A você que pediu para fazer parte da minha vida outra vez

 “Finalmente, algumas pessoas têm tanto medo de ser rejeitadas ou abandonadas que nem mesmo entrarão em um relacionamento: ‘Se não tenho vínculo, não sou rejeitado (…) Outra forma problemática de lidar com [abandonos imaginários] é não se envolver profundamente. Essa estratégia esquiva e distanciadora é geralmente inconsciente, mas de modo geral se reflete em pessoas que buscam relacionamentos superficiais e sem significado. Essas pessoas podem dizer: ‘Ainda não conheci a pessoas certa’ ou ‘Não sei realmente se estou apaixonado’. Mas o que em geral acontece é que a pessoa tem tanto medo de rejeição íntima que evita se aproximar de alguém.” Robert Leahy, “E se quem eu amo me abandonar, Como lidar com as preocupações, p.176.


 
 

Como um vulcão ativo ardendo inflamado dentro do peito, recebi sua decisão de que não ficaria. Paixão de dois meses, foi bom enquanto durou, amanhã é um novo dia: queimei inconsolável. Ardi invocando os deuses dos milagres que salvam, que eles arrancassem dos braços de outros homens aquele que não me desejou por mais tempo.
 
A retórica destrói homens apaixonados, vai lacerando cada pedaço da esperança vital que nos torna pura angústia: Por que não eu?
 
Não tenho tantas qualidades: cheiro de terra alagada, olhos de despreparo, a pele de desespero iminente e chocolate amargo, o coração cheio compromissos que não existem, a boca profundamente lotada de verdades que não deveriam ser ditas, pois eu revelo quando quero, gosto, preciso, uso, distorço, improviso, desmereço, alivio, alimento, quando carrego para frente as despedidas que me estilhaçam. Não há algo mais parecido comigo no fim de uma relação que um copo de vidro estilhaçado no centro de um enorme galpão abandonado: destruído e escondido.
 
Quando o fim tornou-se próximo, caminhei leve. Passos de desconforto, após abandonos reais, me dão a impressão de que posso afundar em qualquer rigidez, descobrir crateras, realizar desastres, causar abalos cínicos na propriedade segura que alguns homens possuem de exercitar sua vaidade.
 
Sim, porque existem homens que nunca escolheram alguém realmente, que optaram por sua vaidade ou capacidade de sempre conquistar mais alguém com sua qualidade irrevogável de “Sou para uma vida a dois”. Não se apaixonaram ou amaram uma determinada intenção, um homem. Desejaram apenas. (Como você.) O que amam mesmo é a conquista: Em cada canto há sempre um homem, há sempre uma escolha querendo minhas escolhas, buscando meu amor, minha vida. E você não teve escrúpulos quando afirmou toda essa sua vaidade na minha frente.
Mas homens assim abandonam-se sem perceber, mil vezes e sozinhos.
 
Eu não saberia conquistar alguém em cada estado: os líquidos, eu sempre busquei os líquidos: que se derramam cientes que poderão, quando o amor crescer, se tornar personagens sólidos numa vida repleta de possibilidades. E o conflito, se surgir, evaporará suas formas deprimentes de tentar desistir, para logo em seguida, alcançar um céu inventado na hora do sonho bom, depois acumular-se em nuvens de otimismo e precipitar-se no mar plácido que é uma vida de amor-a-dois com humildade e escolha.
 
Já escolhi alguns poucos. Só nunca pedi que ficassem. Mas escolhi. No entanto, foram desmedidamente vaidosos. Argumentaram e raciocinaram sobre o amor, sobre parceiros que não duraram, sobre belezas conquistadas, como se amar fosse apenas isto: nunca estar vulnerável. 
 
Cedi para ser esquecido. É que o fato de se estar disponível para alguém não significa que ele fará parte de sua vida e te escolherá para viver dentro dele.
 
O que você não entendeu:
 
Paixão não dura a vida toda se não quisermos. E mesmo platônica, pode ser uma realidade.
 
E se eu disse Eu Te Amo, foi amor. Não existiam nuvens carregadas que escondessem a alegria disponível pra te receber sem tempestades.
 
Mas passou. Bastou eu decidir que não valia a pena querer sozinho. Pois não sustento um querer tão grande de mãos vazias.
 
Desapareci pra você. Só luto quando encontro aliados no compromisso. Solidão não vence desafios, mas permite conquistas.
 
Nunca me desesperei por amor. E se eu dissesse que insisti para alguém ficar comigo ou me entreguei apaixonado quando não houve o mínimo de reciprocidade, eu estaria mentindo.
 
Do outro lado deverá existir alguém que me receberá, alguém que me escolherá: com tudo o que me tornei. Você esteve sozinho mesmo estando comigo.
 
Não busco criaturas que esperam apenas Alguém que se encaixe em sua soberba, seja ele músculo ou futuro e sucesso.
 
Espero alguém que tenha escolhido meu nome, minha vida, sem vaidade, e que encarará minha escolha como um mundo novo. Viveremos juntos: dor, passado e gargalhadas.
 
Então entendi que se você partiu e não me escolheu, é porque não era o homem da minha vida. 
 
E talvez eu viva mais vinte e sete anos sozinho. Mas será com a consciência livre de remorsos e confusão, um claro e ensolarado dia de domingo, pois se existiu um homem que buscou o amor, mostrou-se disponível, aceitou sacrifícios, rompeu limites, sem perder seu valor, ou desistir de amigos e familiares, seguro de si, este alguém está aqui: Raimundo Neto.
 
 
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Raimundo Neto