Fundamentos By Henrique Cruz / Share 0 Tweet Um dia destes lendo a revista “Pesquisa” da Fapesp, de outubro de 2010, deparei com uma notícia de título “O novo valor do número pi”. Dizia o comunicado: “Tzo–Wo Sze, um cientista da computação da Yahoo nos Estados Unidos, criou um programa de computador e instalou-o em mil máquinas da empresa e depois de 23 dias obteve o dobro de dígitos que se conhecia até agora para o número pi. Definido como o resultado da divisão do comprimento da circunferência por seu diâmetro, pi é um número irracional que começa com 3,14 e segue por infinitos dígitos. O pesquisador chegou a uma notação binária, com dois quatrilhões de dígitos ou bits, o dobro do recorde anterior. Em formação decimal (3,14…) o valor anterior tinha 2,7 trilhões de dígitos. Documentos antigos indicam que a busca por aumentar a precisão do valor de pi começou 1700 anos antes de Cristo”. Classificar de pesquisa a busca de um novo valor para o número pi é uma afirmação sem sentido. Seria como procurar montar um programa de computador para se obter o recorde do maior valor do conjunto dos números naturais. Tanto neste caso como no anterior são conjuntos infinitos de dígitos e a obtenção de valores cada vez maiores nada acrescenta. Por serem conjuntos infinitos, os valores seqüenciais mantêm sempre a mesma posição em relação ao infinito dos conjuntos. Estão sempre infinitamente distantes do máximo valor possível. Ou melhor não existe, em ambos os conjuntos, o maior valor dos seus elementos. Considerar que os novos valores aumentam a precisão do número pi é outro absurdo. Na prática não se exige uma precisão dessa ordem. Dar a pi o valor de 3,1416 é suficiente. O arredondamento para cima do último algarismo não prejudica os resultados das aplicações. Mas a busca de novos valores na notícia da Pesquisa tem antecedentes. Em 1615 em publicação póstuma, Ludolph van Ceuler, (1540-1610), matemático holandês, apresentou o número pi com 36 dígitos. O primeiro cálculo com computador ocorreu em 1955 obtendo 10.000 decimais. Em 1961, 100.000 decimais; 1966, 500.000; 1967, 1.000.000; 1992, 2.180.000. Mas pondo de lado as buscas frenéticas por novos valores, desperdício de tempo e dinheiro, o número pi sempre foi um número intrigante. Não é só um número irracional, é também um número transcendente. Quer dizer, pi não é raiz de nenhuma equação algébrica, o que por si já o torna especial. Resultado de uma simples divisão do comprimento da circunferência do círculo pelo seu diâmetro, apresenta um valor que é um número infinito. Na Grécia da Antiguidade Clássica, cerca de 300 anos a. C., os Pitagóricos já tinham sido surpreendidos com um resultado semelhante. Se na forma geométrica de um quadrado traçarmos um das suas diagonais, o quadrado fica dividido em dois triângulos retângulos iguais. Nada mais simples e perfeito. Pois bem, aplicando o teorema de Pitágoras ao triângulo assim obtido, a relação entre os comprimentos da diagonal e do lado dá, (na notação atual), a raiz quadrada de 2. Euclides provou de forma irrefutável que se tratava de um número infinito 1,414213562 … (no sistema decimal atual). Como era possível que numa mesma figura geométrica, o segmento maior não pudesse ser medido pelo segmento menor um número inteiro de vezes? A famosa frase dos Pitagóricos “Tudo são números” não era verdadeira, visto que o número infinito era algo que eles não sabiam interpretar. Esta impossibilidade também decorre da forma circular. Vejamos como. Um círculo é o lugar geométrico dos pontos do plano equidistantes de um ponto fixo chamado centro. Imaginemos um círculo com o seu diamêtro, horizontal por exemplo. Como dissemos acima o número pi é a relação entre os comprimentos da circunferência e do diâmetro. Agora se ligarmos por segmentos de reta qualquer ponto da circunferência aos extremos do diâmetro, obtemos um triângulo retângulo, com o ângulo reto no vértice do ponto escolhido da circunferência. O teorema de Pitagoras diz que a soma dos quadrados dos catetos é igual ao quadrado da hipotenusa. Catetos são os lados adjacentes ao ângulo reto e hipotenusa é o lado oposto ao ângulo reto, neste caso o referido diâmetro. Se o ponto escolhido da circunferência for o mais afastado do diâmetro, então os catetos são dois lados do mesmo comprimento. Se dermos a esses lados o valor unitário a hipotenusa ou seja o diâmetro é a raiz quadrada de 2, o citado número infinito encontrado pelos Pitagóricos. Assim sendo o diâmetro tanto pode pertencer a um caso como ao outro, mostrando que ambos fazem parte das propriedades da forma circular. Fico por aqui. Até à próxima.