Fundamentos By Henrique Cruz / Share 0 Tweet A corrida de Aquiles e a tartaruga é uma provocação de Zênon aos matemáticos. Questionando a divisibilidade ad infinitum do continuum algébrico, Zênon cria o paradoxo aplicando os mesmos conceitos ao movimento dos corpos rígidos. Para explicar a corrida, apliquei alguns critérios atuais da dinâmica e aproveitei a oportunidade para expor os conceitos de seqüências e de séries, convergentes e divergentes. O paradoxo de Zenon Filósofo grego, discípulo de Parmênides, Zênon de Eléia nasceu entre 490 e 485 a.C.. Segundo Aristóteles, foi quem inventou a dialética, um método que procura descobrir as realidades do mundo, através do confronto de teses opostas. Mas foram os seus paradoxos que o tornaram conhecido, pequenas histórias de conclusão absurda, destinadas a questionar a divisibilidade ad infinitum do espaço e do tempo, preconizada pelos matemáticos. A mais citada é a da corrida entre Aquiles e a tartaruga, o atleta mais veloz da Grécia versus o bicho mais vagaroso do planeta. Porém, antes de contar essa história, quero mostrar em que se baseiam os seus argumentos. Desenhe um círculo com dois diâmetros ortogonais. Unindo por segmentos de reta os pontos de cruzamento, obtem-se um quadrado inscrito. Divida ao meio os ângulos ao centro e trace as bissetrizes até atingirem o círculo. Una os novos pontos aos pontos anteriores, traçando o polígono inscrito de 8 lados. Repita este processo sucessivamente, obtendo os polígonos inscritos de 16 lados, 32 lados, etc. O que acontece? Os lados são cada vez menores, ao passo que os perímetros são cada vez maiores. No entanto, por mais que o perímetro aumente, será sempre menor que a circunferência do círculo. O perímetro nunca alcançará o seu valor, pois terá sempre, pela frente, um ângulo para dividir ao meio, por menor que ele seja. Agora passemos à história da corrida. Devido à desproporção entre os dois corredores, os organizadores resolveram dar à tartaruga a vantagem inicial de partir de um ponto bem à frente do de Aquiles. Dada a partida, Aquiles corre para alcançar a tartaruga no seu ponto de início, mas em chegando lá, a tartaruga já avançou para uma nova posição. Aquiles parte para um novo avanço e assim sucessivamente, ad infinitum. Conclusão! Aquiles jamais alcançará a tartaruga. Na divisibilidade infinita do espaço e do tempo, Aquiles terá sempre pela frente um trecho a percorrer. É claro que a corrida tem explicação lógica, apesar do continuum, permitir a divisibilidade infinita dos seus dois parâmetros, o espaço e o tempo. Para facilitar a explicação, sem prejuízo da lógica, vamos simplificar os dados da corrida. Primeiro, o percurso deve ser predefinido, sendo o mesmo no trecho dos dois corredores. Além disso, ambos correm com velocidades uniformes desde a partida. Para poder interpretar o que acontece, temos de cronometrar a corrida, isto é, medir os avanços em intervalos de tempo, mantendo sempre a mesma unidade de medição. Por último, vamos admitir que as distâncias a percorrer até ao ponto de encontro, sejam de números inteiros de unidades de medição. Dada a partida, a distância entre os dois corredores, diminui segundo uma progressão aritmética, quer dizer, as extensões registradas mostram que a diferença entre duas medições consecutivas é constante. Após o encontro, continuando a corrida do mesmo jeito, a distância passa a aumentar mantendo-se a progressão aritmética. No primeiro trecho, a constante, ou seja, o módulo é negativo, no segundo trecho, positivo. O valor absoluto é o mesmo para os dois trechos. Se a velocidade de Aquiles fosse uniformemente acelerada, teríamos uma progressão geométrica e a constante seria o quociente entre duas medições consecutivas. Como se vê, a corrida não tem nenhum mistério. Vejamos agora com números. Em vez do ponto de encontro, suponhamos o número 2. Consideremos a sua representação no eixo numérico. A soma das parcelas 1+1/2+1/4+1/8+… Forma uma série geométrica convergente de parcelas cada vez menores convergindo para o número 2. É interessante verificar que a chamada série harmônica, isto é, a soma 1+1/2+1/3+1/4+… Também de parcelas cada vez menores, é uma série geométrica divergente. Vejamos algumas definições simples de conceitos. Seqüência é uma sucessão infinita e ordenada de números. Infinita, quer dizer, qualquer termo é sempre seguido de outro termo. Ordenada por existir uma relação, sempre a mesma, entre dois termos consecutivos. Na seqüência, os números não estão conectados entre si. Na série, estão somados ou multiplicados. Se somados, a série é aritmética, se multiplicados, geométrica. Não existe série sem uma seqüência que lhe deu origem. Toda série convergente tem um limite, um número que não é ultrapassado. A seqüência da série convergente termina em zero, no infinito. Convergente porque a partir de um certo ponto, a diferença entre dois termos consecutivos, pode-se tornar tão pequena quanto se queira Caso contrário, é uma série divergente. Uma série convergente pode ser decrescente ou crescente. Decrescente tem um limite superior, crescente um limite inferior. Se a série convergir de uma forma contínua e sistemática, ou seja, monotonicamente, atingirá no infinito uma reta tangente, que é chamada de assíntota à curva representativa da série. Quero aproveitar o fecho para uma questão correlata. O paradoxo de Zênon é um exercício de inferir. Isto é, o de aproveitar uma semelhança apenas aparente, para pressupor uma outra realidade, fazendo para tanto um raciocínio dedutivo baseado somente em hipóteses não comprovadas por fatos. Não se acuse Zênon de desonestidade intelectual. Ao contrário, demonstrou reductio ad absurdum que a analogia é falsa na sua premissa e que é necessário procurar uma nova lógica na dinâmica do movimento. Fico por aqui. Até à próxima.