Fundamentos By Henrique Cruz / Share 0 Tweet René Descartes faz parte dos grandes da matemática, equiparando-se a Gauss, Fermat, Euler, Galois e outros. O primeiro a formular o conceito de espaço, Descartes abriu o caminho para a álgebra e a geometria analítica, fundamentos da matemática moderna. O autor relata a sua própria experiência ao tomar conhecimento da comprovação geométrica do Teorema de Pitágoras. O plano de coordenadas cartesianas é descrito e a sua utilização é apresentada na resolução de um sistema de equações lineares. Por último, é evocado Arquimedes, antecessor de Descartes, encerrando-se o trabalho com uma das muitas histórias da sua vida. René Descartes, (1596-1650), filósofo e matemático francês, era uma pessoa de grande capacidade intelectual. No seu pequeno livro, “Prelude to mathematics”, (Dover Publi. Inc. New York, 1982), W. W. Sawyer, professor emérito da Universidade de Toronto, diz o seguinte: “Descartes mostrou que qualquer resultado geométrico pode ser transformado em resultado algébrico. Os pontos de uma figura geométrica podem ser marcados num papel quadriculado. Assim, a posição de cada ponto será medida por um par de números (x,y). Qualquer propriedade decorrente de um teorema geométrico, pode ser traduzida numa relação algébrica através dos x’s e y’s de vários pontos. Alguns matemáticos admiram a invenção de Descartes porque permite abolir a geometria como tema. Outros preferem pensar em termos da geometria , sem apelar para a álgebra. Mas para mim, o real valor do pensamento de Descartes, é porque permite passar continuamente para a frente e para trás, entre a geometria e a álgebra. O significado de um resultado algébrico pode muitas vezes ser melhor avaliado quando traduzido para a geometria, porque dá uma maneira de ver e sentir as abstrações algébricas. Por outro lado, os resultados geométricos são muitas vezes mais precisos e claros quando traduzidos na forma algébrica ou aritmética”. Aproveito esta questão da equivalência conceitual entre álgebra e geometria, para contar o que me aconteceu. Aprendi no ginásio, por volta dos quinze anos, o teorema de Pitágoras que passei a aplicar sem problemas. Em um triângulo retângulo a soma dos quadrados dos lados adjacentes ao ângulo reto, (catetos), é igual ao quadrado do lado oposto a esse ângulo, (hipotenusa), a2+b2=c2, onde a, b e c são números inteiros positivos representando os respectivos comprimentos. No entanto, somente muito mais tarde, depois de formado, é que tomei conhecimento da sua comprovação geométrica. Foi grande o impacto. A abstração algébrica ganhou de repente uma nova realidade. Aqueles números ao quadrado, representavam áreas de figuras geométricas que somadas davam o teorema de Pitágoras. Esta comprovação foi dada pelo matemático hindu Bhaskara, cêrca de 1150. Vejamos como. Admitamos o trio 3,4,5, que é pitagórico pois satisfaz o teorema de Pitágoras, 9+16=25. Acompanhem pelo desenho. Primeiro construimos um quadrado de lado 3+4=7. Este quadrado pode ser subdividido de duas maneiras, conforme a seqüência dos números 3 e 4 que formam o seu lado. Façamos a divisão dos quatro lados no sentido anti-horário, começando pelo lado inferior horizontal, primeiro 3 e depois 4 para todos eles. Os pontos intermediários da divisão dos lados do quadrado, formam um novo quadrado inscrito, cujo lado é a hipotenusa do triângulo retângulo, ou seja, 5. Façamos a leitura geométrica da figura. O quadrado maior é igual à soma das áras de quatro triângulos retângulos mais a área do quadrado da hipotenusa. Muito bem. Façamos a segunda divisão do quadrado maior, mas agora com outra forma de subdivisão dos lados. Comecemos pelo lado horizontal, no mesmo sntido anti-horário. Façamos 4 e depois 3. Lados seguintes, 4 e 3, 3 e 4 e por último, 3 e 4. Unindo os pontos imtermediários obtidos, temos dois quadrados, um de lado 4 e outro de lado 3. As áreas restantes formam quatro triângulos retângulos iguais aos da divisão anterior. Se compararmos os dois resultados, chegamos à conclusão que a área do quadrado inscrito da primeira divisão é igual à soma das áreas dos dois quadrados da segunda divisão, ou seja, as duas figuras geométricas comprovam o teorema de Pitágoras. De fato, sendo iguais as áreas dos dois quadrados maiores (lado 7), se subtrairmos delas áreas iguais (4 triângulos retângulos), o que resta, são áreas também iguais, o que comprova o teorema. Por último, apresento o desenho do triângulo retângulo com os correspondentes quadrados dos lados. Mas voltemos a Descartes. Foi na “A Geometria” que expôs as suas teorias. No entanto, não foi ele quem inventou o plano de coordenadas com dois eixos ortogonais, apesar de levar o seu nome: sistema de coordenadas cartesianas. A homenagem é merecida pois o sistema é o resultado imediato dos seus argumentos. No plano euclidiano marcamos duas linhas retas ortogonais, – dois eixos – , um horizontal o eixo dos x’ e outro vertical o eixo dos y’. Os dois eixos dividem o plano em quatro quadrantes, classificados no sentido anti-horário de rotação, em 1º, 2º, 3º e 4º quadrantes . Os dois eixos estão divididos na seqüência dos números inteiros, positivos e negativos, mais o zero, origem das escalas no ponto de cruzamento. A unidade de medição é um valor convencional, distância do ponto zero ao número 1. No 1º quadrante os valores nos dois eixos são ambos positivos; no 2º quadrante os valores no eixo dos x’s são negativos e no eixo dos y”s positivos; no 3º quadrante os valores nos dois eixos são ambos negativos; no 4º quadrante os valores no eixo dos x’s são positivos e no eixo dos y’s negativos. Um fato importante, fundamental, deve ser posto em destaque. Com o plano de coordenadas, Descartes criou, pela primeira vez na história da matemática, o conceito de espaço, que até então não existia. Os Gregos da Antiguidade Clássica consideravam as figuras geométricas isoladas, ou relacionadas entre si, mas nunca inseridas em um plano independente. O que mais se aproximou dessa idéia foi Arquimedes, (287a.C.-212a.C.), o maior matemático da Antiguidade, que sem dúvida, raciocinava em termos espaciais, mas não conseguiu estruturar uma forma geométrica adequada para o espaço. Voltemos ao sistema de coordenadas cartesianas. Os dois eixos numéricos permitem que qualquer ponto do plano, seja representado por um par ordenado de números inteiros. É claro que podiamos estender essa possibilidade de representação a pares ordenados de números reais. Mas fiquemos no caso mais simples dos números inteiros. Dois números dentro de parentese curvo formam um par ordenado. Quer dizer, ordenado porque a ordem em que são apresentados é sempre a mesma, obrigatoriamente. O primeiro número é do eixo dos x’s, o segundo do eixo dos y’s. Exemplos: (5,10), (3,–6), (–6,3), ,(–1,2), (–2,–4), (0,3), (3,0). O segundo e o terceiro exemplos, são com os mesmos números mas em ordens diferentes, dando portanto dois pontos diferentes. Vejamos a localização nos quadrantes: (5,10) está no 1º, (3,–6) no 4º, (– 6,3) no 2º, (–1,2) no 2º, (– 2,–4) no 3º. O dois últimos não estão em nenhum quadrante: (0,3) está no eixo dos x’s e (3,0) no eixo dos y’s. A representação mais simples no plano cartesiano é a de uma linha reta. Em geometria analítica, a equação linear ax+by=c, onde (x,y) são pontos do plano, representa a equação geral de uma linha reta. Resolver uma equação linear significa obter os valores de x e y que satisfazem a equação, ou seja, obter os números inteiros que a transformam numa identidade. Os valores obtidos são as coordenadas de pontos da linha reta dada. Vejamos o caso de duas equações lineares simultâneas formando um sistema de equações. Este sistema existe, se e somente se, as duas linhas retas correspondentes não forem paralelas. Sendo assim, existe um ponto comum às duas linhas retas, que é o ponto de cruzamento das mesmas. Para resolver o sistema, isto é, obter o par ordenado das coordenadas desse ponto, aplica-se o método de substituição. O método consiste em obter, em uma das equações, o valor de uma variável e substituir, essa variável, pelo seu valor na outra equação. Com isso, obtem-se o valor numérico desta segunda variável, que substituida na primeira equação, dá o valor numérico da segunda variável. Exemplo: o sistema de equações 2x–y=9 e 3x–4y=–24. Da 1ª equação obtem-se y=2x–9. Substituindo na 2ª equação, 3x–4(2x–9)=–24, dá x=12. Voltando à 1ª equação temos x=15. O par ordenado é (12,15). Para certas equações a resolução pode ser bem mais rápida. Por exemplo: x+y=6 e x–y=8. Somando as duas equações temos 2x=14 ou seja x=7, substituindo na 2ª equação temos y=-1. O par ordenado é (7,-1). Comecei com Descartes, termino com Arquimedes. Os dois são muito parecidos, na criatividade e no raciocínio. São muitas as histórias que se contam de Arquimedes. Escolho a de Hierão, rei de Siracusa, que pediu a Arquimedes que verificasse se a sua coroa era ou não de ouro puro. Enquanto se banhava Arquimedes descobriu a solução. Pulando da banheira saiu para a rua, nú, gritando Eureka! (Descobri!). O que ele descobriu ficou conhecido com o nome de Princípio de Arquimedes. Ele diz que “um corpo mergulhado num líquido recebe um empuxo vertical de baixo para cima igual ao peso do volume do líquido deslocado”. Foi o que ele fez com a coroa. Mergulhou-a num recipiente cheio de água até a borda, de forma a recolher toda a água que transbordasse. Com isso, obteve o volume de metal da coroa. Pediu ao rei para que lhe fornecesse um volume igual de ouro puro. Comparando os dois pesos, da coroa e do bloco de ouro puro, provou que a coroa não era de ouro puro. Os dois pesos não eram iguais. Fico por aqui. Até à proxima.