De coisas simples

Coisas simples, na matemática, não quer dizer que sejam fáceis. São fáceis por parecerem intuitivas, não necessitando de explicação. Quando explicadas, tornam-se difíceis, porque a expçicação não é intuitiva, é apenas lógica em si mesma. A matemática é um saber acumulado durante muitos séculos, baseada sobre conceitos elementares. É fundamental ter uma noção clara e segura desses conceitos para se conseguir captar o raciocínio dedutivo das teses matemáticas.

Voltemos ao início, aos conceitos elementares que aprendemos na escola. Cada tópico será tratado isoladamente, dentro dos limites da sua definição, sem procurar estendê-lo para correlações mais amplas.

1. Símbolos elementares.
Suponhamos que alguém diga: “Consideremos a variável n …”. Óbvio, é um erro. Os números quando não referidos a algarismos, são designados por letras minúsculas do alfabeto a, b, c, etc, mas n ficou consagrado como sendo o termo geral de um sistema numérico. Ninguém lhe dá outro significado. Suponhamos então que n é o termo geral de um conjunto ordenado de números, por exemplo, dos números reais. Mas, dirão vocês, como podem os números reais formar um conjunto ordenado? São tantos os números que nem podem ser contados, quanto mais formar uma seqüência. É verdade, os números irracionais, (que fazem parte dos números reais), não formam nenhuma seqüência, mas apesar disso, os números reais formam um conjunto ordenado.Aqui, conjunto ordenado quer dizer que qualquer um dos seus elementos, tem uma posição definida no eixo numérico. Não vou mergulhar na explicação, mas darei uma idéia que espero ser suficiente. Quem demonstrou que os números reais formam um conjunto ordenado foi Richard Dedekind, (1831-1916), matemático alemão, que, em 1872, publicou o trabalho Stetigkeit und irrationale Zahlen, (Continuidade e números irracionais). Não se esqueçam que os sistemas numéricos são expansões sucessivas de números. Quer dizer, os números reais englobam todos os números, ou seja, os naturais, os inteiros os racionais, os algébricos, além, é claro, dos números irracionais. Imaginem agora o eixo numérico. Dedekind parte do princípio, que todos os números reais têm pontos correspondentes no eixo numérico e que, qualquer que seja o ponto considerado, ele divide o eixo em duas partes que se completam. Assim, qualquer número, mesmo irracional, tem uma posição definida no eixo numérico, correspondendo a um ponto que realiza o chamado corte de Dedekind, isto é, um ponto que divide todos os restantes números em duas classes, uma menor e outra maior que o número do corte.

Vejamos outros conceitos elementares. Por exemplo, x e y de y=f(x) ou f(x y)=0 que é a mesma coisa, onde x e y são duas variáveis que formam uma equação, sendo x a variável independente e y a variável dependente. Como é que as duas variáveis variam? Não se sabe, pois y=f(x) é uma expressão simbólica, não representando nenhuma relação específica das variáveis. Se a equação for do 1º grau, isto é, linear, ax+by=c, representa uma linha reta no plano ortogonal cartesiano. Se for do 2º grau, a chamada equação quadrática, ax2+bx+c=0, representa uma parábola nesse mesmo plano. Agora, se x ou y ou os dois, fizerem parte de uma relação linear de expressão aritmética, onde representem números inteiros, então, não são variáveis mas apenas incógnitas. Na equação quadrática, os valores a e b são chamados de coeficientes e c de constante. Para resolver uma equação polinomial de grau n por radicais, é necessário descobrir qual é a fórmula que dá as suas raízes, usando apenas as operações de adição, subtração, multiplicação, divisão e extração de raízes. A equação quadrática completa é um exemplo deste caso. Ficou comprovado que não existe esse tipo de fórmula para a equação completa de grau 5. Avançar neste assunto levar-nos-ia à teoria de Galois. Não é para tratar agora.

2. Algoritmos
A definição de algoritmo é muito simples: é uma seqüência finita de regras operacionais, perfeitamente definidas, sem ambigüidades nem contradições, destinada a alcançar um determinado objetivo. Como vêem é bem vaga a definição. Vejamos um exemplo. Suponhamos que alguém tenha decorado tudo o que lhe ensinaram sobre equações algébricas. Qualquer problema padrão que se lhe apresente deste tema, é resolvido rapidamente e sem hesitação. Pois bem, este sujeito funciona à base de algoritmos. Na realidade, ele não entende nada de matemática. Sabe apenas, de memória, as regras operacionais e atua como se fosse um robô. No mundo de hoje, grande parte das nossas atividades são regidas por algoritmos, através de computadores. São as máquinas do nosso tempo, operando os seus programas estruturados em algoritmos e trabalhando a informação numa linguagem lógica convencional. Ao lidar com algoritmos, todos nós aprendemos que a sua linguagem é formal e de absoluta precisão. Não admitem alternativas por menores que sejam. Somos senhores e escravos da nova tecnologia. A maioria dos algoritmos são lineares, montados como verdades absolutas. Ou obedecemos ou somos expulsos. Evidentemente, existem os sistemas complexos, objeto da cibernética, baseados na comparação da evolução real dos sistemas com a evolução desejada ou idealizada dos mesmos. As distorções são corrigidas por retroação (feedback). Não é assunto para agora.

Algoritmo é uma corruptela do nome do matemático persa al-Khowarizmi, (c,780-c.850), cuja obra sobre álgebra foi publicada no ano 825. No entanto, por ter desaparecido o original, só em 1120 é que ficou conhecida no ocidente, traduzida para o latim. O algoritmo mais antigo que se conhece é o agora chamado algoritmo de Euclides. É o procedimento para se obter o máximo divisor comum (MDC) de dois números. MDC é o maior número inteiro que divide exatamente os dois números. A seqüência operacional é a seguinte: divida um número pelo outro e obtenha o resto; pegue no divisor e divida pelo resto, obtendo novo resto; repita a operação tantas vezes quantas as necessárias até se obter o resto 0. O último divisor é o MDC. Experimente com os números 3654 e 1365, por exemplo. Dividindo um pelo outro, temos r=924; agora 1365 dividido por 924, dá r=441; repetindo até 42 dividido por 21, r=0. O MDC é 21. A divisão 3654/1365 pode portanto ser reduzida à expressão mais simples 174/65.

Fiquemos por aqui. Continuarei a explorar este mesmo tema mais algumas vezes, pois me parece promissor. Até à próxima.

Palavras-chave: incógnita, variável, constante, algoritmo

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Henrique Cruz