacinados desde criança e vivos – graças as vacinas – para poderem espernear à vontade. Fato incontestável, repito: o presidente, com sua postura diante da pandemia e da vacinação, causou tudo isso. Tivesse ficado de boca calada e tão somente feito a sua obrigação, não teríamos chegado a atual situação de mais de 620 mil mortos. E os contra vacina simplesmente não teriam tomado e pronto. Simples assim. Mas não. A sanha presidencial atiçou a besta dormente em muita gente, tendo inclusive um “líder” religioso que chegou a afirmar que vacinar crianças era um infanticídio. O suprassumo da bestialidade dita por quem deveria, até por “crença”, defender a vacina. Mas não, a besta é seguidora de quem abriu a boca pela primeira vez: o presidente. A coisa toda chegou a tal absurdo, que em Quebec/Canadá o governo local proibiu a venda de maconha e bebidas alcoólicas para que não estivesse vacinado. Resultado? Aumentou, segundo o noticiário, em 300% a procura pelas vacinas. As vacinas são obrigatórias no Brasil há muito tempo. O Estatuto da Criança e do Adolescente, de 1990, reforçou isso no §1º do artigo 14: “É obrigatória a vacinação das crianças nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias.” Ora, o Plano Nacional de Imunização incluiu, recentemente e após aprovação pela ANVISA, a vacinação de crianças de 5 a 11. E os adolescentes já tiveram sua vacina liberada desde 2021. Assim, é muita hipocrisia qualquer tipo de alegação que se faça contra a vacinação. De qualquer um. Dos cinco aos mais de cem anos. Principalmente a que alega cerceamento da liberdade das famílias em não querer vacinar seus filhos.