Demografia By José Eustáquio Diniz Alves / Share 0 Tweet A Igreja, tradicionalmente, tem sido tolerante com os crimes de violência sexual. Mas, agora, para o espanto de todos, um arcebispo reeditou a infame frase dita por Paulo Maluf: “Estupra, mas não mata”. Uma menina vinha sendo abusada sexualmente pelo padastro desde os 6 anos de idade. Aos 9 anos ela ficou grávida de gêmeos. Uma criança que deveria estar brincando e estudando de repente se vê transportada para a vida adulta, mesmo sem ter desenvolvimento físico e psíquico. Pior, na avaliação dos médicos, a menina não tinha condição de levar à frente a gestação, pois sua compleição corporal e a pélvis não tinha estrutura para o desenvolvimento dos bebês. Segundo a lei brasileira, o aborto é legal no caso de estupro e no caso de se colocar em risco a vida da gestante. Portanto, a interrupção da gravidez era o recomendado e o que foi feito pelos médicos Dr. Olimpio Moraes e Dr. Sérgio Cabral do CISAM – Centro Integrado de Saúde Amaury de Medeiros. A Comissão de Cidadania e Reprodução – CCR, organizou um abaixo assinado em apoio aos médicos e à instituição que mostrou seu compromisso com a saúde, com a vida, com a cidadania e os direitos humanos da população. Ver no link: http://www.ccr.org.br/a_iniciativa05_mar09.asp Este caso de violência, infelizmente, não é um fato isolado. Recentemente, uma estudante de 18 anos foi estuprada dentro do campus de sua universidade, na Barra Funda, zona oeste de São Paulo. Uma outra menina de 6 anos foi encontrada violentada e morta num bairro de Frutal, no Triângulo Mineiro. Uma criança de 11 anos moradora de Iraí, há 481 km de Porto Alegre, que já está prestes a ter o bebê, foi estuprada pelo pai adotivo, num caso semelhante ao da gravidez da menina de Alagoinha/PE. A lista de violência doméstica e de gênero é longa e reflete uma triste realidade brasileira. Contudo, esta brutal realidade foi ignorada ou até mesmo tolerada (quem sabe mesmo reforçada) pelo Arcebispo de Olinda e Recife, D. José Cardoso Sobrinho, ao excomungar os médicos e a mãe da menina estuprada, mas não excomungar o padastro estuprador. Segundo o religioso, o “crime” do aborto é mais grave do que o estupro. Não quero entrar na discussão da hierarquia dos pecados, mas o fato é que o religioso excomungou a mãe da menina que sofreu duplamente com o drama da filha e a traição e a violência do seu ex-cônjuge, enquanto o padastro continuou sendo aceito no seio da comunhão da igreja. É como se o estupro e a violência sexual fosse um pecado venal, passível apenas de algumas penitências. Todo o ocorrido não deixa dúvidas de que a Igreja Católica tem grande dificuldade de lidar com a questão da sexualidade. Os padres não podem se casar. O homossexualismo é um pecado. Condenam a camisinha mesmo para evitar doenças sexualmente transmissíveis (DST) e a AIDS. São contra métodos contraceptivos modernos para se evitar a gravidez indesejada. Portanto, a única solução aceitável para todos os aspectos da sexualidade é a sua negação, por meio da abstinência sexual. Evidentemente, as “tentações da carne” são mais fortes do que a fé, pelo menos para a maioria dos mortais. O resultado é que as mulheres que não desejam ter filhos em determinado momento ou simplesmente não querem mais filhos, mas engravidam, recorrem ao aborto. O homossexualismo é cada vez mais assumido. Os adolescentes fazem cada vez mais sexo e em idades cada vez mais precoce. Mas a igreja continua oferecendo como única solução a abstinência sexual e não se preparara para lidar com os “problemas” da sexualidade. Não sabendo lidar com as diversas orientações e práticas sexuais, a igreja não oferece alternativas viáveis de saúde pública nesta área e não age com firmeza nos casos de violência sexual. A pedofilia, por exemplo, deveria sim ser combatida com vigor. Mas, infelizmente, padres pedófilos faz parte de uma triste realidade mundial, como mostrou Pedro Almodóvar no filme “Má Educação”. A igreja precisa compreender que a sexualidade não pode ser tratada como um tabu. A sexualidade não tem a ver com privação, mas sim com prazer e com respeito. Homens e mulheres, independentemente de suas orientações sexuais, têm o direito de gozar uma vida sexual sadia. Só precisam ter o cuidado para se proteger e não ferir o semelhante.