Por que o PT ainda merece atenções


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As contribuições deste texto visam assegurar o lugar de destaque na sociedade e na imprensa a um partido que incomoda, seja pelas virtudes ou pelos erros que abrem ala para as experiências da esquerda na seara institucional. Buscaremos expor as nuances constitutivas do partido e a importância fundamental de olharmos as eleições próximas como um momento de correção de rumos: o partido foi varrido pela moral em 2005 num escândalo de financiamento de deputados da base aliada, bem como de doação de um carro a um dirigente do alto escalão petista por parte de uma empresa prestadora de serviços da Petrobras, a GDK. Nos debrucemos sobre o PT, ainda é preciso.

O Partido dos Trabalhadores parece seguir no foco dos rumos da política brasileira não só por ocupar o governo central do país, mas, principalmente, por ter sido uma organização fruto da justaposição de diversas correntes da esquerda que apresentavam críticas contundentes ao capitalismo e à experiência socialista do leste europeu. O partido apresenta propostas no sentido de refundar os paradigmas de relações do Estado com a sociedade civil, engendrar novas práticas associativas, políticas sociais de caráter de classe, além de apresentar eixos organizativos voltados para a imersão na institucionalidade democrática envolta na perspectiva dos movimentos sociais. De fato, o partido ilustra no país a partir de experiências de governos locais importantes elos participativos no campo das decisões políticas do executivo. O partido capitaliza apoios e adesões rumo à ampliação do escopo eleitoral a ser coroado com a vitória de 2002 e a conquista do maior número de votos no país nas eleições municipais de 2004. Uma pergunta segue: por que o PT ainda merece atenções? Podemos esboçar quatro tendências importantes de vislumbre nas inquietudes acadêmicas como também da sociedade civil e cidadãos comuns que coroaram o partido em primeiro lugar na preferência partidária em pesquisa feita em junho deste ano pelo Instituto Vox Populi e divulgada na semana passada[1].

Em primeiro lugar, o partido ainda demonstra uma força importante na ação conjunta com os movimentos sociais do país, ou seja, uma desejabilidade de “estar presente” nesses movimentos, cooperando e canalizando-o para um projeto voltado para a arena eleitoral. A proximidade com os movimentos sociais demonstra a perspectiva social que o partido traz na sua bagagem, quando para a boa parte da população ouvida pela pesquisa supracitada acena positivamente para o governo do Presidente Lula por ter ancorado projetos sociais. E mais: estar/cooperar com os movimentos suscita influenciar o partido a ser permeado por bandeiras anticapitalistas. O movimento social pode também, é claro, ser influenciado pelo partido, porém, podemos inferir que no caso do PT, a presença dos movimentos sociais é um fator que leva-nos a acreditar na sua potencialidade como um membro da sociedade civil, sendo o partido para o pensador italiano Antonio Gramsci um ator da “grande política” rumo a ações contra-hegemônicas.

Em segundo lugar, o partido apresenta um norte de transformação da institucionalidade democrática, apresentando alternativas e um projeto de rompimento com a agenda neoliberal vigente no mundo, mas com contorno próprios na América Latina. O partido alça ao governo central apresentando outra agenda, que rompe com a lógica do Estado mínimo, revalorizando o Estado, porém, em descompasso com uma lógica de soma-zero, de arrefecimento da sociedade civil, ao contrário, o governo dá continuidade a um processo de incorporação da sociedade civil nos processos decisórios chancelados pela constituição de 1988. O governo Lula no seu primeiro mandato vai além e propõe uma espécie de arena discursiva e de diálogo entre o “Capital e o Trabalho” denominado de Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES) com representantes de empresas, entidades, sindicatos, personalidades, dentre outros. A construção de uma TV pública merece destaque: a pesquisa supracitada traz a horrenda constatação de que 56% da população está pouco ou nada interessadas pela política. Temos do outro lado 44% que não se encontra na programação da televisão brasileira, já que a política pode ser pensada classicamente como o modo cristalizado do viver em sociedade. Ter uma TV que pense a sociedade e suas nuances de um modo afastado de clichês dominantes é um fator republicano antes de qualquer coisa, a construção de um espaço de discussão, construção e delineamento de um repertório público que deve explicações e olhares de todas as coletividades. Tal caminho entre em confronto com a lógica de mercado decerto.

Em terceiro lugar, o partido se mostra inquieto quanto aos grandes rumos que a humanidade se curva, é o partido que não tem uma carta debaixo da manga quanto ao imbróglio do socialismo no século XXI combinado com a democracia enquanto um valor. A constatação de uma inquietude teórica nas fileiras partidárias explicita que não é tácita a envergadura neoliberal cunhada no decorrer da década de 80 no mundo, heroicizando o mercado. Analisamos que é presente a busca por caminhos anticapitalistas no partido, mas combinada a um Estado de Direito e ao jogo democrático, a conjunção de um desejo aliado a uma contingência como pensou Winston Churchill quando respondeu que a democracia seria “o pior dos regimes com a exceção de todos os outros”.

Por último, temos um fato essencial: a prática do partido foi levada pelas correntes dirigentes de maior expressão a se adequar aos pragmatismos eleitorais em busca de sucessos no campo institucional, criando uma contradição: o partido cresce, conquistas espaços importantes, mas sem conseguir ligar homericamente os fins com os meios, em outras palavras, o pragmatismo acaba por trazer mais prajuízos do que benesses aos vencedores. Vide o escândalo de 2005 que retirou da cena política burocratas de carreira no partido, sem alternância de posições, mantendo uma casta que veio a ganhar status por operacionalizar meios de fortalecimento do partido. Mas de que forma? Dois momentos: jornais de todo o país destacaram no ano passado, com razão, a importância de um partido ter eleições diretas para a direção, porém, ainda verifica-se a presença entre 30% e 40% dos militantes. Muitos dos votantes ainda têm o estímulo de parlamentares que ajudam com o transporte voluntário entre a residência e o local de votação. No final temos um partido “matrix”: aquilo que parece, mas não é. Outro fato deu-nos conta de tal discrepância: o partido é o preferido dos 12% dos que se consideram de direita. Pensemos também que o partido curvou-se a uma agenda que migra para o centro, tornando-se o governo uma convergência de diversos interesses que dão sustentação também a projetos de uma envergadura á esquerda, já que há interesses de permuta na relação de aprovação de projetos do executivo no congresso nacional.

Em suma, estes quatro elementos convergem para os dilemas que marcam a política brasileira e da América Latina; para onde caminham os combatentes de esquerda no final dá primeira década do novo século? Vejamos que nenhum projeto político é imune ao pragmatismo da política, assim como tensões e conflitos na construção de práticas, aliás, o partido a que nos referimos nasceu da pluralidade e convívio desarmônico entre suas tendências. O PT está mais maduro e bebe na fonte da democracia e do liberalismo, mas apresenta um escopo permissivo a valores que vão de encontro aos (des)caminhos do neoliberalismo no mundo e permitem ainda condições objetivas de forjar o desarme da política enquanto compilação maniqueísta da vivência entre o “mocinho” e o “bandido” (aproximações às idéias republicanistas) e a busca de saídas pela democracia com socialismo ou vice-versa. Devemos olhar com atenção porque temos uma eleição municipal neste ano que vai denotar o grau de ruptura e continuidade de práticas e valores rejeitados pela maioria do partido em 2005 no alvorecer dos escândalos do mensalão. A grande imprensa não concebe o PT por esse lado que abordamos aqui, fruto de ponderações de um dos maiores partidos da esquerda do mundo, prefere culpar o partido a cada brecha dada pelos números ou por explanações dos “maiores especialistas de todos os tempos da última semana”. Tenhamos clareza: a grande imprensa não simpatiza e nem quer o PT no poder. E ponto final.

Em Salvador, em especial, o PT passa por um momento interessante, pois saiu do governo do Prefeito João Henrique (PMDB) que apoiou a eleição do Governador Jacques Wagner (PT) em 2006 e disputará a prefeitura com três candidaturas em potencial: a do ex-prefeito pelo PFL Antônio Imbassahy (PSDB), a de Antonio Carlos Magalhães Neto (DEM) e a do Prefeito. Há a perspectiva de o partido (em coligação com o PSB e PC do B) apresentar um programa de governo mais à esquerda, que traga debates e soluções que não figurem apenas no esquema “Lula fará por nós, Wagner fará por nós e aí…”. Olhemos para as próximas eleições de outubro atentos para um partido que ainda nutre esperança e medo na opinião dos brasileiros.

[1] Disponível em http://www.pt.org.br/portalpt/index.php?option=com_content&task=view&id=13617&Itemid=195

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Cláudio André de Souza