Berros de Cassandra By Stella D´Agostini / Share 0 Tweet Amadurecimento. A vida cobra rituais repetitivos dos jovens, adultos, crianças e idosos de forma a tentar simular a garantia de uma espécie de amadurecimento humano. Não sei bem se falamos de rituais de passagem como descreveu Turner, ou de rituais de transe e comunicação como no filme de Jean Rouch. Porém uma coisa é quase um consenso, a superação pelos rituais cotidianos está aí, pronta para nos confrontar e pedir constantes ‘amadurecimentos’. Há os que digam que vivemos uma jornada da alma, do corpo, da mente e de qual for a parte do ser humano responsável por traçar caminhos, ou seguir caminhos prévios. Mas será que somos tão doutrinários e fragmentados assim? Seria mesmo a autoajuda – tão popular hoje – a resposta para as angústias contemporâneas nas escolhas do dia a dia? Vejo as coisas de uma forma diferente. Seria como um labirinto repleto de elementos internos e externos ao indíviduo, não apenas ele sozinho, como no assunto favorito dos autores e políticos, cheios de eu, e pronomes na primeira pessoa do singular. A vida como um elemento singular e coletivo, como um elemento a mais nesse labirinto cheio de vida, morte e coma. O humano sem seu aspecto individual, uma forma de fusão da primeira e terceira pessoa do plural, sempre. Não é uma prisão dicotômica, vida e morte, bem e mal, vilão e mocinho. A sociedade vem viciando o coletivo cada dia mais a ver tal labirinto como uma guerra, uma disputa entre dois polos, e se esqueceu do que os une e o que os separa, a complementaridade. Dessa forma, o humano caminhante na sua forma de ser mais um dos elementos desse universo conjugado, entre ele, os outros e o que mais couber e existir na estrada. Exemplificando pelos enfrentamentos ritualísticos da vida ocidental: se superar, romper barreiras, eliminar concorrências, ter sucesso. Todos termos usados abundantemente numa espécie de ‘seleção natural forçada’ pela autoajuda e pelas pressões de um sistema que não sabe, pelo menos até agora, compreender a simplicidade do espontâneo comprometimento, da chamada utopia da coletividade. Não reduzo o termo coletividade ao empregado por muitos grupos cheios de regras e relacionamentos de conflito egoico, este um grande coitado inflado pela sociedade contemporânea ocidental. Somos frutos de um frenesi cientifico ou religioso que acaba deixando o que tanto se esforça para compreender – o coletivo, o conjunto, o todo – para se prender nas partes e setorizar o caminho deste labirinto tão vasto por onde vamos. Nem transe nem passagem, o ritual do humano cultuado hoje é narcísico, e nada disso envolve o outro e o respeito ao alheio. Como diriam os avós, ou bisavós, respeite se quiser ser respeitado, ou seja, enxergue o outro como semelhante e diferente se quiser ser visto também. Neste belo labirinto, por onde a humanidade vaga cheia de sí, os elementos e valores humanos se perderam por aí, e seguimos em um caminho quase apocalíptico de um ponto sem saída. Cabe a nós a nova perspectiva de educação, consciência que se expanda do fragmento e entenda de verdade o todo, sem mocinhos, bandidos ou soluções milagrosas. Resta ao humano de hoje colocar o pé no chão, sentir o solo, o ar, a umidade e tudo mais que o cerca – inclusive outros seres – para ver que competir dizima, devasta e machuca sí mesmo. É hora de deixar o ego calar e ouvir a tão amedrontadora sensibilidade dos loucos, afinal são eles que urram profecias assustadoras e alternativas utópicas. Um pouco dessa loucura e utopia não faz mal a ninguém, isso lembra da história da árvore que só cai se alguém ouvir. Pois é, continuando assim morreremos sem ninguém saber, ou melhor, não morreremos, vagaremos no beco sem saída e sem fim. Será que vale a pena? Nós, os pares achamos/acham que não.