no dos outros é colírio

das agruras e delícias da literatura faz parte eu ter certeza que é um privilégio meu, e de mais 180 milhões de tupiniquins ler guimarães rosa, mia couto, rubem fonseca (…) em português. e queneau me fez lembrar disso. mas kouavoar entre guimarães rosa e raymond queneau?

certa feita, num marché aux puces em toulouse, encontrei um guimarães rosa vertido para o francês e me ocorreu uma reflexão recorrente acerca das traduções literárias. quanto perdemos e quanto ganhamos com elas ? 

eh bem, como eu disse a coisa é recorrente. e quando encontrei o’ grande sertão veredas’ em edição francesa, ulahlah. guimarães é emblemático do peso da tarefa. pela oralidade e pela manobra assez engenhosa da língua portuguesa, malgrado referências húngaras etc…- ele deve ter sido enfernizado até a morte pelos revisores. enfim, foi irrestível: pobres franceses nunca conhecerão o vrai guimarães.

mas eles ja haviam preparado uma pra mim.

très heureuse, resolvi ler ‘ zazie dans le métro’, do raymond queneau. .. minha dernière leitura de entretenimento no ano que acaba de acabar. leio duas páginas e penso: merda, à essa altura de frança, vou precisar de dicionário?

entrementes, au bout de quelques page après, mas não! mesmo que não seja evidente… ok, pelo contexto comecei compreendendo que tac era taxi. fácil. depois, decifrando que ptêtt, certamente, era peut-être (talvez), e que vzavez era vous avez (vocês têm). daí, o resto foi barbada, assim adianto-vos, um petit glossário para queneau :

passque – parce que (porque)

kouak ce soit – quoi que ce soit (o que quer que seja)

arvoir – au revoir (tchau)

kouavouar – quoi à voir (o que tem a ver)

kékchose – quelque chose (alguma coisa)

ce xé – ce que c’est (o que é)

jveux ottchose – je veux autre chose (eu quero outra coisa)

asteure – à cette heure (àquela hora)

ltipstu – le type se tue (o tipo se cala)

até que chego nesse trucmachin: vozouazévovos – vous oiseaux [ ?? (seus pássaros)], desconcertante até para os franceses.

pois. é o romance oral. e no fim, recomendo fortemente para falantes brasileiros da língua francesa, puisque ele é escrito conforme se fala, fonemas correspondentes e algumas proporções guardadas. claro, fica patente como no francês se escreve tanto pra dizer bem menos… très joliment, bien sûr.

vale pelo romance também, que é delicioso, leve e engraçado. clima ‘mon oncle’ – filme de jacques tati. hiper francês, a frança comum, loin de la tour eiffel. mas isso é assunto pra outro rendez-vous.

… eu ainda fico com um probleminha insolúvel pour l’instant, adoro os russos…

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larissa bueno ambrosini