Sobre rupturas e revoluções


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 Bom, alguma coisa você, que inicia sua leitura aqui, vai ter que ler de escritos anteriores. Só deixo um alerta. Só os covardes e preguiçosos mencionados na aula de Foucault de 5 de janeiro de 1983 lêem apenas 140 caracteres. Quer saber mais sobre a leitura de Foucault que fala dos covardes e preguiçosos e seus talentos para serem governados e ficarem reclamando? Leia depois meu texto anterior, mas comece por aqui, um grande copia e cola da Wiki entremeado por reflexões minhas. 

O objetivo deste pequeno escrito é começar a estabelecer as bases para um paralelo histórico entre alguns momentos da humanidade. Paralelo que começo a traçar, fruto de ideias que começam a se organizar. Busco similaridades e diferenças entre o colapso do império romano, o declínio das cidades-estado de Gênova e Veneza, o fim do império comercial holandês, a revolução e o fim da monarquia francesa, a revolução comunista e o fim do czarismo, o colapso da União Soviética, por exemplo. A ideia é, sem um historicismo profundo, entender o que ocorreu nestes momentos do progresso da humanidade. Uso a palavra progresso baseado no texto de ontem, no qual se convencionou este ponto. Progresso é sinônimo de revolução. E vivemos no meio de uma, ou não?

 Um ponto importante para contextualizar a discussão deve ficar aqui registrado. Meu interesse não é histórico, não é estrutural, não é sobre as eras da humanidade, a passagem da antiguidade para a idade média. O ponto que me cativa é o que faziam ou deixavam de fazer as pessoas que causaram esta revolução histórica. Quem eram o 1% no poder, os 98% que começaram a ficar muito insatisfeitos e os 1% que provocaram a mudança. Não apenas os 1% de bárbaros, casados com mulheres romanas ou homens romanos nas províncias e nas capitais do império. Mas também os 1% de romanos que minaram, solaparam e derrubaram o império. Eles não constam nos livros, mas tenho certeza de que procurando vou encontrá-los. Um viva a Descartes e o método hipotético-dedutivo.

Vamos à primeira revolução. Aqui, a expressão colapso do império romano refere-se à tomada de Roma pelos hérulos e os fatores que permitiram a uma estrutura com o poder militar e econômico da Roma dos séculos I e II d.C sucumbir. Vale deixar aqui registrado que mesmo não estando em busca de causas históricas, um dos papas no assunto, Edward Gibbon, que escreveu The Decline and Fall of the Roman Empire atribuía a dois fatores a dissolução do poderia romano. A primeira de cunho socioocultural, a substituição da crença nos deuses da Antiguidade pela crença no cristianismo. A segunda, o que é chamado inocentemente de invasões bárbaras. Estas de bárbaras não tinham nada. Na verdade foi a chamada “onda germânica”, que chegou a Portugal e Espanha e depois a Roma. Não deixe que os alemães ouçam você chamando seus ancestrais de bárbaros. A batalha de Teutoburgo é até hoje é cantada nas escolas da Alemanha como um marco da civilização alemã. 

Nesta batalha, uma aliança de tribos germânicas chefiada por Armínio (Hermann), da tribo dos queruscos, emboscou e dizimou três legiões romanas, lideradas por Públio Quintílio Varo. Os germânicos eram até então tidos como aliados pelos romanos, comprados com sutilezas e casamentos. Como resultado a batalha estabeleceu o rio Reno como fronteira do império romano pelos séculos seguintes, fato que estabeleceu uma importante distância entre as culturas romana e germânica, assim como o declínio da influência romana em todo o Ocidente. Extrapolando, exagerando e caricaturando os dados anteriores, os cristãos eram os jovens da Praça Tahir e da Liberty Square, enquanto que os germânicos têm muitas caras hoje em dia, vietcongues, iraquianos, iranianos, chineses, egícpios e líbios. Tantos que parecem aliados mas logo não o são.

No seu auge, o sistema econômico do Império Romano era o mais avançado que já havia existido e que viria a existir até a Revolução Industrial. Seu gradual declínio, durante os séculos III, IV e V d.C, contribuiu enormemente para o colapso do império. Uso aqui a expressão colapso porque não acredito em quedas de instituições e sim em colapsos, em um lento movimento de solapar e minar.  Este colapso, ou lento declínio, se deu no âmbito da desintegração de uma série de instituições. O edifício político ruiu aos poucos, bem como outras instituições militares, sociais, arrastando o sistema econômico. Há muitos escritos históricos sobre as possíveis causas do colapso, mas como já dito, vamos procurar o que fizeram as pessoas. Fato é que esta desintegração é um arquétipo grupal, um símbolo de medo que obceca quem estiver no poder imperial ou nas suas embaixadas pelo mundo.

A massiva inflação promovida pelos imperadores durante a crise do terceiro século destruiu a moeda corrente, anulando a prática do pensamento econômico em longo prazo e consequentemente a acumulação de capital. Este aspecto somado ao controle estatal da maioria dos preços teve efeitos desastrosos. Roma deixou de crescer. A falta de condições financeiras e a falta de escravos para uso de mão-de-obra em todo o império geraram tais quedas. Esses fatos tiveram consequências desastrosas pois, com quase todos preços artificialmente baixos, a lucratividade de qualquer empreendimento comercial foi anulada, resultando num colapso completo da produção e do comércio em larga escala e da relativa e complexa divisão do trabalho que existia durante a Pax Romana. 

 Aspectos macroestruturais são transformados lentamente por pequenas ações e decisões humanas ou por pequenos mas seguidos eventos envolvendo indivíduos ou grupos. Uma batalha perdida, a morte do último imperador sob o qual o império esteve unificado, um bando de bárbaros atravessando um rio ou ocupando uma praça. A execução de alguém, como Stilicho, o general romano meio vândalo (no sentido de origem, o cara era da tribo dos vândalos), o saque de Roma pelos visigodos. A população das cidades caiu por todo império devido ao colapso comercial e industrial. Os trabalhadores desempregados se fixaram no campo e tentaram produzir eles mesmos os bens que queriam, desmonetizando a economia e acabando com a divisão do trabalho, ocorrendo uma drástica redução da produtividade da economia.   Esses fenômenos resultaram na criação do primitivo sistema feudal baseado na auto-suficiência de pequenos territórios economicamente independentes. Com seu sistema econômico destruído, a produção de armas e a manutenção de uma força militar defensiva se tornaram impossíveis de serem financiados. Isto facilitou enormemente as invasões dos bárbaros.  Outros fatores internos colaboraram para o colapso do Império. O exército descobriu sua importância no sistema e passou a exigir status e melhores remunerações. O império não tinha como corresponder a tais demandas. 

Alguns destes pontos devem ser guardados na nossa memória. O sistema feudal não foi um retrocesso. Foi um avanço no sentido de autonomia das pessoas, da auto-suficiência dos trabalhadores, uma saída no sentido de Kant da situação do panes et circenses. Por este arrazoado simples de ideias até aqui intui-se quem foram algumas das pessoas e grupos de pessoas que com seus movimentos causaram a queda do império romano. Generais e nobres ambiciosos, querendo uma parcela maior da riqueza do que a pátria mãe gentil poderia dar. Ou seja, uma elite ambiciosa, de uma ambição sem medidas assessorada por financistas que emitiram moeda para arcar com suas dívidas impagáveis.

Alguém dirá que minhas buscas por paralelismos e revolucionários são forçadas e se apóiam exatamente no medo ancestral. E eu direi que não defendo que nada será como antes amanhã. Mas todo dia ela, a história, que faz tudo sempre igual, nos acorda na hora que não queremos.
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Marcos Bidart de Novaes