Marco Aurélio, um César no Supremo


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Marco Aurélio Mendes de Faria Mello, ministro do Supremo Tribunal Federal e presidente do Tribunal Superior Eleitoral, tem nome de imperador romano (Marco Aurélio, 121 – 180). A comparação que cabe em relação ao ministro não é com o também imperador romano César (Júlio César, 100 a.C. – 44 a.C.), mas sim com o folclórico prefeito do Rio de Janeiro, César Maia, notório pela criação de factóides que fazem a alegria dos jornais.

Marco Aurélio Mendes de Faria Mello, ministro do Supremo Tribunal Federal e presidente do Tribunal Superior Eleitoral, tem nome de imperador romano (Marco Aurélio, 121 – 180). A comparação que cabe em relação ao ministro não é com o também imperador romano César (Júlio César, 100 a.C. – 44 a.C.), mas sim com o folclórico prefeito do Rio de Janeiro, César Maia, notório pela criação de factóides que fazem a alegria dos jornais.

Antes, a biografia do homem. Nascido no Rio de Janeiro, Marco Aurélio graduou-se em Direito algo tardiamente aos 27 anos, na Universidade Federal do Rio de Janeiro, em 1973. Em 1982, concluiu mestrado na mesma instituição. Profissionalmente, depois de advogar por breve período, tirou o atraso e realizou rápida carreira no Judiciário: aos 29 anos, tornou-se procurador do Ministério Público do Trabalho. Aos 32, juiz do Tribunal Regional do Trabalho da Primeira Região. Aos 35, ministro do Tribunal Superior do Trabalho. Aos 43 anos, tornou-se ministro do Supremo Tribunal Federal, por indicação de seu primo, o então presidente Fernando Collor de Mello.

Já há quase 18 anos no Supremo, Marco Aurélio é hoje o segundo mais antigo juiz da casa. Seu apelido é “senhor voto vencido”: com freqüência, fica isolado nas decisões do tribunal. Também se notabilizou por votos controversos. Em 2000, concedeu habeas corpus ao banqueiro Salvatore Cacciola, que aproveitou e fugiu para a Itália. Mais recentemente, presidindo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), realizou criativa interpretação constitucional quanto à questão da fidelidade partidária: agindo no vácuo dos congressistas que não fizeram uma reforma política, criou grande confusão entre os poderes, uma vez que o Judiciário sem qualquer justificativa assumiu papel de legislador e mudou regras eleitorais.

Sem dúvida, é o ministro do STF mais acessível aos jornalistas. Procurado com freqüência pela imprensa, não tem papas na língua para falar sobre os mais variados assuntos, de política a futebol. Assim como muitos políticos, parece nutrir gosto pelos holofotes: rara a semana em que seu nome não é mencionado por jornais, revistas e televisões.

Esse gosto por luzes, aliado a uma explícita antipatia pelo governo Lula, tem levado Marco Aurélio a atitudes em total desacordo com sua posição de magistrado, tanto mais em se tratando de um juiz da mais alta corte do país. Tal qual um Virgílio (não o poeta romano, mas sim o nefasto senador amazonense Arthur), postou-se a criticar acidamente o presidente Lula pelo lançamento do programa Territórios da Cidadania em ano eleitoral. A reação do presidente não tardou: Lula disse que o Judiciário não deveria meter o nariz nas coisas do Executivo.

Interessante notar, porém, é que a quase totalidade da imprensa ficou do lado de Marco Aurélio, condenando a resposta de Lula. Paixões políticas à parte, cabe observar que, à luz da lei, Lula está certo. A Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman) proíbe os magistrados de se manifestarem sobre processos que tramitam na Justiça; no caso, o programa Territórios da Cidadania é objeto de Ação Direta de Inconstitucionalidade ajuizada por DEM e PSDB junto ao próprio STF do qual Marco Aurélio faz parte.

Desta forma, ao se envolver com política e tornar públicas suas opiniões pessoais sobre atos do Executivo, Marco Aurélio assume uma postura não apenas imprudente e insensata, mas francamente atentatória ao ordenamento legal. Confiram o texto da Loman:

“Art. 36. É vedado ao magistrado:
(…)
III – manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistrado.”

Daí o ditado, popular entre operadores de Direito: “Juiz só fala nos autos.”

A incontinência verbal de Marco Aurélio em suas manifestações públicas relativas a atos do Executivo vão contra o bom senso e a imparcialidade que se espera de todo juiz. Suas falas “em tese” rendem boas manchetes à Folha de São Paulo – “Projeto pode ser contestado, diz Marco Aurélio” – e bons indicativos à oposição de como proceder contra o Governo junto à Justiça. Como bem comparou o jornalista Paulo Henrique Amorim, é como se um juiz de futebol falasse para um jogador: “pode cair na área que eu apito o pênalti”.

Ante o acontecido, não causa surpresa a atitude do PT, que protocolou reclamação contra Marco Aurélio no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), baseada nos comentários do ministro quanto ao possível caráter eleitoreiro de programas do governo federal. “Essa atitude está em total descompasso com os novos ares constitucionais. Ela fica muito bem em um regime de exceção, não em um regime democrático”, reagiu Marco Aurélio. Mau jogador, ainda tachou o PT de “autoritário” e arrematou: “Paira no ar um viés autoritário, muito embora não tenhamos mais campo no Brasil para retrocessos em termos do estado democrático de direito.” E mais: para ele, houve “uma tentativa inglória de intimidar uma autoridade constituída: o presidente do Tribunal Superior Eleitoral.”

Ora, ora. Com essas mais recentes e atrapalhadas declarações, Marco Aurélio parece esquecer que o direito à ação encontra guarida no art. 5o, XXXV, da Constituição Federal: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.” Trata-se do princípio do amplo acesso ao Judiciário, basilar em nossa Magna Carta. A despeito do choro e esperneio do ministro, todo e qualquer ofendido tem o direito de bater às portas da Justiça. Ninguém está acima da lei, nem mesmo ministros do Supremo.

Por fim, voltemos aos Césares. Na definição do jornalista e ex-deputado Márcio Moreira Alves, "devemos ao prefeito Cesar Maia a palavra factóide. Significa algo que parece ser um fato político, mas na realidade é apenas um truque para uso dos marqueteiros.”

Pirotecnista, tal e qual o César errado, Marco Aurélio, entre uma confusão e outra, está sempre presente na imprensa. Por certo, será mais lembrado em sua futura biografia pelas decisões questionáveis e pelas declarações inoportunas, do que por um eventual cabedal jurídico. Será lembrado também como o ministro do STF que mais conseguiu espaço na imprensa, ainda que isto em nada contribua para a prestação de atividade jurisdicional que se espera de um juiz de nossa mais alta corte.

P.S. Notem: nossa imprensa, assim como o ministro, sempre esperneia ante qualquer ameaça de ser questionada ante os tribunais. Boa parte de nossa mídia se julga acima do bem e do mal, acima das leis, esgrimindo a liberdade de imprensa ante qualquer processo judicial aberto por conta de barbaridades perpretadas contra pessoas dos mais variados substratos sociais. Por certo, esse assunto daria um excelente artigo.

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Ricardo Montero