Da confiança e do perdão


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Em 1918, após vários anos de opressão por parte do Império Austro-Húngaro, o sonho do estado tcheco autônomo se torna realidade. Eis o início da história moderna da República Tcheca. Este estado, chamado de Primeira República Tchecoeslovaca, tinha Praga como capital e o tcheco e o eslovaco como línguas oficiais. Nesta época, a região da Boêmia, aonde Praga se encontra, era a região mais rica e industrializada do Império Austro-Húngaro, e uma das dez mais ricas do mundo. A Tchecoeslováquia era um país promissor mas, como todos sabem, as coisas não aconteceram como era esperado.

A Tchecoeslováquia foi invadida, e não apenas uma vez. Em 1938, parte do seu território foi "doado" aos alemães. Em seguida, o país foi tomado pelos nazistas, e Hitler quis fazer de Praga uma das capitais de seu império. Há um antiquíssimo cemitério judeu em Praga, o mais antigo que ainda existe, com túmulos datados de 1400, e que somente sobreviveu ao domínio germânico porque Hitler decidiu que aqui, nesta cidade, existiria uma espécie de museu judeu, e este cemitério faria parte deste projeto.

Em 1945, após o término da Segunda Guerra Mundial, a Tchecoeslováquia se torna novamente uma república, mas já não tão promissora quanto antes. Mas ao menos este povo estava novamente livre. Novamente? Apenas três anos após a retirada alemã, os comunistas decidem agregar o país ao seu império. Foram quarenta e um anos de opressão, quarenta e um longos anos.

Mas não são exatamente estes os assuntos nos quais eu quero me focar, apesar desta introdução ter sido necessária para chegar aonde eu queria. O ponto é que este povo não foi somente invadido, mas foi deliberadamente traído por seus aliados. A França, grande aliada do estado tchecoeslovaco, assinou os papéis da "doação das terras tchecas" aos alemães, no famoso "Tratado de Munique", junto com a Inglaterra, Itália e, é claro, a Alemanha. Óbviamente nenhum tcheco estava presente nesta reunião. Winston Churchill disse a respeito disto: "A Grã-Bretanha e a França tiveram de escolher entre a guerra e a desonra. Eles escolheram a desonra, e portanto eles terão a guerra". Quanto a invasão soviética, a história se repete. Novamente o estado tchecoeslovaco não obtém ajuda de nenhum outro país europeu e, assim como a Polônia, se submete aos russos.

Em 1989, os tchecos organizam a Revolução de Veludo, uma revolução não agressiva, sem armas, aonde quase meio milhão de tchecos foram às ruas de Praga para manifestar contra o regime comunista. Liberdade, ainda que tardia. Václav Havel, na época um escritor e dramaturgo, além de ter sido um dos grandes ícones desta revolução, se tornou o primeiro presidente tcheco. Mas muitos tchecos não aprovam a postura que ele adotou. E qual foi esta postura? Havel abriu mão de uma possível vingança contra alemães, russos e quem quer mais que fosse. Cidadãos russos teriam o direito de viver neste novo país, bem como os alemães, e o Partido Comunista nunca foi dissolvido. Uma atitude honrável, ao meu ver, ainda mais por ter ido contra a sede de vingança do povo.

E nisto consiste o perdão, mas talvez não a confiança. Perdão não é esquecer o que aconteceu, mas sim controlar as consequências do que irá acontecer. Perdão nunca é esquecimento, perdão é a memória viva, dolorosa, relembrada. Mas e a confiança? Bem, esta retorna com o tempo, seja para bem ou para mal. Hoje em dia a República Tcheca mantém boas relações com toda a Europa, incluindo a França, e, neste momento, está na presidência da União Européia. Mas uma questão ainda paira no ar: será que quem é perdoado mantém a mesma memória dos acontecimentos como quem perdoa? Será que há algum tipo de crescimento após estes conflitos para ambos os lados, será que uma paz verdadeira e estável pode ser novamente alcançada?

Eu penso que há esperança…

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Gilberto Agostinho