Fernando Henrique Cardoso deve ser um homem triste.

Com todos é assim: os sintomas de que estamos “ficando velhos” começam quando nos pegamos, intimamente, revendo situações passadas na vida. Em algum momento surge, pela primeira vez e sem que a gente se dê conta, a exclamação “Ah! Se fosse antigamente não seria assim”.
 
Levamos a vida aparentando ter controle sobre ela. Antes das cotidianas mudanças de rumo que fazemos, nosso “pensar” se ocupa de arranjar, para cada uma, uma justificativa, de tal sorte a que continuemos a “ter controle sobre nossas vidas”.
 
Mas nossa prática nem sempre está de acordo com o nosso pensamento. E quanto mais velhos ficamos; quando nossas práticas vão se rarefazendo e só nos restam nossos pensamentos, aí a tristeza toma conta de nós. Fernando deve passar por um momento assim ao rever uma trajetória política que o trouxe a um palanque inimaginável, mais ainda para um sociólogo de origens africanas e revolucionárias.
 
Assim também é o exercício do governo, ou o exercício da política. Poucos homens públicos nesse país mudaram de rumo de forma tão notável quanto o ex-presidente FHC. Quem lê a história da evolução política de FHC surpreende-se com o fato de existirem poucas justificativas para as mudanças. A não ser que – diferentemente do pensamento corrente que imagina o exercício do poder como um mero e solitário “manda quem pode, obedece quem tem juízo” – coloquemos na balança que governar um país é muito mais um exercício de justificar mudanças do que propriamente de fazer valer nossos pensamentos.
 
Mas a todos, em algum momento, é dado retroceder nos caminhos escolhidos, principalmente os ideológicos ou políticos. Teve tempo de fazê-lo após sair da presidência. Teve tempo de lembrar-se dos “velhos tempos” e começar o caminho final retornando ao ponto por onde iniciou.
Agora, aos 81 anos, está de frente para um fim melancólico: ficar, intimamente exclamando: “a vida passou!”. Se a tristeza se apodera dos jovens quando se frustram consigo mesmos, fico a imaginar o tamanho da tristeza desse homem.
 

A menos que ele jure de pé junto que acredita piamente na sua trajetória. Mas isso já seria muita hipocrisia, pois ninguém em sã consciência faz de si essa imagem.

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Luiz Afonso Alencastre Escosteguy

Apenas o que hoje chamam de um idoso. Parodiando Einstein, só uma coisa é infinita: a hipocrisia. E se você precisou saber meu "currículo" para gostar ou não do que eu escrevo, pense bem, você é sério candidato a ser mais um hipócrita!