Um western como poucos


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No Country for Old MenAntes mesmo de concorrer ao Oscar, Onde os fracos não têm vez (No Country for Old Men), dos irmãos Joel & Ethan Coen, já pode ser considerado um dos melhores westerns de todos os tempos

O último filme dirigido pelos irmãos Joel e Ethan Coen, Onde os fracos não tem vez (No Country for Old Men), já se afigura nem tanto como um candidato ao idiossincrático Oscar mas como um dos melhores westerns de todos os tempos. Moderno, entendam-me, ao melhor estilo de Clint Eastwood e também a compartilhar, de resto, referenciais com grandes road movies e uma seleta coleção de obras que, por vezes resultantes de um olhar estrangeiro como em Zabriskie Point ou Paris, Texas, inventaram a estética cinematográfica do deserto.

Rato de cinema até meados dos anos 80, afastei-me pouco a pouco da sétima arte para mergulhar em quase total abstinência ao longo da última década até que, neste verão, fatos novos impeliram-me de volta as salas de projeção. De tudo o que assisti de competente e comovente a partir de meu grato retorno, nada – salvo, talvez, o igualmente genial mas já devidamente incensado A Vida dos Outros – impactou-me tanto como esta obra-prima dos irmãos Coen, cuja filmografia ou mesmo existência eu até então ignorara, mas que já assumiram seu lugar de honra em minha galeria afetiva de cineastas instigantes.

Antes que você, caro(a) leitor(a), pense em me taxar como exagerado, antecipo-me em esclarecer que há muito sou assim reconhecido pelos mais próximos: meu amigos, os melhores; meus amores, os maiores; e assim em relação a todos os tesouros colecionados ao longo de uma existência dedicada à busca da qualidade incondicional, sem que, com isto, meus superlativos denotem qualquer discrepância entre o real valor e meu apreço pelos objetos em questão.

Voltando aonde estava, grudei-me na poltrona com a respiração represada enquanto assistia a estupenda seqüência inicial de amanhecer no deserto, na qual as cores e a profundidade do exuberante cenário revelam-se gradativamente a cada quadro sem que qualquer grão de areia se mova a denunciar estarmos diante de um filme e não das paisagens magistralmente capturadas pelas lentes de Ansel Adams (1902-1984) – o que deve render ao diretor de fotografia Roger Deakin, salvo enorme injustiça, a cobiçada estatueta na famigerada cerimônia que se aproxima.

A força e plasticidade destas imagens estáticas dão o tom ao restante do filme, cujos personagens parecem mover-se sobre tiras de cartoon. Sem desmerecer o excelente movimento de câmera de algumas poucas cenas, a estética que se estabelece como predominante é, pois, a da imobilidade, com ampla vantagem para a atuação e o desenrolar da narrativa. Que prazer desfrutar de Tommy Lee Jones sem que esteja a andar ou correr a frente de perdigueiros (caninos e bípedes) e helicópteros, em caçadas humanas interestaduais. Ao invés, filosofa sobre a miséria da condição humana e ainda nos brinda, de quebra, simplesmente com o olhar, sem mover sequer uma linha de expressão facial, com momentos de pura comédia ao tergiversar ironicamente com seu simplório ajudante. É como se os irmãos Coen houvessem descoberto um grande ator até então desconhecido.

Um não: dois – se for levado em conta o frio, cruel e requintado psicopata composto por Javier Bardem que joga, literalmente, com a sorte de suas vítimas em uma série de encontros memoráveis cujos diálogos constituem um dos pontos altos do filme. É, com efeito, à substituição da ação pelas falas ao longo de grande parte da narrativa que o filme deve muito de sua impressionante densidade. Nele, cenas de crime são retratadas como naturezas mortas às quais alguém sempre acaba chegando tarde, ou então mostradas com total economia de movimentos, quando muito um apertar de gatilho em meio a uma gentil conversação.

Também não poderia deixar de destacar a contribuição para esta estética da estática (me perdoem a inevitável cacofonia) da discretíssima trilha sonora de Carter Burwell – da qual, aliás, só me dei conta durante os créditos finais, posto que, até então, o filme todo se me afigurara como absolutamente silencioso. Prestarei, portanto, mais atenção à música de outra feita – já que estamos, sem sombra de dúvida, diante de um clássico para ser revisto repetidamente ao longo dos anos.

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Augusto Maurer