Com quantos paus se faz uma canoa professor?

Leio pela terceira vez “Linha d´água”, do navegador brasileiro Amyr Klink, que trata não de suas viagens ao Pólo Sul, mas de homens que constroem, que inovam e que, como ele mesmo afirma, não são os melhores construtores, alguns sequer tinham visto um veleiro antes, mas que com humildade e buscando soluções simples construíram um barco inovador e de tecnologia que nenhum veleiro possui.

Leio pela terceira vez “Linha d´água”, do navegador brasileiro Amyr Klink, que trata não de suas viagens ao Pólo Sul, mas de homens que constroem, que inovam e que, como ele mesmo afirma, não são os melhores construtores, alguns sequer tinham visto um veleiro antes, mas que com humildade e buscando soluções simples construíram um barco inovador e de tecnologia que nenhum veleiro possui.

As principais idéias desenvolvidas como mastros que giram em 360 graus e não necessitam de cabos para que se mantenham fixo, ou a ausência de uma quilha de chumbo “por não pretender levar toneladas de chumbo para viajar de graça” e que ainda permite que o veleiro de 100 toneladas possa encostar em qualquer praia, como qualquer canoa, foram, todas elas, idéias baseadas nas jangadas e canoas baianas e cearenses. Aliás, é desta forma que Amyr Klink gosta de definir seu veleiro-navio: uma grande jangada.

O navegador ressalta durante todo o livro os calafrios que tinha ao consultar engenheiros navais. “Não vai funcionar”, “Isto é impossível”, diziam os arrogantes “sábios” que muitas vezes construíam barcos e quase nunca navegavam. Ignoravam as idéias mais simples.

Peço perdão ao leitor por esta longa, porém necessária, introdução. O projeto do super-barco de Amyr Klink, que lhe permitiu dar a volta ao mundo circunavegando o circulo polar antártico, não ignorou a sabedoria de pessoas simples, ao contrário, aprendeu com elas.

É com uma mistura de indignação, vergonha e desprezo que leio no Terra que um professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Antonio Natalino Manta Dantas – repito: Antonio Natalino Manta Dantas, atribui ao "baixo QI dos baianos" a nota 2 obtida pelo curso no Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade) e no Indicador de Diferença entre os Desempenhos Observado e Esperado (IDD).

Segundo o professor (?), “a tradicional percussão do Olodum é um “barulho" e que um dos símbolos da Bahia, o berimbau, é um instrumento para pessoas pouco inteligentes. "O berimbau é o tipo de instrumento para o indivíduo que tem poucos neurônios. Ele tem uma corda só e não precisa de muitas combinações musicais". Houve ainda declarações que apontam para o racismo.

Me considero um afortunado, por estar longe de pessoas como o tal “professor”, por ter aprendido a ignorar os desgraçados que surgem enquanto trilhamos o nosso caminho. Lamento pelos alunos que o escutaram, lamento por ele ser baiano e lamento ainda por ser ele um professor. Posso apostar que este “sábio” não consegue tocar um berimbau, ou fazer um barulho com os belos tambores do Olodum, muito menos que tenha contribuído para uma sociedade como o Grupo de Teatro Olodum, mas na sociedade em que vive, pode ser médico e dar aulas de medicina. Mas para mim é apenas um imbecil.

Márcio Pimenta é economista e doutorando em Relações Internacionais pela Universidad de Santiago de Chile, escreve ainda no diplomaciabossanova.net

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Márcio Pimenta