Arena Livre By Ricardo Montero / Share 0 Tweet Não fosse ridiculamente parcial a quase totalidade de nossa imprensa, seria surpreendente o silêncio de nossos meios de comunicação quanto à correção da tabela de Imposto de Renda retido na fonte, da ordem de 4,5%, efetuada em janeiro corrente. Os números comprovam: para o bolso de boa parte dos assalariados, a economia proporcionada pela correção da tabela de IR é maior que a auferida com a extinção da CPMF. Dois foram os assuntos que dominaram a seara política nas últimas semanas. O primeiro foi o embate entre governo e oposição em torno da prorrogação da cobrança da CPMF. Fez-se valer a vontade da oposição, que conseguiu no Senado a rejeição à prorrogação deste imposto. O outro assunto foi o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras, de modo a parcialmente compensar os 40 bilhões de reais que deixarão de ser arrecadados em 2008 sob a rubrica da CPMF. Ambos os assuntos foram tratados pela imprensa com estardalhaço. Salvo raríssimas exceções, nossa mídia defendeu o fim da CPMF e protestou contra a elevação do IOF, assumindo posição claramente favorável à redução da carga tributária – ainda que feita de forma atabalhoada e improvisada, ninguém sabendo ao certo as conseqüências do corte de 40 bilhões no orçamento do país. Por isso tudo, não fosse ridiculamente parcial a quase totalidade de nossa imprensa, seria surpreendente o silêncio de nossos meios de comunicação quanto à correção da tabela de Imposto de Renda retido na fonte, da ordem de 4,5%, efetuada em janeiro corrente, notícia esta relegada às notas de rodapé. Pela nova tabela de IR, o limite de isenção mensal passa de R$1.313,69 para R$1.372,81. A título comparativo, quem auferir rendimento igual ao novo limite de isenção de R$1.372,81, nada recolherá, ao passo que pela tabela antiga recolheria R$8,87. Pois bem: falando-se em CPMF a 0,38%, para se arrecadar esses mesmos R$8,87 economizados, a movimentação necessária seria da ordem de – pasmem – R$2.334,21! Fazendo-se as contas, a CPMF que caberia a movimentação de R$1.372,81 seria de apenas R$5,21. Os números não mentem: a correção da tabela do IR em 4,5% é mais benéfica que a supressão da CPMF até o limite de rendimentos de R$6.218,42. Para alguém que auferir rendimentos mensais nesse valor, tanto a extinção da CPMF quanto a correção da tabela de IR em 4,5% proporcionam uma economia em impostos pagos de exatos R$23,63, tanto em um quanto em ouro caso. A partir dos tais R$6.218,42, a supressão da CPMF é mais relevante que a correção da tabela do IR. Para quem se perdeu no meio de tantas contas, em poucas palavras, é o seguinte: comparando-se a correção da tabela de IR e a supressão da CPMF, esta última é mais relevante para os isentos de Imposto de Renda (que ainda assim recolheriam no máximo apenas R$5,21 de CPMF) e para os que ganham acima de R$6.218,42. Para os demais contribuintes, em especial os de classe média, a correção da tabela de IR é muito mais importante para o bolso do que a extinção da CPMF. Vale lembrar que a tabela de Imposto de Renda é progressiva, com três alíquotas: 0%, 15% e 27,5%. Por sinal, o governo FHC inflingiu aos assalariados autêntico tarifaço fiscal, ao deixar por sucessivas vezes de corrigir a tabela (em oito anos de governo, a tabela foi corrigida uma única vez). Funcionava assim: a tabela não era corrigida, e os salários tinham correção próxima ao valor da inflação. Resultado: muitos que não recolhiam IR passaram a recolher; outros recolhiam sob alíquota de 10% e migraram para a faixa dos 27,5% – ou seja, todos pagando cada vez mais IR, sem que houvesse a justificativa de um aumento real de renda (reposição da inflação não é a mesma coisa que aumento salarial). Desse modo, ao fim do governo FHC a tabela já acumulava 39,5% em correções que indevidamente deixaram de ser feitas. Nos dois primeiros anos do governo Lula, a história se repetiu, com a defasagem acumulada chegando a 63,42% – os 39,5% do governo FHC e 17,15% do governo Lula. Seria cômodo para o atual governo, sempre acusado de furor fiscal, deixar tudo como estava; a arrecadação com o IR dos assalariados aumentaria mais e mais, tanto pela ampliação do universo de contribuintes quanto pelo incremento de valores individualmente arrecadados. Em 2004, o governo Lula estabeleceu um redutor de R$ 100,00; posteriormente, a tabela foi corrigida em 10%. Em dezembro de 2006, Lula decidiu corrigir anualmente a tabela de IR em 4,5%, entre 2007 e 2010, por meio de medida provisória posteriormente convertida em lei. Voltando à CPMF: algum dos leitores acredita que o empresariado vá abater dos preços cobrados nos produtos o valor que deixa de ser recolhido aos cofres do governo? Pois eu não acredito ( e duvido que alguém acredite nisso). Aliás, uma história recente, revelada por Paulo Henrique Amorim: em um evento, o célebre médico Adib Jatene, criador da CPMF, encontrou Paulo Skaf, presidente da Fiesp e cérebro por trás da campanha contra a CPMF. Conversaram. ‘Doutor Jatene, a carga no Brasil é muito alta!’. E Jatene: ‘Não é, não! É baixa. Têm que pagar mais’. Skaf continua: ‘A CPMF foi criada para financiar a saúde e o governo tirou o dinheiro da saúde. O senhor não se sente enganado?’. E Jatene: ‘Eu, não! Por que vocês não combatem a Cofins (Contribuição para Financiamento da Seguridade Social), que tem alíquota de 9% e arrecada R$ 100 bilhões? A CPMF tem alíquota de 0,38% e arrecada só R$ 30 bilhões’. Skaf diz: ‘A Cofins não está em pauta. O que está em discussão é a CPMF’. ‘É que a CPMF não dá para sonegar!’, diz Jatene." Em suma, os últimos episódios relativos à questão tributária mais uma vez mostraram a aptidão da imprensa em atender aos interesses da elite. Jornais, revistas, rádio e televisão entraram de cabeça na campanha contra a CPMF. Comparativamente, desde os primórdios do plano Real, em momento algum nossa mídia se aliou aos assalariados na luta pela correção da tabela do IR. No mais, a correção da tabela de IR ficará eternamente relegada aos rodapés dos jornais de janeiro, haja vista que essa desoneração tributária partiu de Lula, governante por eles tachado como principal responsável pela elevada (opinião deles) carga tributária brasileira. Para a oposição e para os barões da imprensa, que se fale de Lula – não como o responsável pela correção da tabela de IR, mas sim como defensor da CPMF e do aumento da IOF. De modo infame e parcial, nossa imprensa se alia à oposição, quando sem qualquer pudor parafraseia o ministro Rubens Ricupero – “o que é ruim a gente mostra, o que é bom a gente esconde”. Que vergonha…