Ao Sul de Lugar Nenhum By Diogo Brunner / Share 0 Tweet O lugar é frio e árido, um pedaço da américa que parece devastado por alguma guerra. Uma américa a que não estamos acostumados a ver na TV. Principalmente, um Estados Unidos a que nossos olhos não estão acostumados a ver, talvez custem a acreditar que tal coisa se passe nessa nação tão supostamente isenta de miséria. Estamos no estado do Missouri, e o filme é Inverno da Alma (Winter´s bone). Recém lançado, foi uma das grandes surpresas do Oscar 2011 ao ser um dos indicados a melhor filme. Quando essa américa (leia-se EUA) me aparece assim desnudada, lembro sempre dos versos do genial Ginsberg, que se perguntava com uma angústia lancinante, no seu poema homônimo, coisas como: América “quando você tirará sua roupa?”, “quando você merecerá seu 1 milhão de trotskistas?”, “porque suas bibliotecas estão cheias de lágrimas?”. São versos de décadas atrás e soam tão joviais. Com direção de Debra Granik, e orçamento de “míseros” (para os padrões hollywoodianos) 2 milhões de dólares, as imagens narram a saga de uma jovem de 17 anos, que, tendo que cuidar dos irmãos pequenos e da mãe doente, vai atrás do pai que estava preso, e para pagar a fiança penhorou a casa da família e sumiu. Não se deixe levar por essa sinopse besta, quase um clichê, novamente, americano, do american way of life, bonito e redentor. Não existe beleza no filme de Debra. Existe isso sim uma grande garota, uma alma jovem que já sofreu como algo muito velho. Jennifer Lawrence faz com maestria essa menina que luta, e principalmente sangra, literal e metaforicamente. A busca pelo pai nos mostra uma américa perdida no nada, esquecida, onde a violência também não é comum, é demasiada, o mal mora por entre aquelas casas de madeira. Espreita as crianças que brincam solitárias. Não conseguimos enxergar a famosa luz no fim do túnel, claustrofobia, quase morremos junto com o desespero da garota. É uma luta angustiante contra uma vida além de simplesmente prejudicada. Ela ensina os irmãos pequenos a atirar, a cozinhar, ela os prepara de alguma forma temendo que eles nunca escapem dali. Ree (a personagem de Jennifer) não cede apesar de tudo. Ela se põe como um escudo humano contra um mal que é real e ao mesmo tempo invisível. Uma luta honrosa contra uma situação degradante. A América real contra a América vendida pelos meios de comunicação. Momentos de suspense são intercalados com pura angústia, não há nada tecnicamente esplendoroso, apenas uma história que não nos é contada todo dia, e por isso, de certa forma, ela vive. É única. O Oscar no meu entender nunca foi e nunca será parâmetro de filmes bons ou ruins, ou de atores talentosos ou não, por isso não importa se Inverno da Alma terá sucesso naquele encardido tapete vermelho. Prefiro terminar com um verso sintomático de Ginsberg: América, “estará você sendo sinistra ou isso é uma brincadeira?”.