A Origem de Algumas Palavras da Matemática

Não se trata exatamente de um compêndio lingüístico a respeito de palavras matemáticas, mas este texto tem a pretensão de ajudar a entender a origem de algumas palavras usadas na Matemática. Algumas de uso tão corrente que já nem lembramos que pertence ao mundo daquela matéria escolar que nos ensina a “calcular as coisas”.E já temos a primeira palavra:Cálculo.

 

Lá pelo final da Idade da Pedra, quando não havia escrita (ou seja, não havia registros), e quando o homem deixou de ser nômade e de viver da caça e da colheita, passando a fixar-se ao longo dos rios, houve a necessidade de se registrar algumas “quantidades”, principalmente dos pequenos rebanhos que o homem começava a cuidar. Ora, não existiam números, não existia escrita e a forma de saber o tamanho de um rebanho era pela separação de algumas pedras: cada pedrinha equivalia a uma rês. Bem, não foi daí exatamente que surgiu a palavra, mas o hábito de se manipular pedras permaneceu por milhares de anos, inclusive para ensinar crianças a contar (já com nomes de números). Como a palavra latina para pedra é calculus, o ato de manipular pedras para aprender números tornou-se calcular, por derivação de sentido. Os cálculos renais ou de vesícula permanecem com o sentido original de pedra. A esses cálculos são preferíveis os numéricos, mesmo com muitos dígitos. Mais uma palavra interessante: dígito.


Depois de usar as pedras (ou ao mesmo tempos), o homem percebeu que o corpo humano poderia se usado para contar. Como as crianças fazem hoje em dia, quando começam a adquirir a capacidade numérica – contam nos dedos. Pois bem, esse artifício foi tão intensamente usado na história da humanidade, e por tanto tempo, que dedo virou sinônimo de número. Como a palavra latina para dedo é digitus, temos tanto a impressão digital quanto números com diversos dígitos. Ah, e toda nossa eletrônica e computação são digitais simplesmente porque os computadores trabalham com apenas dois dígitos: 0 e 1. Se não quiser usar a palavra dígito, pode usar outra: algarismo.


Durante a Idade Média, no período conhecido como “Idade das Trevas” ou “Noite que durou mil anos”, quando não houve nenhum avanço científico no Ocidente – ou mesmo um retrocesso (há controvérsias entre os historiadores, alguns dizendo que não foi tão ruim assim, que seria um termo cunhado pela burguesia neoliberal renascentista, etc. – deixo a discussão para os historiadores), os grandes nomes da Matemática eram originários do Oriente, mais precisamente entre os árabes. Um desses matemáticos, de grande prestígio, chamava-se Abu Abdullah Muhammad Ibn Musa al-Khwarizmi, ou al-Khwarizmi, para os mais chegados. Seu nome foi tão importante, que sua corruptela para as línguas latinas gerou os vocábulos algoritmo, logaritmo, e, claro, algarismo. Uma de suas mais importantes obras, Al-jabr w’al muqabalah, deu origem a outra palavra conhecida: álgebra.


Al-jabr w’al muqabalah ensina duas operações básicas para resolver equações. Jabr (colocar no lugar, consertar) refere-se à transposição de termos subtraídos de um lado da equação para o outro: x+2=12 torna-se x=10; o lado esquerdo foi “consertado, restaurado”. Muqabalah (cancelar) refere-se ao equilíbrio entre os dois lados da equação, obtido quando “cortamos” os termos iguais: x+y=y+8 torna-se x=8. “Os termos homogêneos e iguais então serão cancelados: isso é al-muqâbala; o membro com um sinal negativo torna-se positivo e é acrescentado ao outro membro: isso é al-jabr ”. Isso é álgebra. E para quem não gosta tanto da álgebra, resta a aritmética.


De origem bem menos complicada, a aritmética trata das operações com números. Os gregos manipulavam seus arithmós (αριθμός), a palavra grega para número, fazendo adições, subtrações multiplicações, etc. E o termo aritmética rapidamente se incorporou ao vocabulário.


Hoje dizemos que:


o cálculo e a álgebra podem ser mais difíceis que a trabalhar com números de muitos dígitos, ou muitos algarismos”. Mas poderíamos dizer que:

contar as pedras e restaurar equações podem ser mais difíceis que trabalhar com arithmós de muitos dedos ou muitos al-Khwarizmi”.

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Rossi Nogueira