Supremo perde o foco e todos saem mal na foto


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Esfriados os ânimos a respeito do prende-e-solta do caso Daniel Dantas e tomando emprestada a linguagem de minha outra coluna aqui no OPS, constato: muitos os que perderam o foco e saíram mal na fotografia. Entretanto, ainda que aparentemente sem a menor intenção, Gilmar Mendes (tenebroso na foto) evidenciou as diferenças do funcionamento de nossa Justiça para cidadãos de diferentes estratos sociais.

Esfriados os ânimos a respeito do prende-e-solta do caso Daniel Dantas e tomando emprestada a linguagem de minha outra coluna aqui no OPS, constato: muitos os que perderam o foco e saíram mal na fotografia.

A começar pela Polícia Federal, que a despeito das constantes operações que permeiam nossos noticiários, mostra-se dividida. O delegado Protógenes Queiroz enfrentou o esvaziamento logístico imposto pela atual chefia da casa e precisou tocar a operação Satiagraha quase clandestinamente. No calor dos acontecimentos, Protógenes foi obrigado a sair de cena “para fazer um curso”, enquanto o diretor-geral da PF “resolveu sair de férias”. Em suma, e a despeito das ridículas desculpas oferecidas para consumo externo, a base da PF suspeita da sua cúpula; esta, por sua vez, não detém o comando da corporação.

O Executivo também se atrapalhou no episódio. Lula e Tarso Genro se meteram no vespeiro e fizeram confusão digna de elefante em loja de louças. Sob a batuta de ambos, ficam as dúvidas a respeito dos porquês do afastamento de Protógenes – afinal, quem não deve não teme. A imagem dos dois fica arranhada com o episódio, tanto mais estando em pauta a escandalosa e oligopolesca fusão – com dinheiro do BNDES! – da Oi e da Brasil Telecom.

A imprensa meteu os pés pelas mãos. Ventilou-se que Dantas teria uma bancada de jornalistas trabalhando a soldo; resta esperar o desenrolar dos fatos para eventualmente sabermos mais: quem, onde, quando e por quê. Talvez até por isso, observa-se que grande parte da imprensa, convenientemente ou não, esqueceu de analisar o caso Daniel Dantas e preocupou-se com a correção gramatical do inquérito (parece piada mas é verdade), com a questão do uso de algemas (em “doutores”, of course), e também com a cobertura ao vivo da prisão de Celso Pitta. A Globo, por sinal, não reclamou quanto a esta última questão, beneficiada que foi com a exclusividade de imagens. Não se trata, porém, de algo inédito; por ocasião da prisão do ex-governador Paulo Maluf, o mesmo César Tralli e equipe lá estavam, câmera na mão, uniforme da PF no corpo. Evidente: o vazamento de informações para a imprensa pode comprometer o sucesso dessas operações. Adicionalmente, a imprensa transforma essas prisões processuais (i.e., de réus não condenados) em espetáculo, o que propicia os pré-julgamentos de praxe. Enfim, a questão dos vazamentos para a imprensa tem sua relevância, mas não justifica que se minimize os achados da investigação sobre Dantas.

Dentre os derrotados, o maior – sem dúvida – é o Supremo Tribunal Federal, posto na berlinda, em especial pelas atitudes destemperadas de seu presidente, Gilmar Mendes.

Gilmar conseguiu, em tempo recorde, soltar Dantas por duas vezes, em decisões de discutível juridicidade. Por sinal, Dantas e Gilmar tornaram-se notórios à mesma época: um como personagem dos mais ativos na controversa privatização das telecomunicações operada por FHC, outro como advogado-geral da União do mesmo governo. Sensatamente, motivo mais do que suficiente para que Gilmar alegasse suspeição e passasse o caso para outro ministro do STF.

Juridicamente, muito se discutiu a respeito da admissibilidade de julgamento dos habeas corpus por parte do STF, e também os argumentos utilizados por Gilmar em suas decisões. Filigranas do Direito à parte, os atos de Gilmar tiveram como conseqüências práticas um inédito clamor contra o STF. Manifestações de cidadãos pediram o impeachment de Mendes, cuja conduta foi objeto de reparos em ácidos manifestos de juízes e delegados federais.

Se por um lado Gilmar rachou o Judiciário, por outro fez o favor à sociedade de demonstrar cabalmente existência de cidadãos de primeira, segunda e terceira classe. Os de primeira têm acesso a advogados caríssimos, com contatos necessários para, durante o recesso do STF, em plena noite, conseguir um habeas corpus. Enfim, uma Justiça que, sendo justa ou não, funciona. Os de segunda conseguem pagar um advogado, ainda que estes não sejam estrelas caríssimas e bem relacionadas. Por sinal, são estes os advogados que freqüentemente dão com a cara na porta de juízes de primeira instância se recusam, durante o expediente, a recebê-los em seus gabinete. A terceira classe não tem dinheiro para advogados, dependendo de sobrecarregadas defensorias públicas ou de programas de assistência jurídica gratuita.

Vitoriosos, até agora nessa história? Apenas Daniel Dantas, que segundo Walter Maierovitch, ex-juiz e colunista do Terra Magazine, em breve terá ainda mais motivos para sorrir. Segundo Walter, o senador Heráclito Fortes (DEM-PI) foi considerado – por Gilmar Mendes – “investigado”, o que tirará o processo da alçada do juiz Fausto De Sanctis para a do STF (foro privilegiado para um senador). Detalhe: foi o próprio senador, dileto amigo de Dantas, quem pediu acesso ao inquérito, motivando a ascensão do processo para o STF. Uma jeito inteligente de tirar da jogada o bem reputado juiz De Sanctis.

Estou curioso – mas não muito esperançoso – em saber as posições dos demais dez ministros do STF quanto ao caso Dantas. Ou meu nariz me engana ou o cheiro de pizza está forte… Oxalá eu esteja enganado! De todo modo, e aqui eu agradeço ao Gilmar, a máscara enfim cai e mais e mais se evidencia que em muitos escalões da República existe uma preocupação infinitamente maior com banqueiros alojados por rápidas horas em celas confortáveis (com comida do Empório Santa Maria trazida pelos advogados) do que com joões-ninguém em celas superlotadas.

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Ricardo Montero