Um Fígado para Roberto Bolaño (II)


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E então, após sua morte, os livros de Bolaño começaram a vender cada vez mais. Há vários blogs literários de língua espanhola que dedicam parte ou sua totalidade a homenagear e discutir sua obra, Os Detetives Selvagens e Estrella Distante são os preferidos dos cyber-leitores. Muitos deles traçam linhas de continuidade e conexões entre Os Detetives e O Jogo da Amarelinha ou Adán Buenosayres de Leopoldo Marechal.

Os fóruns falam não apenas das qualidades literárias de Bolaño, mas de suas obsessões como a eterna busca de personagens perdidas, amores e cidades.

Santificado hoje e diabólico ontem, Bolaño se comprazia em fustigar seus inimigos literários. Ele os depreciava de frente, não obedecendo aos habituais salamaleques. Sobre Isabel Allende disparou: “Digo calmamente que Allende é má escritora. Para qualificá-la como escritora, uso de certa indulgência, pois nem isso ela é”. Isabel respondeu: “Dei uma olhada a dois de seus livros e eles me entediaram profundamente”. Até aí, tudo normal. A novidade é que, quando Bolaño morreu, a decadente Allende seguiu firme: “Não o lamento. É uma pessoa que nunca disse nada de bom a respeito de alguém. O fato de estar morto não o faz melhor. Era um senhor bem desagradável”.

“Skármeta é um personagem televisivo. Sou incapaz de ler qualquer um de seus livros. Sua prosa me vira o estômago”, torpedeou Bolaño. O colombiano Fernando Vallejo respondeu pelo colega afirmando que a prosa de Bolaño é demasiadamente simples, plana, elementar, do tipo “Eu, Tarzan; tu, Jane”.

Bolaño teve problemas também com Diamela Eltit. Eu os acho cômicos… Ela o convidou para um jantar em sua casa. OK. Só que depois, ele publicou uma impiedosa crítica a um livro de sua anfitriã aproveitando para fazer referências à péssima gastronomia consumida na casa da autora. “Este é um tema sobre que prefiro não tocar. O que se passou foi algo absurdo e hipertrofiado. Bolaño morreu e eu prefiro não dizer nada a respeito”.

Javier Cercas, autor de Soldados de Salamina, romance onde Bolaño é personagem, sustenta que há dois tipos de lendas em torno de Bolaño. Uma que foi construída pelos leitores e fãs e outra criada pelo próprio autor, voluntária e involuntariamente. Diz Cercas que ambas não se ajustam à realidade, mas que a de Bolaño é, em certo sentido, “mais real que a realidade” e que a outra é uma quase mentira ou uma mentira com elementos de verdade. O escritor espanhol enumera fatos em favor de uma construção mítica em torno de seu amigo: morreu jovem; morreu no melhor momento de sua carreira; morreu dentro da propensão que os meios literários possuem de falar bem dos mortos (com fartas cotas de hipocrisia – exceto Allende, claro). “A história da literatura está cheia de exemplos de canonização após uma morte prematura. Mas o que é assombroso é que o mesmo homem que escreveu A Pista de Gelo escreveria 3 anos depois Estrella Distante e seis anos depois Os Detetives Selvagens. É estupefaciente que, entre 1996 e 2003, ano de sua morte, ele tenha evoluído e escrito tanto!”.

Eu me pergunto se Bolaño sobreviverá a isto. Hoje, a única pergunta que cabe é se Bolaño é genial ou extraordinário. A última entrevista concedida por Bolaño foi para Mônica Maristain, da Playboy mexicana; ela perguntou: “O que você diz daqueles que pensam que Os Detetives Selvagens é o melhor romance mexicano?”. Ele respondeu: “Dizem isto de pena. Me vêem decaído e desmaiando em praça pública e não lhes ocorre nada melhor do que uma mentira piedosa, que é o mais indicado nesses casos. Não é pecado fazer isso”.

Graças a boa relação existente entre o editor Jorge Herralde (Anagrama) e a família de Bolaño, chegaram às livrarias em 2007 textos que formaram mais dois livros: El Secreto Del Mal e La Universidad Desconocida. Também chegaram dois livros de poemas: Los Perros Românticos e Três. Jorge Herralde foi amigo, editor e promotor da obra de Bolaño. E hoje é mais: é quem garante a subsistência de sua mulher e filhas, cuidando para que os direitos autorais cheguem a elas. Cumpre o que prometeu ao escritor antes de sua morte.

(continua com comentários sobre as obras de Roberto Bolaño)

Fontes consultadas: Livros de Bolaño, Caderno de Cultura do Clarín de 22/09/2007 e blogs argentinos.

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Milton Ribeiro