Liames


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Caso 1: Assédio de um motorista de aplicativo a uma adolescente de 17 anos;

Caso 2: Senador da República investe, com um trator, contra policiais amotinados;

Caso 3: Policiais amotinados, armados e cobertos com máscara, dizendo-se em greve, atentam a vida de um senador da República;

Caso 4: Presidente da República faz, repetidamente, “banana” para a imprensa;

Caso 5: Presidente da República usa de expressão com nítida conotação sexual contra jornalista mulher.

O que há de comum nesses casos e em milhares de outros casos que poderia enumerar aqui?

Dois dos mais importantes liames foram rompidos.

Vamos, antes, ao dicionário ver qual o significado das palavras “psicopatia” e “sociopatia”. E que me perdoem os especialistas pelo uso de definições googleanas.

Psicopatia é um ” distúrbio mental grave em que o enfermo apresenta comportamentos antissociais e amorais sem demonstração de arrependimento ou remorso, incapacidade para amar e se relacionar com outras pessoas com laços afetivos profundos, egocentrismo extremo e incapacidade de aprender com a experiência”.

Quase na mesma linha, sociopatia é uma ” doença mental em que o paciente apresenta comportamento antissocial”.

Os quatro protagonistas dos casos acima, motorista, senador, policiais e presidente da República demonstram, de forma inequívoca, que são psicopatas e sociopatas.

O primeiro liame rompido é subjetivo e tem a ver com a inexistência, em cada um dos protagonistas, da capacidade de ver no outro alguém igual e, portanto, merecedor de repeito pela sua dignidade. Não foram instrumentalizados, pelos pais, a perceberem que o mundo não é feito somente de pessoas “inferiores” ou de mulheres a estarem sempre à disposição das suas vontades.

O caso do motorista de aplicativo é, além de paradigmático, gravíssimo, pois repete comportamento usual e histórico na nossa sociedade: o desrespeito puro e simplesmente baseado no fato de que o outro é uma mulher.

Não importa a roupa, ela é apenas a muleta que os psicopatas usam para se defenderem e para conseguirem – muitas vezes com sucesso – levar a culpa para a vítima.

Em um país onde grassa o feminicídio, casos de assédio sequer são levados a sério, a ver o fato de que não há crime tipificado para o que o motorista praticou. Foi denunciado por “perturbação da tranquilidade”, uma contravenção.

Só que ele foi mais além do que uma simples perturbação. Mesmo diante da negativa da menina e do aviso de que era “menor de idade”, ultrapassou todos os limites sociais e moralmente aceitáveis.

E por quê? Porque tinha certeza de que nada aconteceria, de que não passaria de uma “cantada” e, como todas as cantadas, se colar, colou; se não, uma a menos na listinha dele…

O que leva um senador da República a subir em um trator e investir contra outros seres humanos, não importando a situação em que se encontravam?

O que o faz pensar que está autorizado, como ente público que é, a romper o que de mais sagrado há: ele é um senador da República e, portanto, dele se espera um comportamento social e moralmente aceitável. E o comportamento dele foi algo absolutamente inclassificável. Não há taxonomia que categorize esse tipo de comportamento, seja para qual pessoal for, a não ser psicopatia.

Tão grave quanto é o comportamento dos policiais amotinados. Sim, a expressão correta é amotinados, pois a eles a Constituição proíbe a greve e a sindicalização.

E desde quando é um comportamento aceitável cobrir o rosto para fazer “greve”? E desde quando é aceitável que pessoas legalmente autorizadas ao uso de armas, as portem em situação “de greve”?

Esse caso do Ceará mostra o quão perto do fundo do poço estamos.

E o que dizer de uma autoridade da qual se espera ser a representação da sociedade e dos padrões morais estabelecidos ou em evolução?

Quando um presidente da República extrapola todos os possíveis liames que o prendem ao cargo máximo do país, o que esperar do resto? O que esperar dos ministros que ele escolhe?

O que esperar de um ministro que chama servidores públicos de “parasitas” ou reclama que empregadas domésticas estão indo para a Disney? Sequer é preciso falar dos outros…

Vergonha, vergonha, mil vezes vergonha de ter um presidente da República que sequer sabe o que é ser presidente da República.

Quando foi que perdemos a capacidade de identificar psicopatas? Quando perdemos o segundo liame…

E eis o segundo liame rompido: o liame que faz de nós seres sociais. O vínculo que nos une aos demais seres que habitam esse país chamado Brasil. O que nos faz ter o chamado comportamento socialmente aceitável, ou o comportamento moralmente aceitável.

E em todos os casos, perdemos esse liame. Perdemos a capacidade de nos perceber como sociedade e de repudiar – COM TODAS AS FORÇAS – esses comportamentos.

Logo mais – e não muito mais tempo – tudo será devidamente esquecido, pois novos “casos” ocuparão as conversas do dia.

E voltaremos a nossa cotidiana pasmaceira diante do rompimento de todos os liames que fazem de nós uma sociedade. Estamos a um passo do fundo do poço, quando autoridades eleitas ou constituídas rompem com o que de mais sagrado temos; quando pessoas comuns insistem em não seguir mínimas regras sociais.

Não há que exigir do motorista outro comportamento. Afinal, ele tem bons exemplos para seguir…

About the author

Luiz Afonso Alencastre Escosteguy

Apenas o que hoje chamam de um idoso. Parodiando Einstein, só uma coisa é infinita: a hipocrisia. E se você precisou saber meu "currículo" para gostar ou não do que eu escrevo, pense bem, você é sério candidato a ser mais um hipócrita!