Hypocrisis By Luiz Afonso Alencastre Escosteguy / Share 0 Tweet A frase foi dita durante o evento “Música: A Fronteira do Futuro – Criatividade, tecnologias e políticas públicas” (aqui, para quem quiser assistir. Ficará no ar por 30 dias, a partir de 25/08) por Gilberto Gil. “Possibilidade dos extremos” é uma expressão que remete, a meu ver, ao cerne das grandes transformações sociais pelas quais não apenas o mundo passa, mas principalmente o Brasil. Possibilidade, salvo melhor juízo, é capacidade, potência, vir a ser. Capacidade de exercer seja lá o que for. A vida, direitos, deveres, vontades. Ou mesmo de não exercer. O embate que vemos cotidianamente na sociedade, sobre os mais diversos temas, é fruto de uma história em que um dos extremos, ao mesmo tempo em que exercia a sua possibilidade de forma plena, negava a existência da possibilidade do extremo oposto. E aquilo que não se conhece, não exerce efeitos sobre nós. São os casos das manifestações sobre homoafetividade, da não inclusão cultural e digital, do não acesso aos serviços mínimos do Estado, da pobreza, da violência, da liberdade da internet e da produção de conteúdo cultural, enfim de todas situações de não reconhecimento da possibilidade, da capacidade. Dia desses, no Twitter, li alguém questionar a razão de uma parada do orgulho gay e comentar de que era possível obter o reconhecimento dos seus direitos sem necessidade de paradas. A questão é que as “paradas” e outras manifestações nada mais são do que um simbolismo da não existência. Para obter o reconhecimento da possibilidade, primeiro é necessário fazer-se reconhecer pela existência, daí as manifestações. Mas não basta ter direitos reconhecidos, isto é, ter sua existência reconhecida. Isso já está na Constituição. O que é preciso é o reconhecimento da possibilidade de um dos extremos, até então negada em sua existência pelo outro extremo que sempre exerceu o poder. Uma vez reconhecido pela sociedade a existência da possibilidade de ambos os extremos – e não de apenas um, o ponto de “igual possibilidade” será atingido, isto é, o justo meio. Mas isso não acontecerá sem alguma dor. À medida que, partindo do reconhecimento da existência, um dos extremos começar a abandonar o simbolismo das paradas e o sentido de vitimização que em geral o acompanha, e partir para transformar potência em ato, o outro extremo reagirá. E reagirá em grau ainda maior do que já tem reagido para reconhecer a existência. Vejam-se as constantes agressões contra homossexuais, as constantes manifestações da grande mídia, as manifestações das igrejas e a dificuldade existente, no Congresso (como bem relatado pela deputada Manuela D’Ávila, que participou do evento), para uma mudança na cultura legal do Brasil. O conceito de justo meio, ao menos com o entendi, parece mais adequado aos tempos atuais do que o tradicional “bem comum”(1), conceito um tanto vago, de diversas definições e que se presta muito mais a ser utilizado pelo extremo ora dominante como forma de se esquivar ao seu dever de aceitar os outros extremos. Mas isso é outra reflexão, que talvez deva ser alicerçada em argumentos mais bem fundamentados do que uma mera opinião. (1) “Bem comum é o bem de todos naquilo que todos temos em comum”, conceito que me recordo agora…