Uma visita ao acaso ou ao ocaso


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E se acontecer de você entrar num museu, que apesar de conter obras assinadas por Salvador Dali, Picasso, Matisse e não ver público? Alguma coisa pode estar errada…

Foto: Solange Ayres – Escultura em bronze Arno Breker

 

E se acontecer de você entrar num museu, que apesar de conter obras assinadas por Salvador Dali, Picasso, Matisse e não ver público? Alguma coisa pode estar errada…

 

 

 

 


Foto: Solange Ayres – Detalhe do Burgo de Nörvench

 

 

De muitos castelos e burgos existentes na Alemanha restam somente ruinas, pois foram infelizmente destruidos nas guerras, mas os que sobraram foram reconstruidos e preservados, como é o caso do Burgo de Nörvenich. A história do burgo remonta do ano de 1400, quando era administrado por senhores feudais e seus cavaleiros ligados à familia real dos Grafen; hoje pertence à família dos Bodenstein que o transformou em museu.

Pois um dia meu marido e eu fazíamos uma caminhada em volta do pequeno parque que cerca o burgo Nörvenich, quando resolvemos por acaso entrar para fazer uma visita, ja que no portão havia uma placa: “Hoje aberto”. Avancei pátio adentro imaginando quem teria habitado aquele lindo burgo, outrora cercado de água, em cujo fosso, hoje seco é um jardim de exposição de esculturas de bronze do museu.

Ja dentro do burgo, eu sem muita paciência para ler os detalhes, pois não tinha planejado visita a museu e nem tinha comigo os “zóculos” para perto, ( ja preciso dessas coisas), fui informada pelo guia que se tratava de esculturas de Arno Breker, um artista identificado como Nacional Socialismo. Na verdade estava naquele momento mais interessanda na arquitetura do burgo que naquela exposição “kitch” de objetos de arte e de qualquer forma fui fazendo fotos.

Foto: Solange Ayres – Museu da Arte Européia – Arno Breker

Pois não é que na segunda feira o meu marido comentou com um colega de trabalho que tinha visitado o Museu de Nörvenich e ele: “-Ih, você foi visitar museu nazista?” Ja era tarde: nós realmente tínhamos entrado em filme errado e não era à toa que o museu estava às moscas. Nenhum alemão em sã consciência iria visitar hoje o museu, mesmo contendo obras assinadas por Salvador Dalí, Picasso, Matisse. Parece que la a gente ia pegar uma moléstia grave, uma praga de tão mau afamado que é essa exposição de obras de Breker, nome que esteve sempre associado à arte do Terceiro Reich e ele o seu maior expoente.

Se tivesse em Schwerin, Meckelnbug-Vorpommen, antiga Alemanha Oriental em agosto de 2006, teria ajudado os ativistas do Anti-G8(foto), que numa demonstração contra a exposição das obras de Breker, embrulharam literalmente as estatuas e solicitaram que os visitantes presentes se retirassem.

Ninguém iria fazer uma visita ao Museu Arno Breker por acaso e sim por ser “o ocaso”.

* ocaso: do latim occasum, declínio, decadência.

 

 

Foto: Arquivo Indymedia

Quem foi ele?

Foto: Solange Ayres – Escultura em bronze

Arno Breker (1900-1991) foi artista, escultor e arquiteto identificado com o ideal de perfeição antigo-renascentista e ganhou nada mais nada menos que fãs como Adolf Hitler e Mussolini. Sua preferência por figuras masculinas, musculosos atletas de corpos saudáveis e bem delineados foi sua marca registrada. Os nazistas viam na sua obra a representação do ideal estético de beleza da raça pura ariana. Assim o novo estilo alemão foi proclamado. De 1936 a 1980 trabalhou e participou de inúmeros projetos arquitetônicos e decorativos financiados pelo regime nazista, inclusive com utilização de mão de obra de prisioneiros de guerra de 1943-46.

Breker como muitos em outras áreas do conhecimento colocou sem críticas sua criatividade a serviço de ideais fanático-nacionalistas sacrificando sua própria liberdade e dignindade e hoje ainda é motivo de controvérsias. Muitas perguntas ficaram em aberto, de como um artista se deixasse ser utilizado pelos nazistas e ao mesmo tempo ser amigo de vanguardistas como o escritor e poeta francês Jean Cocteu (1889-1963), o “enfant terribel”, bissexual e dependente de ópio?

Interessantemente apesar de seu engajamento em projetos do “Führer”, foi salvo da “queima”. Em 1948 foi “reabilitado” e continuou recebendo encomendas de trabalhos de firmas como a firma Gerling de seguros e do Chanceler Konrad Adenauer (1876-1967).

90 % de suas obras de Breker foram destrutidas durante e após a guerra e a viuva Charlote Breker, 79, sua segunda esposa, guarda até hoje a 7 chaves o acervo de cartas, fotos e mais de 200 esculturas. O resto esta no museu e poderiam mesmo… serem embrulhadas.

 

Foto: Solange Ayres – Prometeu escultura em bronze.

Prometeu

Encobre o teu Céu ó Zeus
com nebuloso véu e,
semelhante ao jovem que gosta
de recolher cardos
retira-te para os altos do carvalho ereto
Mas deixa que eu desfrute a Terra,
que é minha, tanto quanto esta cabana
que habito e que não é obra tua
e também minha lareira que,
quando arde, sua labareda me doura.
Tu me invejas!
(…)
Eu honrar a ti? Por quê?
Livras-te a carga do abatido?
Enxugaste por acaso a lágrima do triste?
(…)
Por acaso imaginaste, num delírio,
que eu iria odiar a vida e retirar-me para o ermo
por alguns dos meus sonhos se haverem
frustrado?
Pois não: aqui me tens
e homens farei segundo minha própria imagem:
homens que logo serão meus iguais
que irão padecer e chorar, gozar e sofrer
e, mesmo que forem parias,
não se renderão a ti como eu fiz*

* Prometheu: Goethe, 1774.

Na mitologia grega, Prometeu foi aquele que roubou o fogo de Zeus para dar aos homens e assim puderam se distinguir dos outros animais. Como castigo Zeus ordenou a Hefesto para acorrentá-lo em cima do Monte Cáusaco onde todos os dias o seu fígado era devorado por uma ave. Como era imortal, se regenerava a cada dia. A pena era para ser cumprida em 30.000 anos, mas Hércules, depois de ter cumprido o seu 12° trabalho, libertou Prometeu e colocou no seu lugar o centauro Quíron. O ato de roubar o fogo, guardado por seres que não permitiam a sua difusão e entregar aos humanos representa a vontade humana na busca por conhecimento e dufundi-lo. Prometeu foi fonte de inspiração não somente para Arno Breker*, mas também Goethe (1749-1832), poeta alemão, que dedicou lhe um poema (acima) e Karl Marx (1818-1883) e considerado como o seu herói favorito.

Fotos: Museu Arno Breker – Coleção de Arte Européia, Lövenich, comarca de Düren, Alemanha.

Foto da introdução:Solange Ayres Escultura em bronze – Arno Breker.

Foto: http://de.indymedia.org/

Fonte: Deutsche Wikipedia.

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Solange Ayres