Homem, Mulher Girafa ou Mulher Satélite?


Warning: array_rand(): Array is empty in /home/opensador/public_html/wp-content/themes/performag/inc/helpers/views.php on line 280

Notice: Undefined index: in /home/opensador/public_html/wp-content/themes/performag/inc/helpers/views.php on line 281

“Entre um homem e uma mulher não é possível haver amizade. É possível haver paixão, hostilidade, veneração, amor, mas amizade, não.”  (Oscar Wilde)

O homem precisava de uma mulher indubitável para o ofício do amor. Havia a necessidade de distinguimos o macho da fêmea. No período, os princípios religiosos e éticos determinavam que a presença de um homem perante as mulheres culminava no sexo fora do casamento ou na supremacia da tirania do mais fraco sobre o mais forte. Penso que era um argumento totalmente racional para a época, visto que uma das discussões recorrentes era a motivação hormonal masculina para traição, lascívia, mentira, desejo de privacidade ou mesmo a irredutível incomunicabilidade entre os gêneros.

Claro que os certames dos livros de filosofia  ajudavam a promover os mitos, em especial,  que o homem não gostava de encontros com mulheres que não fossem as suas esposas; exceto quando esses encontros fossem casuais, visto que o gênero era um autêntico equilibrista entre afeto e limites.

Por um lado,  a questão das diferenças pode ter sido o elemento de desconforto para o surgimento do feminismo, principalmente frente à cultura de que o homem projeta a mulher  ideal para ser a mãe dos filhos. Isso baseado no mito de que ela não deve apresentar sinais de instabilidade e lembrar o conforto do seio materno.

Na falta de evidências empíricas, essa condição se aplicaria a cultura coletiva que reforça a atribuição às mulheres, das fragilidades e complicações da relação. Mas será que tudo se resume ao instinto maternal, assegurar uma família composta de padrões e ceticismo morfológico ou a lógica em que tudo se resume as contas pagas, a casa construída e ao amor do “Esse cara sou eu”.

Por outro lado, para compreender a profundidade das diferenças, é preciso também entender um pouco de conceitos avessos sobre o acasalamento, religião e biologia. A bíblia  apresenta a mulher como parte da costela de Adão, mas a ciência apresenta o feto masculino como o fruto de um esforço genético à medida que concorre contra o desenvolvimento do feminino e só após seis semanas de concepção, se o cromossomo Y não produzir uma determinada proteína, um feto feminino terá presença garantida. Ironicamente, seria o homem gerado a partir da obra do destino feminino.

Essas questões deixam claro que desde os primórdios dos nossos antepassados, busca-se identificar diferenças entre os gêneros, seja pela crítica ao essencialismo feminismo que descreve que há uma natureza específica da mulher, seja pelo fato de se afirmar que os meninos são inclinados a comportamentos típicos do gênero masculino, principalmente os que maximizam as necessidades de intelectualidade, competitividade e sentimentalidade.

Sem a possibilidade de escolha, meninos deveriam escolher brincar com meninos e acreditarem que não há sentido nos momentos de amizades intersexuais. Menina teria que comprar esmaltes com glitter, determinado, assim, uma espécie de Código da Vinci dos encontros e desencontros entre gêneros.

Carlos Drummond de Andrade pontuou em certa ocasião a questão da apreciação e julgamento dessas diferenças em “A solidão do Girafo”: “[…]não resta dúvida que, democraticamente, a moça girafa tem direito de escolha, e pode não ir contigo e com teu focinho…”

Penso que mesmo que não existam muitos homens girafos, a mulher girafo não quer privilégios. Mesmo calada, não é sigilosa.  E mesmo na solidão, a moça girafo entende que “cada um de nós há de sentir-se estimulado a crescer no mínimo alguns centímetros em dignidade cívica, abnegação, amor à verdade”.

Não poderia deixar destacar que a ditadura dos mitos lembra a Cinderela e a busca pelo príncipe que assume a perfeição nos seus sonhos platônicos. Por um lado, assume uma postura Nietzscheniana quando afirma que não deveríamos tentar deter a pedra abaixo. Por outro, a coletividade prefere o padrão de mulher Cinderela e esquece que cada indivíduo é uno e que não há singularidade.

Prefiro pensar que toda mãe nunca deveria vestir uma filha de Cinderela, com vestido de armação azul em dois tons e tiara na cabeça, ou seja, estabelecendo para menina todos os pré-requisitos do mito idealizado. Seria uma compra sem direito a troca e cheio de regras, com cara de coração, perfeita forma de bombom serenata do amor. Seria invalidar que cada um é motorista do seu ônibus. Seria a transferência de responsabilidade sem aviso prévio.

Conheço mulheres independentes, resolvidas, defensoras de suas idéias, mães adoráveis, mas que sonham com um grande amor e terminam insistindo nos mitos. Algumas delas vão ao cinema, viajam ou almoçam sozinha, mas sempre duvidam que o conto não é verdadeiro e terminam a noite com a verdade individual e solitária: “ele se apaixonou”. Talvez a grande verdade é que é melhor acreditar em um mito do que verdadeiramente duvidar de que ele não existe.

Na última semana, ouvi a definição da nova mulher Cinderela, que seria a mulher-satélite que vive na órbita alheia e encontra o homem sol. Quando recebe a primeira mentira, não pergunta pelo fim, apenas fica presa a uma relação inexistente e termina amando mais a ausência do homem do que a sua presença. Seria o mito moderno de viver e girar em mudanças radicais pelo sol alheio.

Diferenças existirão no pensamento, anatomicamente, mas antes de se frisar os mitos entre sexos, deve-se pensar em diferenças entre vidas e conviver com a proposta de Aristófanes: “será ele uma figura andrógina, com uma metade feminina e outra masculina.” Penso que devemos ter um pé firme na vida, entendendo as mudanças e quebrando os mitos que os apostos se atraem, independente de diferenças entre os gêneros.

Assim, “qualquer tentativa de negar a existência de uma essência no homem ou na mulher deixa-nos num beco sem saída para o sexo que estiver no lado oposto (Robert Scholes, in Naomi Schor e Elizabeth Weed, 1944, p.127)”.
About the author

Luciana Santa Rita