Políticos demais, ou Para uma verdadeira reforma política


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Duas ideias simples, aparentemente naive, para um melhor porvir

O passar dos anos ensinou-me a me resignar de opinar publicamente sobre política. Chamo a isto – que outros talvez considerem alienação – maturidade. Só que, às vezes, regrido. Como agora, neste momento privilegiado de descrédito generalizado em nossas instituições legislativas e governamentais. Neste quadro, não resisto a deitar por (quiçá !) breves linhas um par de idéias que vira e mexe me acometem, invariavelmente em momentos de crise institucional na vida nacional. Ambas dizem respeito a drásticos e radicais enxugamentos da máquina pública, sendo, portanto, meramente utópicas, posto que dificilmente políticos estariam dispostos a abraçá-las e promover as necessárias mudanças constitucionais. Mesmo assim, vejamos. Em poucas palavras, entendo que

 

casas legislativas legislariam tão melhor quanto menor fosse o número de seus assentos representativos, e que

 

governantes governariam melhor (ou não tão mal) se – vedados de poder delegar a subordinados de sua confiança direta, como secretários e ministros, a responsabilidade poder para que estes escolham, por sua vez, os subordinados de sua própria confiança – tivessem que ocupar cada cargo administrativo com gestores escolhidos pela sociedade organizada dentre os quadros técnicos mais qualificados.

A tese do enxugamento radical do poder legislativo ampara-se – além de no fato notório de que a atual profusão de representantes implica muito mais em desperdício de receitas (haja visto o custo unitário de cada legislador se computados todos os custos pessoais e materiais de cada gabinete, além de outras benesses) do que, propriamente, na representação democrática de justos interesses nacionais – também noutro fator, bem menos reconhecido, que tem a ver com a visibilidade do político depois de eleito.

 

A rigor, um político só precisa ser visto antes da eleição. Uma vez ungido pelas urnas e não tendo, é claro, um fraco pelos holofotes (algo não tão raro quanto parece), tem imediatamente a seu dispor o manto do esquecimento, posto que lhe é perfeitamente possível, face a impossibilidade de que o noticiário legislativo dê conta de cada movimento de quadros representativos gigantescos, tão maiores quanto for seu âmbito de representação (i.e., municipal < estadual < federal), urdir em benefício próprio ou dos seus seguramente longe das câmeras. Tem-se, pois, que se cada casa legislativa pudesse, numa situação limite, confinar-se às dimensões da casa do Big Brother e desfrutar da mesma visibilidade, não teríamos a maioria dos políticos que temos hoje – e aqueles que tivéssemos andariam certamente na linha.

 

Já a tese da extinção dos cargos de confiança fundamenta-se no fato de que a confiança é, em princípio, intransferível. Noutras palavras, nada garante que um governante possa ou deva confiar, por procuração, naqueles da confiança dos de sua própria confiança. Desta forma, numa cadeia piramidal de delegação de poder por confiança, a confiança que o governante máximo pode depositar em ocupantes de cada cargo enfraquece a cada vez que confiança é delegada descendentemente – o efeito deste enfraquecimento crescendo também, neste caso, exponencialmente em extensão ao longo de cada patamar da pirâmide administrativa. Neste contexto, qualquer governante que declarar confiança na máquina administrativa sob seu comando estará incorrendo em flagrante hipocrisia oportunista ou, no mínimo, sendo tremendamente ingênuo. Tal é hoje, senão a lógica da política partidária, ao menos sua praxe.

 

Como alternativa a este modelo político vicioso, vislumbramos um outro, virtuoso, no qual a gestão do que é público caberia não mais a prepostos da confiança de políticos, mas escolhidos pela sociedade organizada dentre – mediante consenso entre as representações legítimas, respectivamente, dos agentes responsáveis (através, por exemplo, de seus conselhos e ordens de ofício) e das comunidades afetadas por cada segmento de presença estatal – dentre os mais qualificados membros dos quadros públicos. Ora, sob tais circunstâncias, a delegação de confiança deixaria de divergir descendentente de uma minoria para convergir ascendentemente a partir do consenso das maiorias. Por que devemos, então, nos resignar a deixar os rumos, por exemplo, da saúde e da educação públicas em mãos de oficiais entronados em decorrência de seus vínculos políticos ao invés de entregá-los às comunidades, seus médicos e professores ?

 

Complexo ? Certamente. Inviável ? Duvido. As universidades estão aí para demontrar a competência de grupos humanos organizados para se autogerirem. Acredito, pois, que a sociedade, uma vez passados complexos e necessários momentos de mudança de paradigma cultural e ajuste institucional, em muito se beneficiaria da entrega de sua gestão àqueles da sua confiança do que aos da dos governantes que elege.

 

Certa vez enviei um texto muito maior do que este em favor da extinção dos cargos de confiança à convenção estadual de um partido de esquerda com o qual simpatizava. É claro que não obtive como resposta mais do que o absoluto silêncio. Se hoje solto na web algo mais curto (viva !) do mesmo teor, é por confiar na ampla e profunda vocação dialógica da rede – esperando, com isto, polemizar e contribuir em direção a uma melhor sociedade por vir.

 

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Update 19/6/09: sobre a mesma temática, nosso mentor Rafael Reinehr publicou em 2007 os ensaios http://reinehr.org/sociedade/saude-da-sociedade/propostas-para-um-brasil-melhor e http://reinehr.org/sociedade/saude-da-sociedade/acao-popular-democracia-e-mudanca, bem mais detalhados que o presente e cuja leitura recomendamos enfaticamente.

Update 21/7/09: torno a esmiuçar o assunto em Políticos demais II, ou Pela desprofissionalização da vida pública e Políticos demais (iii), ou Pelo fim da propaganda eleitoral.

 

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Augusto Maurer