Cultura do É Impossível


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Quando durmo, sonho com seres impossíveis de beleza e feiura fabulosas, monstruosidades repletas de tentáculos e fome, deuses e rituais pagãos, universos encantados, alienígenas, fadas. Sonho que vôo altíssimo, que mergulho em águas profundas, enfrento e cavalgo nas costas de monstros marinhos, que sou bicho, que estou morta e que renasço.

Para ser desvendado, o verdadeiro significado destas imagens oníricas depende de uma gama de informações bibliográficas sobre o sonhador e dos eventos que precedem imediatamente a noite em que foram consubstanciadas. Porém, uma análise superficial desta lista de sonhos pode dar uma idéia geral sobre a pessoa que sonha, pois é um exemplo de como seu inconsciente se manifesta ao sonhar: ao invés de utilizar símbolos comuns do cotidiano-vida-real para processar as vivências do dia-a-dia, esta mente adormecida traduz seus medos, desejos e traumas em imagens codificadas – símbolos – das mais intangíveis possíveis.

Meus sonhos fantásticos mostram que dentro de mim tudo é possível. Não há limite para a criatividade humana, e para aqueles que têm a mente aberta esta criatividade se manifesta das formas mais inesperadas possíveis. E enquanto isso, há pessoas que dizem não sonhar, ou até mesmo que nunca sonham coisas tão absurdas, quando na verdade todos, em princípio, temos a capacidade de vivenciar o impossível ao dormir, pois somos humanos e compartilhamos de um inconsciente coletivo, universal, transcendental. Porém, muitos de nós que deixam de sonhar acordados, também podem deixar de sonhar o impossível no mundo dos sonhos. Uma realidade limitada pode limitar as manifestações do inconsciente.

Mas afinal, por quê paramos de sonhar acordados? Por quê forçamos nossa mente a acreditar que existem limites para tudo, e o possível é só aquilo que se vê, se toca ou corrobora as leis da ciência e da lógica mecanicista de tudo que nos rodeia? Muitos inventores revolucionários eram vistos como loucos, então a fim de evitar sermos julgados como insanos, fazemos o possível para nos adaptar à realidade, e para tanto deixamos de falar sobre nossos amigos invisíveis – deixamos de ser crianças – , passamos a criticar a ficção científica – achando que com isso somos mais intelectuais, acima de uma média ignorante – e nos tornamos tão céticos a ponto de acreditar que até mesmo coisas tangíveis, como comprar um carro novo, emagrecer e parar der fumar são objetivos impossíveis de alcançar.

Eu cresci num ambiente do “possível”. Meus pais nunca me disseram que eu não podia ser, fazer ou ter alguma coisa. Eles nunca me proibiram de sonhar! Nunca insistiram que a vida é dura e temos como obrigação ter os pés no chão. Ao invés disso, de criar limitações, eles me mostraram o caminho a seguir para que eu um dia tivesse a capacidade de realizar meus sonhos, meus desejos. Sempre tive a criatividade à flor da pele, quando criança tive um amigo imaginário – que desapareceu na hora certa, mas do qual ninguém tirava sarro – passava horas sonhando acordada e criando, inventando, construindo meus próprios brinquedos. Aos 10 anos construí meu primeiro celular com uma caixa de fósforos. Ele era o máximo! Pois eu o havia construído. 20 anos depois tenho um celular que faz muito mais que chamadas telefônicas, e reconheço com alegria que um sonho infantil – apoiado na ficção científica que sempre apreciei – se tornou realidade, não através de minhas mãos, claro, mas porque aqueles que o construíram também sonharam um dia com essa possibilidade, e insistiram nesse sonho até que o tornaram possível para todos, até mesmo para aqueles que duvidaram.

Como todos sabemos, muitas mentes brilhantes alemãs rechearam o mundo com grandes descobertas, passando pelo carro, indo ao OB – o absorvente interno, viva! – até a lente de contato, criada por um “louco” que pingou vela derretida na própria córnea até conseguir um molde perfeito para sua criação. Então, qual não foi minha surpresa ao me ver de repente numa Alemanha recheada de pessoas amantes do “é impossível”. Sim, aquele mesmo “impossível” que não permite alguém parar de fumar, nem emagrecer, nem levar uma vida mais saudável, ou fugir às expectativas de um mercado de trabalho exigente e brutal, nem ter uma vida em comunidade fora da igreja, ou acreditar que um dia carros poderão voar e que alienígenas existem. Conheci alguns alemães enquadrados, extremamente “pés-no-chão”, vazios de fantasia e criatividade, sofredores por viverem vitimados por sí próprios – devido a um medo paralizante de ousar – num sistema escravizador da mão de obra e de mentes, numa sociedade aparentemente estagnada que parece exigir o mesmo comportamento de todos as pessoas. Os medrosos tentam se enquadrar, os muitos que conseguem passam a vida temendo um sistema que não exige nada mais deles que produzir, produzir, produzir. Grande parte se torna homens de bens workaholics, com muito dinheiro no bolso e objetos que não podem aproveitar, pois não têm tempo. O trabalho e o acúmulo de dinheiro os escraviza e limita a experienciar uma existência lugar-comum, e a maioria morre sem perceber que nem chegaram a viver.

Somos todos escravos do sistema. Mas não temos todos que nos deixar escravizar e restringir nossa mente a ponto de matar nossos sonhos de liberdade, bem-viver e vida em outros planetas, pela pura e simples ganância do ter pelo ter. Viver é muito mais que trabalhar e juntar riquezas e felizmente também encontrei alemães de corpo e almas abertas ao novo que pensam assim, que antes de tudo está o viver bem, o desfrutar a vida e as pequenas coisas que nos fazer rir, e o sonhar com um mundo novo, mais justo, que só conseguiremos alcançar se sonharmos todos juntos, deixarmos a ganância de lado, e passarmos a acreditar novamente que tudo é possível.

Aprendi a palavra alemã “unmöglich” (que significa “impossível”) jogando Diablo II. Sempre que tentava inserir um ítem novo na armadura do meu personagem, o jogo dizia em alto e bom som “unmöglich” , para indicar as combinações que não permitia. Mas como quem não desiste – cabeça dura mesmo – , eu insistia em tentar todo e qualquer ítem pois esperava receber a qualquer hora um “möglich” (possível) como resposta. Afinal, como dizem por aí, a esperança é a última que morre. E assim continuo acreditando que tudo é possível, até mesmo quando tentam provar o contrário.

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Ariadne Rengstl