Fundamentos By Henrique Cruz / Share 0 Tweet Hesitei em abordar este tema, receoso que fosse simples demais. Mas à medida que o desenvolvia, fiquei cada vez mais tranqüilo. A regra de três não é apenas uma regra aritmética ou geométrica. Pela teoria da proporcionalidade a regra de três conduz-nos aos fundamentos da álgebra abstrata e daí aos outros ramos da matemática. Reparem nas sutis diferenças de significado dos vários termos da linguagem. O objetivo da minha exposição é tornar os leitores sensíveis à clareza e à precisão dos conceitos, para que possam extrair deles os seus plenos significados. A maioria de vocês, provavelmente, já ouviu falar da regra de três, mas talvez nem todos saibam o que isso significa. Consideremos somente os números inteiros, representados por letras. A regra de três é uma igualdade entre duas frações: “ a está para b assim como c está para d “. Ou seja a : b = c : d ou ainda a/b = c/d. Também se pode dizer que é uma igualdade entre duas relações: “ a relação entre a e b é igual à relação entre c e d ”. Vejamos. A divisão de a por b é uma operação aritmética básica, que mede quantas vezes a contém b. Ela é igual à divisão de c por d, de quantas vezes c contém d. Assim pode-se dizer que a está para b na mesma proporção em que c está para d, visto que as duas relações são iguais. São relações proporcionais. Vejamos como a regra de três pode ter aplicações na vida prática. É o caso da confecção de desenhos em escala, isto é, a reprodução em menores dimensões, das dimensões reais de um espaço plano. A escala 1/100, por exemplo, significa que 1cm no desenho corresponde a 100 cm, isto é 1m, no espaço real. As escalas são usadas na arquitetura, na engenharia e, em maiores dimensões, na cartografia. Outro caso é o das alíquotas, isto é, o percentual com que determinado tributo incide sobre a coisa tributada. Por exemplo, a alíquota de três por cento, isto é, de 3 em 100, proporção que se aplica sobre o valor tributado. Observem que as relações citadas são regras de três, porquanto permanecem válidas para todas as outras relações da mesma espécie. No entanto a regra de três não termina aqui. Continuemos então. Reparem que os termos relação, quociente e fração são sinônimos, expressando o resultado de uma divisão. Assim na divisão, que é a operação aritmética básica inversa da multiplicação, a é o numerador e b o denominador da fração (que não pode ser zero). Quando perfeita, a divisão tem resto zero. Neste caso, pode-se dizer, em vez de numerador e denominador, respectivamente, dividendo e divisor. O dividendo é múltiplo do divisor e o múltiplo é o quociente da divisão. Se na primeira relação a/b passarmos b para o segundo membro da igualdade, ele fica multiplicando a segunda relação c/d. Por sua vez, se passarmos d do segundo para o primeiro membro da igualdade, obtemos a igualdade dos produtos a.d = b.c. Isto é, o produto dos extremos a e d é igual ao produto dos do meio b e c. Por exemplo, 6/2 = 9/3. Temos portanto 6.3 = 2.9, isto é, 18 = 18. Como podem ver, a igualdade é entre o produto dos valores extremos 6 e 3 e o produto dos valores do meio 2 e 9. Mas a regra de três pode ter outro significado que não o aritmético. Estou me referindo ao significado geométrico da proporcionalidade. Lembro do desenho que representa sua aplicação. É simples. Vou descrever passo a passo. Tracem uma linha reta horizontal e marquem nela um segmento de reta, isto é, um ponto inicial 0 e um ponto 1 à sua direita. A distância entre os dois pontos pode ser qualquer. Suponhamos que eu queira dividir o segmento de reta assim obtido em quatro partes iguais. Para isso, tracem uma semi-reta qualquer partindo do mesmo ponto 0 e que faça um ângulo agudo com a reta horizontal. Com um compasso, marquem nessa semi-reta quatro distâncias iguais a partir do 0. Liguem por uma linha reta o último dos quatro marcados, ao ponto 1 do segmento de reta horizontal. Com dois esquadros, tracem retas paralelas a essa reta de ligação, passando pelos três pontos restantes. Com isso, o segmento de reta horizontal fica dividido em quatro partes iguais como desejado. O que divide uma reta divide também da mesma forma a outra reta. Por que podemos afirmar que essa correspondência é verdadeira? Porque o que se construiu foram quatro triângulos semelhantes, quer dizer, têm a mesma forma mas não o mesmo tamanho. Tendo a mesma forma, a relação entre os comprimentos dos dois lados, o inclinado e o horizontal, é uma constante, isto é, é sempre a mesma para todos os triângulos. Sendo assim, se o que foi feito divide o segmento de reta inclinado em quatro partes iguais, também divide o segmento de reta horizontal em quatro partes também iguais. Aqui a regra de três refere-se a quatro triângulos, ou seja, a quatro relações combinadas duas a duas, que correspondem a seis regras de três diferentes. As considerações sobre relações e proporções fizeram com que a regra de três passasse a fazer parte dos conceitos fundamentais da álgebra, não se limitando apenas à aritmética e à geometria. Foi assim que começou o longo caminho da matemática até os dias de hoje. Fico por aqui. Até à próxima.