Jornalismo… uma análise, uma crítica, um desabafo

de_olho_na_midia

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de_olho_na_midiaNão há forma melhor de começar uma coluna sobre jornalismo do que criticando a maneira como ele é feito hoje em dia. Declarações oficiais, press-releases, dossiês e fitas enviadas por fontes anônimas encontram jornalistas acomodados e pressionados pelo relógio, mais do que gratos por não terem que sair de suas aconchegantes redações com ar-condicionado para apurar.

de_olho_na_midiaNão há forma melhor de começar uma coluna sobre jornalismo do que criticando a maneira como ele é feito hoje em dia. Declarações oficiais, press-releases, dossiês e fitas enviadas por fontes anônimas encontram jornalistas acomodados e pressionados pelo relógio, mais do que gratos por não terem que sair de suas aconchegantes redações com ar-condicionado para apurar. E para que, realmente, correr atrás de muitas informações se o leitor, na visão dos editores, é um ignorante, preguiçoso, que não conseguirá colocar em perspectiva aquilo que lhe está sendo apresentado? Pois é nessa combinação de “eu finjo que estou informando e você finge que está sendo informado” que caminha o nosso jornalismo.

Para estrear aqui nesta seção d´O Pensador Selvagem, não teria como fugir de um dos temas que hoje em dia mais me motivam a escrever sobre jornalismo no meu blog, o Na Média, ao mesmo tempo em que me mantém longe das redações. Falo aqui de como os jornais vêm tratando os seus leitores, de como, a cada dia, somos obrigados a engolir histórias mal apuradas, sem graça e que subestimam a nossa capacidade de pensar.

Quando fiz minha monografia sobre jornalismo investigativo, fiquei impressionado com a quantidade de profissionais que rejeitavam o termo, alegando que a “investigação é inerente ao jornalismo”. Teoricamente, acho que até seria. Porém, o que vemos na prática hoje em dia é um jornalismo cada vez mais acostumado a press-releases, declarações oficiais, dossiês e fitas enviadas por fontes anônimas, além de muita apuração por telefone, e-mail, internet, sem que o jornalista deixe o conforto de suas modernas redações com ar-condicionado. Isso, para mim, é jornalismo passivo.

Não seria nem o pior dos cenários se as informações fossem checadas, mas pelo visto não é isso que acontece. É clássico o caso do Estadão, que publicou uma matéria em sua versão on-line sobre um usuário de iPhone que fez uma cirurgia plástica para encolher o dedo indicador e usar melhor o celular da Apple. Neste caso, pelo menos, não há reputações em jogo, a não ser a dos jornalistas trapalhões. Mas a imprensa tem trabalhado cada vez menos no preceito de que todos são considerados inocentes até provado o contrário. Ao publicar partes não concluídas de uma investigação da Polícia Federal, ou dossiês incriminatórios enviados por uma fonte que com certeza tem algum interesse por trás, e sem fazer o dever de casa ela mesma, com suas próprias investigações, a imprensa acaba sendo apenas uma peça de xadrez a ser usada neste jogo.

É claro que estou falando aí das vezes em que os veículos de comunicação não têm os seus próprios interesses. Vamos deixar essa parte para um outro dia, porque se formos falar sobre isso agora, vocês não saem daqui hoje.

Voltando ao assunto, houve uma época em que os jornalistas passavam mais tempo na rua, e voltavam para a redação para escrever suas matérias. Além disso, os textos eram mais livres, sem as inúmeras amarras impostas pelos manuais de redação. Mas um dia chegou um cara que não era jornalista, mas tinha uma visão de como tudo deveria funcionar, e assumiu um grande jornal paulista, onde implantou seu projeto. Quando Otávio Frias Filho assumiu a Folha de São Paulo no início dos anos 80, o jornal vendia, em média, 120 mil exemplares diariamente. O manual de redação era mais ou menos como algumas leis brasileiras: existia, mas ninguém respeitava. Frias então promoveu uma demissão em massa de repórteres e editores, que o jornalista Arbex Júnior, da revista Caros Amigos, chamou de “saneamento ideológico”, pois tinha como alvo os jornalistas politizados, geralmente de esquerda, que se opunham ao entendimento da notícia como uma mercadoria. De 1984 a 1987, 474 profissionais deixaram a redação, uma média de um a cada 2,1 dias. Os jornalistas experientes eram substituídos por outros, mais novos, ou por profissionais de outras áreas. Na visão de Frias, não era necessário que uma pessoa fosse jornalista para escrever para a Folha “bastava conhecer o manual de redação”.

O jornalista investigativo Antônio Carlos Fon é um dos maiores críticos do tal Projeto Folha. Para ele “O jornalista foi transformado, com este projeto, em um anotador de dados, que posteriormente ele transforma em notícias insípidas, sem contextualização, que servem muito mais para desinformar o leitor ao invés de informá-lo”. Mas o fato é que o projeto deu certo, o jornal passou a vender 300 mil exemplares em 1987 e Frias se sentiu seguro para, em seguida, implantar sua segunda fase, em que transformaria o jornal em uma “TV impressa”, abusando das cores, fotos e infográficos e diminuindo os textos. Afinal, quem é que tem tempo ou saco para ler?

Com essa segunda fase, o jornal passou para os 400 mil exemplares vendidos e consolidou a sua liderança nas vendas. Não é de se estranhar que logo depois todos os grandes jornais já estavam seguindo a fórmula de sucesso de Frias, com a sua cultura de anotadores de dados, onde as notícias atendiam pelo singelo nome de “unidades informativas” e eram tratadas como produto de produção em massa.

O Leitor Foi com Frias também que começou a mania das pesquisas e a gestação de um personagem conhecido como O Leitor – assim mesmo, com letra maiúscula. Para conhecer melhor esse Leitor, você tem que ler o blog “O Leitor, esse idiota”, pois é de lá que vem algumas das idéias que eu vou escrever aqui. A letra maiúscula se deve ao fato de que esse leitor não é uma figura qualquer, ele é um personagem criado nas redações e que, hoje em dia, dita as regras de como deve ser o texto jornalístico. Segundo os jornais, O Leitor é idiota, desinteressado, não entende a voz passiva, odeia gerúndios, textos longos, gosta de cor, figuras, infográficos, violência e não quer saber de nada que fuja do que ele está acostumado. Se você sair da pirâmide invertida então, é capaz de Ele ir até a redação e te assassinar com as próprias mãos.

É por isso que quando comparamos os jornais nas bancas, eles são todos iguais. É por isso que quando alguém cita a internet na televisão, faz questão de colocar depois a explicação “rede mundial de computadores” (este o maior atestado de que O Leitor é um completo imbecil) e é por isso também que somos privados de textos vibrantes, de assuntos interessantes e de muitas informações que os editores acreditam que O Leitor não será capaz de colocar em perspectiva.

Calvin Strip

O jornalista americano Walter Cronkite cunhou um termo que expressa bem o que temos na mídia hoje: infotainment, uma mistura de informação com entretenimento. E os jornais impressos, que antes ditavam o que era notícia, agora seguem a fórmula da televisão, dando mais importância às imagens e nivelando por baixo o seu público.

Bom, não podemos, claro, jogar toda a culpa deste cenário atual apenas nas empresas de comunicação. Realmente há muitas explicações para a diminuição do interesse do público por notícias, digamos, mais sérias (profusão de canais na TV por assinatura, vídeo games, msn, orkut e esse monte de outras coisas que dividem a nossa atenção). Mas realmente o fato é que muitos preferem ser entretidos a informados e os jornais são empresas, movidas a lucros, e respondem à atual demanda de seus clientes ao invés de a um senso idealizado do que eles deveriam querer.

Lendo JornalNeste caso acho que não faz diferença de quem é a culpa, pois a questão é que, como bem descreve o advogado americano Scott Gant em seu livro We´re All Journalists Now (Free Press, NY, 2007. 240 págs) “nós estamos presos em um ciclo em que a ambição das empresas jornalísticas e o apetite dos consumidores de notícia estão coletivamente diminuindo a qualidade das reportagens na maioria das organizações de mídia”.

Ricardo Noblat, colunista do Globo e que mantém o Blog do Noblat, acredita que a receita para alterar este quadro não é tão difícil, mas que os jornais têm medo de mudar. Para ele, os jornais deveriam renovar a pauta de assuntos para ganhar mais leitores, principalmente entre as mulheres e jovens; surpreender mais os leitores com informações que eles desconheçam; dar mais tempo aos repórteres para que apurem e escrevam bem, investir na qualificação de profissionais; depender menos de anúncios e mais da venda de jornais, apostar mais em reportagens, pois são elas que diferenciam um jornal do outro; e, o mais importante, fazer jornalismo com independência e que tome partido da sociedade.

Para mim, se o jornalista sair do conforto da redação, apurar mais, depender menos das fontes oficiais e começar a tratar o leitor como gente, já seria uma grande melhora.

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Pedro Serra