Antropocentrismo, patriarcalismo e femicentrismo

O antropocentrismo tem marcado a história humana. O sistema que coloca o ser humano no centro do Universo, usa os recursos naturais como propriedade exclusiva da espécie e coloca a humanidade como detentora máxima de direitos, na prática, é um sistema egocêntrico e egoístico. Para superar o antropocentrismo, a Declaração Universal dos Direitos Humanos precisa ser ampliada para abarcar os direitos da Terra e dos animais sencientes.

Se os direitos humanos não podem ser entendidos a outras espécies, então estes direitos precisam ser questionados. Por exemplo, os direitos a uma vida saudável e sem maus tratos podem ser estendidos a diversas outras espécies. Mas os direitos à cidade e ao desenvolvimento são direitos que beneficiam a humanidade, mas não são aplicados aos animais. Ao contrário, quanto maiores forem os efeitos das cidades e do desenvolvimento, menores serão os espaços da biodiversidade. Nestes casos, a humanidade precisa, por imperativos éticos, auto-limitar suas atividades antrópicas.

Na sua longa história, o antropocentrismo tem sido também um sistema patriarcal, onde os homens adultos se colocam como os representantes máximos da humanidade e centralizam os usufrutos dos ganhos da exploração da natureza e da dominação sobre as mulheres (e crianças). Isto é o que Pierre Bourdieu chamou de “dominação masculina”.

Neste sentido, a luta contra o antropocentrismo é também uma luta contra a dominação patriarcal, que significa a dominação masculina que beneficia os homens (pais e maridos). O movimento feminista moderno – desde Olympe de Gouges, Mary Wollstonecraft, Nísia Floresta, Emma Goldman, Simone de Beauvoir, etc – sempre lutou pela igualdade de direitos entre homens e mulheres, pela igualdade de oportunidades, pela equidade de gênero e pelo empoderamento feminino em todos os campos de atividade. O movimento feminista tem sido e continua sendo um dos movimentos mais revolucionários dos últimos 200 anos e deve continuar sendo uma das principais forças transformadoras do século XXI.

Contudo, o feminismo precisa assumir a luta contra o antropocentrismo e contra o patriarcalismo de forma radical e não como uma simples mudança de sinal. Alguns setores do movimento feminista (que é saudavelmente bastante heterogêneo) querem tirar o homem do centro do Universo (o que é correto), mas, consciente ou inconscientemente, querem simplesmente colocar a mulher no centro do Universo. Este tipo de postura essencialista pode até resolver o problema do patriarcado, mas não resolveria o problema do antropocentrismo, que se tornaria matriarcal.

Ou seja, o femicentrismo é um sistema antropocêntrico e matriarcal representando uma imagem espelhada e inversa do antropocentrismo patriarcal. O femicentrismo poderia até ser uma forma de combater o patriarcado, mas não seria capaz de estender os direitos das mulheres às demais espécies e ao Planeta. Portanto, o que o mundo precisa é expandir os direitos humanos para além dos interesses específicos de homens e mulheres.

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José Eustáquio Diniz Alves