Cadê a política?

As eleições para presidente já estão definidas, com pouca possibilidade de mudança no quadro de intenção de voto do eleitorado. Dilma Roussef (PT), está vencendo no primeiro turno, liderando em todas as pesquisas de intenção de voto (Datafolha, IBOPE, Vox Populi, Sensus), em quase todos os segmentos do eleitorado exceto os eleitores com renda acima de 10 salarios mínimos, segundo o Datafolha. Dilma também está na frente em todos os estados pesquisados. A afirmação de que Dilma não perde mais a eleição é do presidente do IBOPE, em entrevista à revista ISTOÉ. A declaração de Montenegro mereceu destaque no blog de Idelber Avelar.

A força da candidatura apoiada por Lula é analisada no artigo de José Eustáquio, em nossa seção de demografia: Dilma vai ganhar no primeiro turno? Ali estão boas explicações da motivação do eleitorado.

Em outro artigo recente, nosso colunista analisa o lulismo, a partir de um artigo de André Singer: Lulismo e petismo nas eleições 2010. Este mesmo artigo já tinha sido comentado pelo blog NPTO, um dos principais analistas políticos da internet brasileira.

O que se configura é o seguinte: um estado forte e com recursos, destinando umas migalhas para os mais pobres. Mas eles eram tão pobres que qualquer melhoria mínima está acima de tudo que pode se lembrar qualquer pessoa que não era adulta em 1975. Além disso, desde a crise do pós-milagre, iniciada no mesmo 1975, o Brasil nunca viveu um ciclo de crescimento econômico continuado, como o que se está afigurando agora.

Tudo isso torna o lulismo uma força muito poderosa. Só que, como demonstram as análises citadas, o lulismo esvazia a discussão política. Maior mostra disso é que faltam 22 dias para a eleição, e ainda não existe um programa de governo da candidata Dilma, como se pode ver aqui no site de campanha. Dizer que os políticos do campo lulista são culpados é muito pouco. Pior do que um governismo que não quer apresentar um programa de governo para a análise do eleitor, é o fato de que o candidato que deveria ser de oposição também não tem nenhum. O site de Serra é uma grande amostra: se você olhar agora, não tem nada lá. Dá pra dizer que ele desistiu da eleição. Já tentou se apresentar como Zé, já pôs Lula em seu programa de TV e já tentou anular na justiça a candidatura do governo (que o Idelber associa ao golpismo de Carlos Lacerda contra Getúlio).

A derrocada da candidatura que deveria ser de oposição já é apontada até nas hostes tucanas, como indica a leitura de um intelectual como Marco Antonio Villa.

A única candidatura que apresenta um programa de governo para a discussão pública não consegue ser ouvida: Marina Silva tem lá em seu site o programa, mas conta com apenas um minuto e meio para apresentar suas propostas ao eleitor na televisão (veja porque).

A imprensa não colabora nada: escolheu investir em assuntos periféricos como o visual dos candidatos, ou factóides que possam ser explorados como escândalo. Transformar a eleição em novela, parece que é esta a estratégia.

Enquanto isso, muita coisa precisando ser refletida e discutida – e campanha eleitoral não está servindo para isso.

Para usar as palavras do José Eustáquio em seu comentário sobre o lulismo:

O fato é que o novo governo (2011-2014) deve contar, inicialmente, com as condições estruturais mais propícias dos últimos 30 anos, com apoio popular, economia em crescimento e maioria no Congresso. Porém, será preciso definir com clareza quais são os objetivos a serem atingidos. Especialmente, é preciso preparar o país para enfrentar os desafios da continuidade do crescimento com inclusão social sem abandonar o cuidado ao meio ambiente e as medidas de adaptacão e mitigação do aquecimento global.

Eu acho que é possível definir as coisas nestes termos: está na hora de nós eleitores obrigarmos os políticos a fazerem a discussão conforme a pauta da sociedade, colocando-se a nosso serviço. O que estamos vendo por enquanto é o eleitor sendo colocado a serviço das carreiras dos políticos, convidados que somos a endossar candidaturas que não querem discutir política, os problemas do país e programas de governo.

Acreditamos que tudo irá bem e deixamos as decisões para os líderes iluminados? Ou tomaremos os rumos do nosso destino coletivo, discutiremos nossas mazelas e as possíveis estratégias de solução?

Fica o convite à política, que precisa ser feita antes, durante e depois da eleição.

About the author

André Egg

Músico, historiador e crítico. Professor da UNESPAR. Colaborador do PPGHIS-UFPR. Organizador do livro Música, cultura e sociedade. Página pessoal em http://andreegg.org